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Medo acentua instabilidade, diz Scheinkman
DA REPORTAGEM LOCAL
O economista José Alexandre Scheinkman, professor da
Universidade Princeton e estudioso da irracionalidade nos
mercados financeiros, explica
que a volatilidade não surge do
nada: o medo faz com que os investidores exagerem nas suas
reações às mudanças de perspectivas na economia.
Segundo ele, o Brasil não está
imune à crise financeira mundial, mas deve sofrer menos do
que sofreria há alguns anos,
graças aos avanços da economia, e o governo deveria aproveitar a oportunidade para
prosseguir nas reformas.
Leia a seguir a entrevista que
Scheinkman concedeu à Folha,
por telefone, do seu escritório
em Nova Jersey.
(DENYSE GODOY)
FOLHA - Por que a aprovação do
pacote de salvamento de US$ 700
bilhões pelo governo dos EUA não
surtiu efeito em acalmar os mercados?
JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN - Eu
nunca fiquei muito animado
com esse projeto [apresentado
pelo secretário do Tesouro dos
EUA, Henry Paulson, e modificado no Congresso]. O problema principal dos bancos americanos é capitalização -eles
perderam muito dinheiro com
o mercado imobiliário. Então, a
estratégia mais certa seria capitalizar os bancos, o que pode
ser feito por meio do mercado
mesmo, ou, se não for possível
dessa maneira, que seja por
meio do governo, com a nacionalização das instituições. Uma
outra parte da solução é a renegociação das hipotecas com os
mutuários.
FOLHA - Como o senhor avalia a
ação das autoridades européias?
SCHEINKMAN - A Europa tem
vantagens e desvantagens em
relação aos EUA. A vantagem é
que esse tema da intervenção
estatal nos bancos é menos
ideológica. A desvantagem, em
primeiro lugar, é que na Europa
não existe um sistema único
que permita a intervenção, cada país tem a sua regulação. Assim, o processo precisa ser decidido individualmente por cada nação ou em conjunto. Nas
crises, consegue-se fazer mudanças institucionais, então,
pode ser que na Europa se crie
uma entidade para lidar com a
situação.
FOLHA - No caso do Brasil, houve
falha, do governo, em perceber logo
que a crise teria conseqüências mais
sérias do que se imaginava?
SCHEINKMAN - Havia divergências entre os analistas. Não
quer dizer que o país não esteja
muito mais bem preparado para enfrentar uma crise do que
estava antes. A partir do Plano
Real, houve uma melhora enorme da economia brasileira,
com a estabilidade monetária, a
responsabilidade fiscal, os fundamentos. Isso não significa,
também, que o país esteja imune. Se o mundo entrar em uma
recessão, como muita gente está prevendo, o país vai crescer
menos.
FOLHA - E o que o governo deveria
fazer para que os danos sejam os
menores possíveis?
SCHEINKMAN - Voltar a prestar
atenção nos fundamentos. O
crescimento do gasto público,
por exemplo, deveria cessar e
até ser revertido. Além disso,
obviamente, todos nós gostaríamos que o Brasil tivesse um
sistema tributário mais racional, que encorajasse a formalidade. Uma reforma tributária
necessita de acordo com o Legislativo, que é mais complicado, mas gostaria de ver o governo tentar. O que não pode acontecer é levar o país a um ponto
em que a gente tenha que desistir de conquistas importantes,
como o controle da inflação.
FOLHA - Se os fundamentos da
economia brasileira continuam consistentes, o que explica essas oscilações tão bruscas no mercado financeiro?
SCHEINKMAN - Uma parte do
movimento é devido aos investidores americanos e europeus
que tiveram grandes perdas em
outros países e precisam resgatar o seu dinheiro. Depois vêm
previsões menores para o crescimento da economia, as pessoas ficam menos dispostas a
fazer investimentos de risco. A
Bolsa brasileira tem um componente forte de commodities,
e há uma pressão sobre isso. Ou
seja, a irracionalidade não começa do nada, ela junta os fundamentos e mecânicas -como
os saques feitos por estrangeiros- com o medo.
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