São Paulo, domingo, 08 de maio de 2005

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FRONTEIRAS AGRÍCOLAS

Enquanto os do Sul sofrem devido à seca, os que foram para o Nordeste nunca colheram tanto

Piauí vira o novo eldorado para os gaúchos

Fotos Luiz Carlos Murauskas/Folha Imagem
Colheita de arroz na fazenda Trento, em Uruçuí, no Piauí; produção supera estimativa inicial


MAURO ZAFALON
ENVIADO ESPECIAL AO PIAUÍ

Tudo o que deu errado para os gaúchos do Rio Grande do Sul nos últimos dois anos está dando certo para os gaúchos do Piauí. No Sul, a seca jogou por terra a produtividade agrícola. No Piauí, o clima nunca foi tão favorável.
Os gaúchos do Sul estão com produtividade de 560 quilos de soja por hectare. Os do Piauí conseguem 3.200 quilos. Por isso, o humor dos produtores do Piauí é bem diferente daquele dos do Sul.
Os sinais da pujança do Nordeste na produção de grãos começam a ficar evidentes nas estradas que levam às novas fronteiras de produção: dezenas de caminhões transportam para as novas fronteiras as colheitadeiras que estão sendo pouco utilizadas no Sul.
Outro sinal são as vendas de máquinas, que continuam crescendo, ao contrário do que ocorre no Sul. Neste ano, crescem 8%, diz Roger Dietrich, revendedor da New Holland em Uruçuí (Piauí).
Enquanto no Sul o produtor vive a indecisão de reduzir ou não a área com soja, no Piauí todos têm uma certeza: vão aumentar a área. Neste ano sobe 20%, taxa que tem sido constante nos últimos anos.
Em tom de brincadeira, Alzir Aguiar Filho, um paraibano que trocou o plantio de abacaxi, na Paraíba, pelo de soja, em Baixa Grande do Ribeiro, no Piauí, diz que os gaúchos do Rio Grande do Sul vão ter que reaprender a plantar soja com os do Piauí.
Uruçuí, uma pequena cidade às margens do rio Parnaíba, é um exemplo dessa evolução das novas fronteiras agrícolas. Há poucos anos, a soja não era cultivada no município. Atualmente são 90 mil hectares. O Piauí, que há cinco anos plantava apenas 62 mil hectares com grãos, deve atingir 240 mil hectares neste ano.
Para o produtor e presidente do Sindicato Rural de Uruçuí, Altair Domingos Fianco, o aumento da área plantada deve continuar, pois o Estado tem 4 milhões de hectares à disposição.
A produtividade é boa na região porque os agricultores aprenderam as primeiras lições no Sul, se aprimoraram no Centro-Oeste e já chegaram "formados e experientes" ao Piauí, diz Fianco.
Antoninho Trento é um deles. Esse ex-caminhoneiro e ex-comerciante de 70 anos iniciou a atividade agrícola em Cascavel (PR), depois foi para Naviraí (MS) e fez o primeiro plantio em Uruçuí na safra 2004/5. Começou com 3.600 hectares de arroz. Neste ano, amplia a área para 7.000 hectares, 3.600 deles com soja.
Irrequieto e atento ao movimento das máquinas que estão no campo colhendo o arroz, Trento olha para o arrozal e diz: "Já sinto o corpo cansado, mas, quando a coisa vai bem, me empolgo". A empolgação se deve à produtividade, que, apesar de todas as dificuldades do primeiro plantio, supera as estimativas.
Para ampliar a área plantada, Trento recorreu aos filhos Marcos e Peter. Marcos, engenheiro agrônomo, foi o primeiro a seguir o pai para Uruçuí. Peter demorou um pouco mais porque teve de "desmontar" o escritório de advocacia que tinha em Cascavel.
Fianco diz que os primeiros anos da atividade agrícola são os de maior gasto, devido aos investimentos iniciais e à produtividade menor. Com o passar dos anos, a situação melhora. Nos mil hectares que cultiva, Fianco obteve produtividade média de 51 sacas por hectare em 2003, 52 em 2004 e deve atingir 55 neste ano.

"Devia ter vindo antes"
José Antônio Görgen, conhecido na região como Zezão, é um dos pioneiros no plantio de soja. Quando resolveu ir para o Piauí, foi chamado de louco e que perderia tudo. Atualmente, cultiva 10,3 mil hectares no Piauí e 2.100 no Maranhão. Em três anos, deve chegar a 19 mil hectares.
Bem estruturado, inclusive com convênios com Embrapa e Monsoy, Zezão diz que a maior preocupação deve ser "produzir mais com custos menores", principalmente devido à queda dos preços.
Com um batalhão de 250 empregados, Zezão atua na área de produção de sementes, mistura de adubos e faz a entrega da sua soja diretamente no porto de Itaqui, em São Luís (MA).
A três horas de Uruçuí, por estradas de terra, está o povoado de Nova Santa Rosa, formado por 80 famílias de pequenos produtores, vindos do Sul. Sávio Schröder, que trocou os 20 hectares do Sul por 500 em Uruçuí, é um deles.
O começo foi ruim, diz ele. A produtividade era de apenas 7 sacas por hectare. Em 2004, no entanto, conseguiu 57, produção que não deverá atingir neste ano.
Anacleto Barrichelo, também de Nova Santa Rosa, conseguiu até 75 sacas por hectare em algumas áreas de sua fazenda. Apesar de todos os problemas vividos na região, só tem uma coisa a lamentar: "Pena que não vim para cá dez anos antes".
Os jornalistas Mauro Zafalon e Luiz Carlos Murauskas viajaram ao Piauí a convite da New Holland

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