São Paulo, terça-feira, 09 de julho de 2002

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FRAUDES DO CAPITAL

Gigante farmacêutica faturou US$ 12,4 bi inexistentes e lidera ranking da onda de "contabilidade criativa"

Merck bate novo recorde de fraude nos EUA

Associated Press
Operadores da Bolsa de Nova York vêem o preço das ações caírem logo após a abertura do pregão


SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

A onda de escândalos contábeis que abala o mercado norte-americano desde dezembro passado ganhou seu mais novo protagonista ontem. A gigante farmacêutica Merck, terceira maior fabricante de remédios do planeta, incluiu no faturamento de uma subsidiária US$ 12,4 bilhões que na realidade nunca foram recebidos.
A revelação foi feita na edição de ontem do diário econômico "The Wall Street Journal", que cita como fontes responsáveis por investigação conduzida pela SEC (Securities and Exchange Commission), órgão que fiscaliza o mercado de ações nos EUA. A implicada é a Medco, que administra programas de benefícios farmacêuticos para seguradoras.
Segundo a reportagem, a subsidiária colocou em seu faturamento os pagamentos feitos durante três anos por clientes às farmácias credenciadas em sua rede. O problema é que a Medco nunca recebeu este dinheiro, que equivale a 10% do faturamento da Merck entre 1999 e 2001. Com a prática, a empresa aparecia com um faturamento maior do que o real.
O caso veio à tona porque, como a Merck planeja oferecer ao público 20% dos papéis da Medco, a SEC teve de investigar os balanços de ambas as empresas, como parte dos procedimentos de oferta pública inicial (venda inicial de ações). Como primeira consequência, a empresa baixou o valor inicial de suas ações de entre US$ 24 e US$ 22 para entre US$ 22 e US$ 20.

A lista aumenta
Se confirmada a fraude, a farmacêutica, baseada em Whitehouse Station (Estado de Nova Jersey), não estará sozinha. Nos últimos meses, nomes como Xerox, WorldCom e Enron vêm frequentando o noticiário por denúncia de irregularidades nos balanços, uma onda de práticas que o mercado há muito conhece como "contabilidade criativa".
"A prática da Merck-Medco de reconhecer como faturamento os pagamentos feitos às farmácias não terá nenhum impacto em seu lucro ou nos dividendos de suas ações, porque um valor correspondente também foi incluído nas despesas", disse o porta-voz das empresas, Chris Loder.
Um escritório de advocacia, no entanto, já havia entrado com processo em nome dos acionistas da Merck, alegando que a empresa e diversos funcionários seus inflaram de maneira imprópria as receitas da subsidiária Medco.

Reações na Bolsa
Já reflexo da denúncia, a Merrill Lynch rebaixou ontem à tarde sua recomendação em relação às ações da Merck. A agência norte-americana antes aconselhava a compra dos papéis da empresa farmacêutica e passou a recomendar posicionamento neutro.
"Estamos preocupados com as dúvidas que a investigação da SEC causará com respeito à capacidade da Medco de assegurar novos contratos e, da mesma forma, manter os atuais", escreveu o analista Steven Tighe em nota oficial da corretora de valores.
Para ele, "não ajuda o fato de que a Merck enfrenta vários desafios à medida que avançamos para o próximo ano, quando expiram as patentes européias para os produtos Zocor e surgem novos concorrentes para os remédios Vioxx e Fosomax".
A renovadas suspeitas sobre a lisura das práticas contábeis afugentou os investidores do mercado acionário. Ainda ontem, as ações da Merck fecharam em queda de 2,15% na Bolsa de Valores de Nova York, depois de abrirem em baixa de 3,5%. Abalado pelo novo escândalo, o índice Dow Jones teve queda de 1,12%, fechando em 9.274 pontos, e o Nasdaq, de 2,95% (1.405 pontos), enquanto o índice Standard & Poor's 500 perdeu 1,22%.
"Prudência é a ordem do dia. Ninguém quer pescar as pechinchas enquanto o mercado continua a cair", disse Peter Coolidge, corretor sênior da Brean Murray & Co. "Até que seja resgatada a confiança, será problemático."



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