São Paulo, domingo, 09 de agosto de 2009

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Fisco vira arma contra queda de receita

Combate à sonegação evita queda maior de arrecadação na crise, diz secretário, para quem SP vai melhor que governo federal

"Aqui [em SP] miramos todos: o grande, o médio e o pequeno contribuinte. Não existe pequeno delito de sonegação", diz Mauro Costa


DA REPORTAGEM LOCAL

O secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, Mauro Ricardo Costa, afirma que a queda na arrecadação de ICMS foi compensada pelas ações de fiscalização, que devem ser intensificadas no Estado. Ele diz que o fisco paulista "não distingue classes sociais".
"Aqui miramos todos: o grande, o médio e o pequeno contribuinte. A sonegação deve ser combatida de forma permanente. Não existe pequeno delito de sonegação. Todos têm de ser tratados da mesma forma." Leia a seguir trechos da entrevista com o secretário. (FÁTIMA FERNANDES e CLAUDIA ROLLI)

 

FOLHA - Estavam previstos no Orçamento do Estado investimentos de R$ 20,6 bilhões para este ano. A arrecadação de ICMS caiu. O que será feito para compensar essa queda?
MAURO RICARDO COSTA
- Nos primeiros sete meses deste ano a receita tributária do Estado foi de R$ 52,4 bilhões. O valor é inferior ao previsto no Orçamento, de R$ 53,8 bilhões. Fizemos contingenciamento. Temos a perspectiva de concluir bem o ano, com perda pequena de receita face ao tamanho da crise, que ainda tem reflexos na arrecadação. Estamos em situação melhor do que a de vários Estados e a do governo federal por conta das ações de combate à sonegação fiscal.

FOLHA - É possível identificar valores sonegados que entraram neste ano no caixa do governo?
COSTA
- Em 2008, o regime de substituição tributária [recolhimento do ICMS no início da cadeia produtiva] gerou R$ 3 bilhões a mais do que o previsto. O programa da Nota Fiscal Paulista gerou R$ 800 milhões. Se não fosse isso, teríamos perdido mais do que R$ 1,4 bilhão.

FOLHA - Quanto se arrecadará no ano com a substituição tributária?
COSTA
- O valor será o mesmo do ano passado. Em 2008, além da implementação da substituição tributária para os produtos, o regime valeu para os estoques. O impacto maior foi em 2008, com a entrada de mais setores. O último setor a entrar no regime foi o de venda de energia elétrica no mercado livre, setor em que havia uma fragilidade grande. O impacto será na arrecadação deste mês.

FOLHA - Existe estimativa de quanto será a arrecadação por conta da entrada desse setor no regime?
COSTA
- Temos indícios de que a sonegação nesse setor é de R$ 170 milhões a R$ 200 milhões por ano. Não são os consumidores paulistas [que sonegam], são os vendedores de energia. Hoje existem 300 vendedores paulistas de energia no mercado livre que podem comprar energia de onde quiserem, de geradoras de outro Estado, de comercializadoras de outras unidades da Federação. Aparentemente, não estão fazendo o recolhimento de ICMS na sua totalidade em São Paulo.

FOLHA - Essas empresas fazem pressão na Secretaria da Fazenda?
COSTA
- Claro, entraram até na Justiça e perderam. Pediram liminares na primeira instância, na segunda, mas não foram concedidas. Entraram com ação no Supremo [STF], mas também não conseguiram.

FOLHA - E o setor de combustíveis, maior contribuinte de ICMS?
COSTA
- É um setor que nos preocupa. A alíquota de 12% para o álcool hidratado estimula a fraude na gasolina. Quando a alíquota para o álcool foi reduzida, em 2006, não havia expectativa de que o carro flex chegaria onde chegou. Hoje já representa de 92% a 93% da produção de carros no Brasil. Com essa diferença na tributação [a alíquota de ICMS para a gasolina é de 25%], as pessoas usam mais o álcool como combustível. Em 2008, o consumo de álcool já foi maior do que o da gasolina, o que resultou em queda na arrecadação de R$ 1 bilhão a R$ 1,2 bilhão no ano.

