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Fisco vira arma contra queda de receita
Combate à sonegação evita queda maior de arrecadação na crise, diz secretário, para quem SP vai melhor que governo federal
"Aqui [em SP] miramos todos: o grande, o médio e o pequeno contribuinte. Não existe pequeno delito de sonegação", diz Mauro Costa
DA REPORTAGEM LOCAL
O secretário da Fazenda do
Estado de São Paulo, Mauro Ricardo Costa, afirma que a queda na arrecadação de ICMS foi
compensada pelas ações de fiscalização, que devem ser intensificadas no Estado.
Ele diz que o fisco paulista
"não distingue classes sociais".
"Aqui miramos todos: o grande,
o médio e o pequeno contribuinte. A sonegação deve ser
combatida de forma permanente. Não existe pequeno delito de sonegação. Todos têm de
ser tratados da mesma forma."
Leia a seguir trechos da entrevista com o secretário.
(FÁTIMA FERNANDES e CLAUDIA ROLLI)
FOLHA - Estavam previstos no Orçamento do Estado investimentos
de R$ 20,6 bilhões para este ano. A
arrecadação de ICMS caiu. O que será feito para compensar essa queda?
MAURO RICARDO COSTA - Nos primeiros sete meses deste ano a
receita tributária do Estado foi
de R$ 52,4 bilhões. O valor é inferior ao previsto no Orçamento, de R$ 53,8 bilhões. Fizemos
contingenciamento. Temos a
perspectiva de concluir bem o
ano, com perda pequena de receita face ao tamanho da crise,
que ainda tem reflexos na arrecadação. Estamos em situação
melhor do que a de vários Estados e a do governo federal por
conta das ações de combate à
sonegação fiscal.
FOLHA - É possível identificar valores sonegados que entraram neste
ano no caixa do governo?
COSTA - Em 2008, o regime de
substituição tributária [recolhimento do ICMS no início da
cadeia produtiva] gerou R$ 3
bilhões a mais do que o previsto. O programa da Nota Fiscal
Paulista gerou R$ 800 milhões.
Se não fosse isso, teríamos perdido mais do que R$ 1,4 bilhão.
FOLHA - Quanto se arrecadará no
ano com a substituição tributária?
COSTA - O valor será o mesmo
do ano passado. Em 2008, além
da implementação da substituição tributária para os produtos, o regime valeu para os estoques. O impacto maior foi em
2008, com a entrada de mais
setores. O último setor a entrar
no regime foi o de venda de
energia elétrica no mercado livre, setor em que havia uma
fragilidade grande. O impacto
será na arrecadação deste mês.
FOLHA - Existe estimativa de quanto será a arrecadação por conta da
entrada desse setor no regime?
COSTA - Temos indícios de que
a sonegação nesse setor é de R$
170 milhões a R$ 200 milhões
por ano. Não são os consumidores paulistas [que sonegam],
são os vendedores de energia.
Hoje existem 300 vendedores
paulistas de energia no mercado livre que podem comprar
energia de onde quiserem, de
geradoras de outro Estado, de
comercializadoras de outras
unidades da Federação. Aparentemente, não estão fazendo
o recolhimento de ICMS na sua
totalidade em São Paulo.
FOLHA - Essas empresas fazem
pressão na Secretaria da Fazenda?
COSTA - Claro, entraram até na
Justiça e perderam. Pediram liminares na primeira instância,
na segunda, mas não foram
concedidas. Entraram com
ação no Supremo [STF], mas
também não conseguiram.
FOLHA - E o setor de combustíveis,
maior contribuinte de ICMS?
COSTA - É um setor que nos
preocupa. A alíquota de 12%
para o álcool hidratado estimula a fraude na gasolina. Quando
a alíquota para o álcool foi reduzida, em 2006, não havia expectativa de que o carro flex
chegaria onde chegou. Hoje já
representa de 92% a 93% da
produção de carros no Brasil.
Com essa diferença na tributação [a alíquota de ICMS para a
gasolina é de 25%], as pessoas
usam mais o álcool como combustível. Em 2008, o consumo
de álcool já foi maior do que o
da gasolina, o que resultou em
queda na arrecadação de R$ 1
bilhão a R$ 1,2 bilhão no ano.
FOLHA - O uso de solventes na gasolina ainda continua?
