São Paulo, segunda-feira, 09 de março de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para Nossa Caixa, compra de bancos privados pelo BB "é equívoco"

Presidente da instituição, que a partir de amanhã passa ao comando do Banco do Brasil, afirma ser contra a ampliação da presença do Estado no segmento
Eduardo Knapp - 7.jan.08/Folha Imagem
O presidente da Nossa Caixa, Milton Luiz de Melo Santos, que deve assumir comando da nova agência de fomento do Estado de SP

TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Funcionário de carreira do Banco Central, o presidente da Nossa Caixa, Milton Luiz de Melo Santos, deixa amanhã o banco paulista, que passa para o comando do Banco do Brasil. Em dois anos, Santos levou um banco "coadjuvante" em São Paulo, atrasado no crédito, com equipe desmotivada e tecnologia defasada, a despertar a cobiça do Banco do Brasil em ter a maior rede bancária no Estado. Santos disse que o maior desafio foi oferecer serviços de qualidade com a compra da folha do Estado para reter os servidores vindos do Santander. Apesar de trabalhar em banco público, afirma que não vê sentido em o Estado ter instituição de varejo. Ele defende a presença na área de fomento, como o BNDES, e diz que "é um equívoco" o BB adquirir bancos privados. Santos cumprirá uma quarentena antes de assumir, possivelmente, o comando da nova agência de fomento do Estado -ele não confirma nem nega a indicação.

 

FOLHA - Como era o banco que o sr. pegou há dois anos?
MILTON SANTOS
- Recebi um banco que passou por uma mudança muito grande quando abriu o capital em 2005. Ao ingressar nas novas regras do mercado, a Nossa Caixa adquiriu profissionalismo e competência extraordinários. Ela era uma espécie de coadjuvante nas finanças do Estado -o banco principal era o Banespa. O governador José Serra tinha o propósito de vender a folha de pagamentos do Estado, tal como fez quando estava no município de São Paulo. Como o município não tinha banco, teve de fazer licitação. Como o governo tinha a Nossa Caixa, consultou o banco para ver se havia interesse. Quando realizamos o investimento, procuramos fazer um trabalho comercial muito forte para que esses clientes que antes recebiam o salário no Santander trabalhassem com a Nossa Caixa. O Santander contra-atacou, procurou reter esses clientes, oferecendo mimos e uma série de benefícios.

FOLHA - Quais são as limitações para concorrer com o Santander?
SANTOS
- Temos de seguir uma série de preceitos legais estabelecidos na lei de licitações ou de concursos públicos. O Santander abre uma agência aqui na rua em dez dias; eu levo quatro meses. O Santander vai ao mercado e recruta o melhor gerente, pagando bônus. Eu tenho de fazer concurso.

FOLHA - Como vocês conseguiram?
SANTOS
- O desafio foi modernizar o banco e trazer o máximo de inovações tecnológicas para que pudesse melhorar o atendimento e ter imagem de competência e de segurança. Resolvemos desligar 2.000 funcionários que tinham salários muito altos. Isso é um tabu na administração pública. Contratamos 1.300 com concurso, entrando com salário inicial. Desligamos aquelas pessoas que não tinham desempenho adequado, como qualquer outra empresa faz, com o objetivo de melhorar a eficiência como prestador de serviço. Tivemos reuniões com o sindicato, dissemos que não tinha perseguição a ninguém. Estabelecemos metas de realização de operações de crédito, venda de produtos e cobramos a ponto de o sindicato dizer que estávamos cometendo assédio moral. Também procuramos melhorar a avaliação de mérito.

FOLHA - Para os funcionários, como foi conviver com a venda ao BB?
SANTOS
- O ambiente da venda do banco cria um pouco de incerteza, insegurança, é um desestímulo. É difícil fazer com que as pessoas se abstraiam dessa situação e foquem no negócio. Queria mostrar [ao funcionário] que, quanto melhor o seu desempenho na agência, melhor seria o cacife para se colocar no BB. Com os diretores fizemos o mesmo porque era óbvio que seriam os primeiros a perder o cargo. Primeiro, negociamos com o BB a permanência de quatro diretores. Pedi ao secretário da Fazenda [Mauro Ricardo Costa] que desse uma sinalização de que as pessoas não ficariam desamparadas. Até para que pudessem ficar comigo até o final, senão corria o risco de ficar sozinho aqui.

FOLHA - É possível atender bem ao acionista minoritário, que é privado, e ao Estado e seu interesse público?
SANTOS
- Nós temos feito isso, deixando claro que o banco vai fazer operações em condições de mercado. Como o governo tem interesse em beneficiar determinados segmentos, entra com recursos do Orçamento e subsidia os juros. O governo paga o subsídio dentro do seu arcabouço legal de indutor de desenvolvimento.

FOLHA - Há uma papel específico desempenhado pelo banco público?
SANTOS
- Não vejo como o poder público possa ter banco de varejo. A iniciativa privada pode prover bem esse serviço, melhor do que uma empresa pública, que tem suas amarras. Vejo com mais sentido a atividade de uma instituição ligada ao desenvolvimento, como o BNDES. Ela tem um papel muito claro, associado a estratégias do governo de desenvolver regiões mais carentes.

FOLHA - Qual desafio o BB terá pela frente com a Nossa Caixa?
SANTOS
- O BB está sendo empurrado [para aquisições] porque se não fizer vai perdendo participação. Para se manter nesse mercado, vai ter de buscar alternativas -primeiro, pelos bancos estaduais. Tem também aquela medida provisória que permite a compra de bancos privados. Como economista, acho que é um equívoco. Você está ampliando a participação do Estado em atividade de natureza privada. Também é difícil explicar por que comprou participação no banco A e não no B ou C. Por que foi esse o preço e não aquele. Não queria estar na pele [deles]. Acho que não é esse o caminho, mas respeito a posição que eles têm.


Texto Anterior: Bancos: Ampla estatização poderá ser evitada, afirma reino unido
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.