FOLHA - O uso de solventes na gasolina ainda continua?
COSTA
- Sim. Isso poderia ter sido resolvido se o governo federal nos ajudasse. Solicitamos três vezes à Receita Federal, a última na semana passada, para que se restabeleça a cobrança da Cide [contribuição paga na compra de combustíveis] sobre o solvente, porque hoje a vantagem econômica que existe é muito grande, já que há cobrança da Cide sobre a gasolina e não sobre o solvente. O que se faz então? Mistura-se o solvente na gasolina porque isso gera vantagem. Quando esse solvente for usado na produção de tintas ou de outros produtos, essa Cide poderia ser abatida. A Receita não respondeu até agora.

FOLHA - Há relatos de que Lina Vieira saiu do comando da Receita porque teria discordado de mudança contábil feita pela Petrobras para pagar menos imposto. O governo paulista tem problemas com a Petrobras por conta dessa mudança?
COSTA
- Um dos problemas que temos neste ano é que recebemos de Cide 57% a menos do que recebemos em 2008. Perdemos R$ 47 milhões com a Cide de janeiro a julho deste ano. A causa disso é exatamente a não contabilização por parte da Receita Federal e do Tesouro Nacional em relação ao que a Petrobras fez. Se está certo ou se está errado, para a gente pouco importa. A questão tem de ser discutida entre a Receita e a Petrobras. O que precisa ser feito é contabilizar isso e fazer o repasse [ao Estado].

FOLHA - Recentemente foi noticiado que a Petrobras queimou, no mês de junho, 9,2 milhões de metros cúbicos de gás/dia. Em fevereiro já havia queimado 8,1 milhões de metros cúbicos de gás/dia, uma perda de R$ 5 milhões ao dia. Ela tem de pagar imposto sobre o gás queimado?
COSTA
- Tem de pagar sim. Se a Petrobras quer queimar gás, isso é um problema dela, apesar de achar isso prejudicial ao país. Agora, tem de pagar imposto devido porque fez a extração e a circulação do gás. Se fez isso, tem de pagar o imposto, pois o fato gerador do ICMS ocorreu. Se compro um bem e o destruo, o problema é meu. Se a queima divulgada corresponde à verdade, o imposto devido é significativo. Isso está sendo discutido com a Petrobras. Se não houver acordo, e for identificada irregularidade, pode haver auto de infração. A definição deve ocorrer até setembro.

FOLHA - Os grandes contribuintes fazem pressão sobre o governo paulista assim como fazem sobre a Receita Federal?
COSTA
- Não. Nem a mim nem ao governador [José Serra]. Ninguém desfaz um auto de infração, ninguém tem competência para isso. O que pode ocorrer é ele ser discutido administrativa ou judicialmente. Nem eu nem o governador temos competência para anular um auto. Por isso é que temos muito cuidado para fazê-lo. A decisão não é apenas de um fiscal. Todo auto passa por um controle de qualidade e é analisado por uma equipe de dez pessoas, para evitar que sejam feitos absurdos da cabeça de apenas uma pessoa.

FOLHA - Quais são os valores dos autos de infração emitidos pela Fazenda paulista?
COSTA
- No ano passado, os autos somaram R$ 17 bilhões. Em 2007, R$ 15 bilhões.

FOLHA - Qual foi o maior auto de infração da Fazenda paulista?
COSTA
- Até o ano passado foi um auto da ordem de R$ 2 bilhões. Esse auto está em discussão no TIT [Tribunal de Impostos e Taxas] e pode ir para a Justiça. Mas, neste ano, teremos um auto maior ainda, no valor de R$ 2,7 bilhões, que deve ser dado nesta semana. Refere-se a impostos devidos em 2008 e neste ano. Será dado prazo para pagamento e, se houver contestação, o contribuinte poderá entrar em contencioso administrativo.

FOLHA - Há interesse em intensificar ações em shoppings e em lojas de luxo?
COSTA
- A determinação do governador é que as ações sejam voltadas ao combate à sonegação, não importa se ocorram com o pequeno, o médio ou o grande empresário. As ações do Estado não podem distinguir classes sociais. Se há sonegação fiscal, é dever do Estado combatê-la. É isso que temos feito.

FOLHA - Mas a fiscalização não está mais intensa agora no comércio de luxo?
COSTA
- É que a imprensa gosta de divulgar mais essas ações em grandes lojas comerciais que vendem produtos de luxo. Mas as ações da Fazenda têm sido feitas em todas as empresas.


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