São Paulo, terça-feira, 09 de março de 2004

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CONTAGEM REGRESSIVA

País decide hoje se paga dívida de US$ 3,1 bilhões com a instituição, para a qual houve avanços ontem

Argentina envia contraproposta ao FMI

CAROLINA VILA-NOVA
DE BUENOS AIRES

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

A Argentina enviou contraproposta a uma nova carta de revisão ofertada ontem pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) e adiou para hoje a decisão sobre o pagamento da dívida de US$ 3,1 bilhões em vencimento com o organismo. O conteúdo dos dois documentos não foi divulgado.
Na sexta-feira, o Fundo havia enviado um texto com proposta de revisão do acordo para a Argentina, que foi contestado no sábado pelo país. Ontem, com o novo documento, a expectativa do Fundo era que fosse possível um acordo, evitando o risco de a Argentina não pagar a parcela.
O Fundo procurou não vincular a revisão à ameaça argentina e informou que houve avanços nas negociações com o país durante a tarde de ontem.
O FMI e a Argentina assinaram, em setembro de 2003, um acordo que previa empréstimos totais de US$ 13,3 bilhões ao país em três anos. Os créditos serão desembolsados paulatinamente, a cada revisão do acordo. A intenção do Fundo, ao fechar o acordo, era pressionar periodicamente o país a aceitar novas exigências.
O programa foi montado de modo a que o Fundo tivesse datas coincidentes entre os pagamentos do governo argentino ao FMI e as revisões periódicas que permitem a continuidade dos desembolsos.
Após receber o documento, o presidente Néstor Kirchner se reuniu com funcionários do governo para definir que posição adotar. Durante o dia, Kirchner havia ratificado sua posição de não honrar o pagamento sem um sinal do Fundo indicando que a revisão do acordo seria aprovada.
"Já está tudo dito", disse, ao ser questionado se faria ou não o pagamento. A posição do Fundo é que a atitude do presidente "não ajuda" no relacionamento entre a instituição e a Argentina.

Obstáculo
Com as metas fiscais fixadas para 2003 cumpridas pela Argentina, o principal obstáculo para a aprovação do acordo é o programa de reestruturação da dívida do país, de US$ 88 bilhões, com credores privados, a maioria estrangeiros.
Na última sexta-feira, a diretora-gerente interina do FMI, Anne Krueger, apresentou ao governo argentino uma lista de exigências relacionadas à questão da reestruturação que, se cumpridas, destravariam a aprovação do acordo.
A primeira delas foi a publicação do decreto de designação do sindicato de bancos que atuarão como organizadores da reestruturação da dívida argentina.
Esperava-se que o governo assinasse o decreto ontem como um sinal de aproximação com o Fundo, mas, até o fechamento desta edição, isso não ocorreu.
Outra exigência feita pelo FMI foi o reconhecimento formal do Comitê de Credores Argentinos como negociador no processo de reestruturação. O governo alega, no entanto, que há mais de 20 comitês de credores e rejeita privilegiar apenas um deles.
O FMI exigiu ainda o estabelecimento de uma porcentagem "alta" de participação de credores na reestruturação. Recentemente, o ministro Lavagna havia afirmado que uma adesão entre 50% e 66% seria suficiente para o governo.
Segundo o diário "Clarín", o subsecretário de Tesouro dos EUA, John Taylor, empenhou-se na mediação do impasse entre a Argentina e o FMI.
A tentativa de Taylor era que a Argentina respondesse minimamente às exigências feitas pelo Fundo e que esse, por sua vez, baixasse o nível das exigências.
Além de contar com a mediação americana, o ministro Roberto Lavagna também empreendeu ontem uma maratona de telefonemas a representantes do G7 (grupo de países mais ricos do mundo) e reuniu-se com o delegado do FMI no país, John Dodsworth.
A posição da Argentina de vincular a revisão do acordo ao pagamento da dívida com o Fundo tem explicação. Kirchner tem impulsionado uma estratégia política - até agora, com sucesso - de transformar o tema da dívida em uma "causa nacional". O pagamento colocaria em jogo o respaldo popular construído pelo governo em torno da questão e poderia ser interpretado como uma "traição" do presidente aos "interesses dos argentinos".
Analistas lembram, por outro lado, que a Argentina tem pouco a perder com intransigência com o Fundo, já que praticamente não conta com investimentos externos para garantir seu crescimento econômico.


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