COSTA - Sim. Isso poderia ter
sido resolvido se o governo federal nos ajudasse. Solicitamos
três vezes à Receita Federal, a
última na semana passada, para que se restabeleça a cobrança da Cide [contribuição paga
na compra de combustíveis] sobre o solvente, porque hoje a
vantagem econômica que existe é muito grande, já que há cobrança da Cide sobre a gasolina
e não sobre o solvente. O que se
faz então? Mistura-se o solvente na gasolina porque isso gera
vantagem. Quando esse solvente for usado na produção de tintas ou de outros produtos, essa
Cide poderia ser abatida. A Receita não respondeu até agora.
FOLHA - Há relatos de que Lina
Vieira saiu do comando da Receita
porque teria discordado de mudança contábil feita pela Petrobras para
pagar menos imposto. O governo
paulista tem problemas com a Petrobras por conta dessa mudança?
COSTA - Um dos problemas que
temos neste ano é que recebemos de Cide 57% a menos do
que recebemos em 2008. Perdemos R$ 47 milhões com a Cide de janeiro a julho deste ano.
A causa disso é exatamente a
não contabilização por parte da
Receita Federal e do Tesouro
Nacional em relação ao que a
Petrobras fez. Se está certo ou
se está errado, para a gente
pouco importa. A questão tem
de ser discutida entre a Receita
e a Petrobras. O que precisa ser
feito é contabilizar isso e fazer o
repasse [ao Estado].
FOLHA - Recentemente foi noticiado que a Petrobras queimou, no mês
de junho, 9,2 milhões de metros cúbicos de gás/dia. Em fevereiro já havia queimado 8,1 milhões de metros
cúbicos de gás/dia, uma perda de R$
5 milhões ao dia. Ela tem de pagar
imposto sobre o gás queimado?
COSTA - Tem de pagar sim. Se a
Petrobras quer queimar gás, isso é um problema dela, apesar
de achar isso prejudicial ao
país. Agora, tem de pagar imposto devido porque fez a extração e a circulação do gás. Se
fez isso, tem de pagar o imposto, pois o fato gerador do ICMS
ocorreu. Se compro um bem e o
destruo, o problema é meu. Se a
queima divulgada corresponde
à verdade, o imposto devido é
significativo. Isso está sendo
discutido com a Petrobras. Se
não houver acordo, e for identificada irregularidade, pode haver auto de infração. A definição deve ocorrer até setembro.
FOLHA - Os grandes contribuintes
fazem pressão sobre o governo paulista assim como fazem sobre a Receita Federal?
COSTA - Não. Nem a mim nem
ao governador [José Serra].
Ninguém desfaz um auto de infração, ninguém tem competência para isso. O que pode
ocorrer é ele ser discutido administrativa ou judicialmente.
Nem eu nem o governador temos competência para anular
um auto. Por isso é que temos
muito cuidado para fazê-lo. A
decisão não é apenas de um fiscal. Todo auto passa por um
controle de qualidade e é analisado por uma equipe de dez
pessoas, para evitar que sejam
feitos absurdos da cabeça de
apenas uma pessoa.
FOLHA - Quais são os valores dos
autos de infração emitidos pela Fazenda paulista?
COSTA - No ano passado, os autos somaram R$ 17 bilhões. Em
2007, R$ 15 bilhões.
FOLHA - Qual foi o maior auto de
infração da Fazenda paulista?
COSTA - Até o ano passado foi
um auto da ordem de R$ 2 bilhões. Esse auto está em discussão no TIT [Tribunal de Impostos e Taxas] e pode ir para a
Justiça. Mas, neste ano, teremos um auto maior ainda, no
valor de R$ 2,7 bilhões, que deve ser dado nesta semana. Refere-se a impostos devidos em
2008 e neste ano. Será dado
prazo para pagamento e, se
houver contestação, o contribuinte poderá entrar em contencioso administrativo.
FOLHA - Há interesse em intensificar ações em shoppings e em lojas
de luxo?
COSTA - A determinação do governador é que as ações sejam
voltadas ao combate à sonegação, não importa se ocorram
com o pequeno, o médio ou o
grande empresário. As ações do
Estado não podem distinguir
classes sociais. Se há sonegação
fiscal, é dever do Estado combatê-la. É isso que temos feito.
FOLHA - Mas a fiscalização não está mais intensa agora no comércio
de luxo?
COSTA - É que a imprensa gosta
de divulgar mais essas ações em
grandes lojas comerciais que
vendem produtos de luxo. Mas
as ações da Fazenda têm sido
feitas em todas as empresas.
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