São Paulo, domingo, 09 de abril de 2006

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ENTREVISTA

A fim de cumprir meta fiscal, empresas vão investir menos para compensar alta de despesas de Estados e municípios

Estatais reduzirão gastos, diz Mantega

Alexandre C. Mota -04.abr.06/Associated Press
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, para quem o governo cumprirá a meta de superávit primário de 4,25% do PIB em 2006


GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que o governo será obrigado a promover um aperto nos gastos das estatais e da própria União para compensar o aumento de despesas previsto para os Estados e municípios por se tratar de ano eleitoral.
Para esse aperto nas estatais, a única saída do governo será reduzir o investimento dessas empresas. "As estatais vão ter de fazer um pouco mais de [superávit] primário [economia para o pagamento de juros] neste ano."
Segundo o ministro, o governo já fez as contas para alcançar a meta definida de 4,25% do PIB para o superávit primário neste ano. A União e as estatais compensarão igualmente o superávit primário menor de Estados e municípios.
A previsão é que Estados e municípios apresentem superávit primário de 0,9% do PIB neste ano em vez do 1,1% calculado inicialmente pelo governo.
Dessa forma, em números aproximados, o superávit primário da União deve subir de 2,45% para 2,55% do PIB, e o das estatais, de 0,8% do PIB para 0,9%.
"Com o Alckmin [ex-governador Geraldo Alckmin, candidato à Presidência pelo PSDB] mandando bala, os municípios mandando bala e os governadores mandando bala, caberá à União compensar esses gastos", diz Mantega, em entrevista à Folha para falar sobre a execução fiscal do governo neste ano -a primeira exclusiva concedida a um jornal brasileiro depois de ter assumido a Fazenda.
Mantega explicou que, neste ano, a execução fiscal terá uma dinâmica diferente da do ano passado. Em vez de ter superávit primário elevado no primeiro semestre, como aconteceu em 2005, o resultado será bem menor e vai se manter no mesmo ritmo até o final do ano.
"A execução fiscal não está sendo feita na forma tradicional dos anos anteriores, que começava muito baixa, com a máquina toda paralisada, para só no segundo semestre aumentar os gastos públicos", diz Mantega. "Neste ano, nós mantivemos o mesmo ritmo do final do ano passado."

Vantagem
A vantagem dessa nova execução fiscal do governo, segundo Mantega, é que não vai haver a paralisação de algumas obras, como ocorreu nos anos anteriores, para depois serem retomadas no final do ano. "Muitas vezes as empresas paravam as rodovias no início do ano para só retomarem as obras quando entrasse dinheiro de novo", diz.
Mantega afirma que essa nova dinâmica não irá comprometer a meta de 4,25% do PIB para o superávit primário. "Garanto que a meta de 4,25% do PIB será cumprida", diz o ministro. "Nós temos de entregar de R$ 91 bilhões a R$ 92 bilhões de superávit primário e vamos entregar."
No primeiro semestre de 2005, o Tesouro anunciou superávit primário de 6,5% do PIB. Depois, caiu para 5,8% do PIB em 12 meses em agosto, até que fechou o ano passado em 4,8% do PIB. Neste ano, Mantega diz que os resultados do superávit primário serão mais estáveis. "A meta será cumprida quadrimestre por quadrimestre dentro da sua margem normal", diz Mantega.

Queda
O resultado fiscal do governo nos primeiros dois meses deste ano já mostra essa queda. Em janeiro e fevereiro, o governo federal registrou superávit primário de 2,33% do PIB, resultado bem abaixo dos 3,59% obtidos no acumulado dos primeiros meses do ano passado. As despesas da União aumentaram 17% neste ano em relação ao ano passado, enquanto a receita cresceu 9,7%.
De acordo com Mantega, esse aumento de despesa é típico de anos eleitorais. A legislação eleitoral impõe uma série de restrições em anos de eleição a partir de 31 de junho, o que, segundo Mantega, faz o governo aumentar os gastos no primeiro semestre. Entre as restrições, por exemplo, a legislação eleitoral proíbe licitações públicas.
"No segundo semestre, em razão dos impedimentos da legislação, ocorre uma desaceleração natural dos gastos públicos, que é normal em ano de eleições."
O ministro da Fazenda disse também que, se sentir que estiver ocorrendo algum excesso no aumento das despesas, ele tem condições de estancar a gastança.
"É igual a um carro. Se quiser, piso no freio por meio do contingenciamento de despesas."
Apesar da garantia de Mantega de que o rigor no cumprimento do Orçamento será mantido, há um certo ceticismo por parte do mercado se ele vai conseguir mesmo dobrar as pressões dentro do governo para conter as despesas.
Nos últimos dias, o governo anunciou um pacote de R$ 16,8 bilhões de ajuda ao setor agrícola e mais o aumento de 1,5% acima da inflação para os aposentados que ganham mais do que um salário mínimo, o que vai gerar impacto adicional de R$ 1 bilhão no Orçamento da União.
Para o economista Raul Velloso, essas medidas do governo contrariam o discurso de austeridade fiscal de Mantega. "O quadro é de expansão fiscal, o ambiente é expansionista, há pressão de todos os lados para aumento de gastos", diz Velloso. "Mantega parece estar remando contra a maré."


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