|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
BNDES aponta risco de desindustrialização
Estudo, porém, afirma que abertura dos anos 90 não reduziu peso da indústria na riqueza do país
GILSON SCHWARTZ
ESPECIAL PARA A FOLHA
Estudo publicado pelo
BNDES alerta para os riscos de
desindustrialização no país, caso a atual política de juros e
câmbio seja mantida. Ao mesmo tempo, os dados revelam
que a abertura comercial e a liberalização comercial, promovidas nos anos 90, não foram
responsáveis pela redução do
peso da indústria na riqueza
brasileira. Ou seja, têm sido as
políticas de curto prazo, não as
reformas estruturais, as principais responsáveis pelas principais ameaças à indústria.
A pesquisa, realizada por André Nassif, contou com a leitura
atenta de Júlio Sérgio Gomes
de Almeida, ex-diretor do Iedi e
hoje secretário de política econômica do Ministério da Fazenda. E dá razão a alguns dos
principais críticos "tucanos" da
atual política econômica, como
os economistas Mendonça de
Barros e Bresser Pereira.
Analisando detalhadamente
o desempenho setorial da indústria nas últimas décadas,
Nassif alerta para os riscos, mas
desmonta estatisticamente pelo menos dois mitos que tiveram ampla aceitação entre os
economistas desenvolvimentistas desde os anos 80.
O primeiro é o de que a sujeição da economia brasileira ao
"consenso de Washington" teria provocado a desindustrialização do país. O segundo é o de
que estaria em curso uma variante inédita de "doença holandesa", ou seja, de destruição
da base industrial como resultado de uma súbita e intensa
valorização de bens agrícolas e
recursos naturais.
Nova doença holandesa
As evidências empíricas levantadas na pesquisa do
BNDES mostram que, apesar
da perda de participação da indústria de transformação no
PIB brasileiro, as mudanças
ocorridas desde 1990 não podem ser qualificadas de "desindustrialização", ao menos no
sentido de um retrocesso provocado por um "boom" de produção de recursos naturais ou
commodities.
De outro lado, a produção industrial associada a ciência,
tecnologia e inovação, percebida como a principal fronteira
de expansão nas economias
avançadas, mesmo se não chegou a desempenhar papel proeminente na economia brasileira até agora, ao menos não retrocedeu ao longo das últimas
duas décadas que, portanto,
não teriam sido tão "perdidas"
como usualmente supõem os
críticos das políticas liberalizantes. Ao contrário, a abertura
comercial e mesmo a valorização do real permitiram a muitos setores, especialmente nos
anos de 1990, importar novas
máquinas e equipamentos,
promovendo aumento da produtividade e da competitividade do país.
Esgotamento
O maior problema, alerta
Nassif, é o esgotamento dessa
onda e o risco de "nova doença
holandesa", ou seja, uma transferência generalizada de recursos para setores primários ou
para indústrias tecnologicamente tradicionais e, ao mesmo tempo, mudança do padrão
de especialização internacional
na direção de produtos primários e/ou industrializados intensivos em recursos naturais.
A análise dos dados não revela um deslocamento "generalizado", ainda que entre os setores industriais tenha ocorrido
algum deslocamento. Ainda assim, setores voltados para produtos primários ou commodities não são necessariamente
tradicionais do ponto de vista
tecnológico, como demonstram os investimentos em auto-suficiência em petróleo ou o
desenvolvimento de novas fontes de energia a partir da biomassa. Em suma, os dados não
revelam o retorno da economia
brasileira a um padrão generalizado de especialização exportadora baseada em produtos
primários.
Câmbio preocupante
Nas conclusões do trabalho,
Nassif alerta para duas "evidências preocupantes". A primeira tem como base a queda
"muito expressiva" do peso relativo dos produtos industrializados intensivos em trabalho
no total do valor adicionado,
dos investimentos industriais e
das exportações brasileiras. Essa perda não foi compensada
pelo avanço dos setores com
tecnologias intensivas em escala, diferenciadas ou baseadas
em ciências. Nos setores intensivos em trabalho predominam
as tecnologias tradicionais, mas
ao menos eles funcionam como
colchão amortecedor do desemprego e da informalidade.
O maior risco, no entanto, está na tendência recorrente de
apreciação real da moeda brasileira em relação ao dólar, desde
o fim dos anos 80, interrompida apenas entre o início de 1999
(com a crise que destruiu a "âncora" cambial) e o fim de 2003.
Se de um lado o real forte ajudou a estabilizar a inflação barateando as importações de
máquinas e equipamentos, foi
essa também a fonte de "enormes custos micro e macroeconômicos" que, no longo prazo,
podem conduzir à desestruturação do setor exportador de
manufaturados.
A pesquisa do BNDES está
disponível na internet no endereço: www.bndes.gov.br/conhecimento/TD/td-108.pdf
Texto Anterior: Petrobras pagará 19% a mais pelo produto Próximo Texto: Segmento de máquinas dá sinal de alerta Índice
|