UOL


São Paulo, segunda-feira, 08 de setembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CONFLITO REGULADO

Documento elimina possibilidade de alteração radical nas atribuições dos órgãos e propõe respeito a contratos

Governo decide manter modelo de agências

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governo Luiz Inácio Lula da Silva apresenta nesta semana ao Congresso um projeto com diretrizes para as agências reguladoras que elimina a possibilidade de revisão radical de suas atribuições. É uma espécie de "mea culpa" em relação a declarações do próprio presidente que assustaram investidores, a conflitos entre ministros e até mesmo a rusgas entre autoridades do governo e das agências.
A Folha teve acesso ao documento "Análise e Avaliação do Papel das Agências Regulatórias". Elaborado pela cúpula do governo, o texto norteará o projeto que será enviado ao Congresso, bem como as diretrizes específicas para cada agência. A proposta mantém o respeito aos atuais contratos com as empresas. Inova ao falar de criação de "instrumentos de controle social". E, para tentar eliminar conflitos entre ministérios e agências, diz que "a responsabilidade por formulação de política é do governo".
O documento aponta como objetivo a criação de uma "estrutura institucional sólida do marco regulatório [como é chamado o conjunto de diretrizes e regras do setor das agências] para criar um clima favorável ao investimento privado no Brasil, principalmente em infra-estrutura, eletricidade, transporte e saneamento".
De acordo com o documento, outro objetivo fundamental é tentar garantir "oferta de serviços públicos em quantidade suficiente e qualidade adequada ao menor preço possível".

Aperfeiçoamento
Em resumo: a principal novidade é que não há uma novidade que signifique reviravolta no modelo de agências. No documento, está dito com todas as letras que "a regulamentação econômica pode e deve ser constantemente aperfeiçoada, desde que respeitados os contratos".
Não é pouco, dado que o próprio presidente Lula chegou a dizer, no início de sua gestão, que "o Brasil havia sido terceirizado" -uma crítica a um suposto exagero na autonomia das agências e que foi interpretada pelo mercado e classe política como sinal de que poderia haver uma revisão radical do modelo criado no governo Fernando Henrique Cardoso.
Na área de Comunicações, por exemplo, o ministro Miro Teixeira bateu de frente contra a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e se envolveu numa batalha para tentar barrar o reajuste das tarifas de telefonia pelo IGP-DI. A decisão foi parar na Justiça, que chegou a determinar a mudança do indexador para o IPCA.
A proposta fala da "importância das agências regulatórias para proteger as próprias empresas de uma avaliação do governo que altere as condições contratuais de concessão".
Afirma que, se houver mudança, serão respeitados o "princípio da não-coincidência [do mandato dos diretores das agências, como é hoje] com o mandato presidencial". E diz que não "serão alterados os mandatos dos atuais".
Mas propõe que, no futuro, seja unificada a duração do mandatos dos diretores das agências, para que comecem e terminem simultaneamente, o que não ocorre atualmente.
Segundo o documento, "o papel da agência é implementar as políticas de governo e fiscalizar o funcionamento do mercado. Por isso, é adequado e essencial manter os mandatos fixos dos dirigentes". Hoje, o governo escolhe um diretor, cuja indicação precisa ser aprovada pelo Senado.
A Folha teve acesso ao documento na quinta-feira. No dia seguinte, em entrevista ao jornal, o ministro José Dirceu (Casa Civil) confirmou que o governo apresentará nesta semana ao Congresso e a cada agência um projeto para o setor.

Unidade
A leitura do documento também deixa claro o nível de unidade do chamado "núcleo duro" -o grupo de ministros e auxiliares petistas mais próximos ao presidente e que decide com ele as diretrizes de governo. Debatido por meses, o assunto era visto como um possível divisor de águas entre os dois principais ministros, Dirceu e Antonio Palocci Filho (Fazenda). No entanto, prevaleceu uma visão que sinaliza entendimento na cúpula do governo.

Principais mudanças
O documento do governo diz que "não considera que o modelo atual das agências regulatórias seja ideal e propõe aperfeiçoamento nos instrumentos de controle social das agências", mas deixa claro que não pretende alterar regras contratuais. Menciona ainda a "importância das agências regulatórias na proteção dos consumidores ante o possível poder do mercado e das empresas".
Na prática, o "aperfeiçoamento" deverá significar medidas como a obrigatoriedade de todas as agências reguladoras terem ouvidorias, para receber queixas dos consumidores.
O governo também quer elevar a influência de órgãos não-oficiais de proteção ao consumidor no processo de decisão das agências. Exemplo: a obrigação de garantir a essas entidades o acompanhamento das audiências sobre os assuntos em discussão nas agências.



Texto Anterior: Painel S.A.
Próximo Texto: Dirceu prevê mais concorrência
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.