|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
COLAPSO DA ARGENTINA
Quedas de vendas próximas de 50% e dívidas fazem empresas desistir de alocar mais dinheiro
Indústria descarta investimentos no ano
JOSÉ ALAN DIAS
DA REPORTAGEM LOCAL
Fortemente endividado, com
vendas em segmentos essenciais
acusando quedas próximas a
50%, o setor produtivo da Argentina descarta qualquer possibilidade de investimento este ano.
De acordo com levantamento
do próprio Ministério da Economia, a taxa de investimento no
país, no ano passado, ficou abaixo
de 14,5% do PIB (Produto Interno
Bruto). Pelos dados oficiais, até o
terceiro trimestre de 2001, o PIB
argentino somava US$ 243 bilhões. O resultado anual será divulgado apenas neste mês, mas as
estimativas de consultorias privadas apontam que ficará ao redor
de US$ 255 bilhões. Confirmada
essa última cifra, significará um
recuo de 8,5% em termos nominais em relação a 2000.
Para este ano, a previsão é ainda
mais sombria: com o fim do regime do câmbio fixo, a queda do
PIB, de acordo com a consultoria
Delphos Investment, será de 10%
em termos reais, em pesos.
Em 1998, ainda no auge da atividade econômica no país, o total
de investimentos em todos os setores (incluído o financeiro) somou US$ 68 bilhões, equivalente a
23% do PIB (US$ 298 bilhões, naquele ano). Ou seja, 8,5 pontos
percentuais acima do do ano passado. Em 2002, a taxa deverá ficar
abaixo de 13%. ""Quando essa taxa
é menor de 16%, significa que se
está deteriorando o capital previamente investido", diz o economista Jorge Vasconcelos, da Fundação Mediterrânea.
A lista de empresas que suspenderam os planos na Argentina inclui dos grandes conglomerados
locais -esses, sobreviventes da
desenfreada onda de privatizações, fusões e aquisições deflagrada na era Menem (1989-1999)- a
subsidiárias de estrangeiras.
A Pecom, uma das empresas do
grupo Pérez Companc (energia e
petróleo), congelou investimentos de US$ 500 milhões previstos
para este ano. A direção afirma
que só poderia manter eventuais
investimentos se ""renovasse os
créditos". Dos grandes grupos argentinos, o Pecom é o que tem as
maiores dívidas em dólares no
sistema financeiro local -são
US$ 350 milhões. Não à toa, por
pressão do ministro da Produção,
Ignacio de Mendiguren, seu parceiro na Economia, Jorge Remes
Lenicov, teve que engolir a pesificação de todas as dívidas em 1 por
1, quando o previsto era que haveria um teto de US$ 100 mil.
Maior fabricante argentina de
alimentos, a Arcor suspendeu,
por 15 dias no mês passado, as atividades em 2 de suas 26 unidades
no país, devido ao baixo volume
de vendas. Nos últimos oito anos,
havia investido US$ 900 milhões
em expansão na Argentina, além
de Brasil (onde mantém duas fábricas), Chile, México e EUA. Em
dezembro e janeiro, as vendas na
Argentina recuaram 20%. Os números de fevereiro também não
devem ser alentadores. Em 2001,
teve faturamento global de US$
1,7 bilhão. Este ano, antes de
anunciado o fim do câmbio fixo e
a desvalorização do peso, previa
vendas entre US$ 1,5 bilhão e US$
1,7 bilhão. Agora, refaz cálculos.
Com o mercado argentino retraído, a Arcor volta-se para o exterior. Em 2001, do faturamento
total, entre 27% e 30% saíram de
suas fábricas fora da Argentina.
Em três anos, pretende aumentar
esse percentual para 50%. ""Não
há uma empresa na Argentina
que não tenha sido afetada por todo esse cenário", diz Jorge Lawson, porta-voz da Arcor.
Outro conglomerado local, o
Socma, faturou no ano passado
US$ 1,5 bilhão em solo argentino.
Seis anos antes, os ingressos somavam US$ 6 bilhões. Em dezembro, o grupo abriu negociações
para estender o vencimento de dívidas de US$ 220 milhões. O fundador, Franco Macri, admitiu
transferir a sede para o Brasil, onde, entre outras empresas, controla o Frigorífico Chapecó.
Criado em 1991, o fundo de investimento Exxel Group chegou a
ter faturamento de US$ 3,68 bilhões em 2000, com participações
em empresas como a Havana (fabricante de alfajores) e gerenciamento do clube Vitória, no Brasil.
Em 2001, acuado pela depressão
econômica, retirou participação
em oito companhias. Fechou o
ano com faturamento de US$
1,038 bilhão e 12.350 empregados
-contra 35.600 do ano anterior.
Consultado pela Folha, o Exxel,
por meio de sua assessoria, informou que ""no contexto atual vai
ajustar sua estrutura e investimento aos níveis de consumo à
espera de um cenário mais claro".
Entre os estrangeiros, a reticência
não é menor. A rede de supermercados chilena Jumbo decidiu paralisar investimento de US$ 100
milhões na construção de supermercados e hipermercados devido à ""incerteza econômica". Em
uma década, as cerca de 120 empresas de origem chilena que
atuam na Argentina investiram
US$ 13,1 bilhões no país.
Entre os espanhóis, a atitude é a
mesma. A Telefónica anunciou
nesta semana que Brasil e México
serão suas prioridades. E a petrolífera Repsol, que adquiriu a YPF
argentina ainda nos anos 90, confirmou que reduzirá investimentos no país -além de renegociar
dívidas de US$ 240 bilhões.
Texto Anterior: Arrecadação: Indústria pagará taxa sobre o uso de água de rio Próximo Texto: Comércio: Mundo não tem força para retaliar EUA Índice
|