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CONTAS VIGIADAS
Banqueiro havia dito que custo era de R$ 50 mi; promotor deve pedir o leilão do bem e da coleção de arte
Casa de Edemar custou R$ 142,7 milhões
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
A casa do banqueiro Edemar
Cid Ferreira, um complexo de
cinco andares que ocupa uma
área de 4.100 m2, custou R$ 142,7
milhões. Só a mesa de mogno da
sala de jantar, para 20 pessoas,
consumiu US$ 390 mil (R$ 893,1
mil, pelo câmbio atual). O banqueiro desembolsou 262,5 mil
(R$ 732,4 mil) por uma luminária
criada pelo designer alemão Ingo
Maurer para iluminar a mesa de
mogno -a peça foi batizada de
"Golden Ribbon" (Fita Dourada).
Os três valores constam do relatório final de uma empresa de auditoria contratada para acompanhar a obra, obtido pela Folha.
Quando Edemar quebrou, seus
assessores haviam divulgado a informação de que a casa do Morumbi, na zona oeste de São Paulo, custara R$ 50 milhões -quase
um terço do gasto real.
O documento dos auditores é de
julho do ano passado, quatro meses antes de o Banco Central intervir no Banco Santos. O banco de
Edemar, descobriu-se depois,
produzira um rombo de R$ 2,2 bilhões -os gastos com a casa correspondem a 6,4% desse valor.
A casa do banqueiro e sua coleção de arte devem ser o próximo
alvo dos promotores que conseguiram que a Justiça decretasse a
falência do banco no último dia
20. A promotoria deve pedir o leilão da casa e da coleção, avaliada
entre US$ 20 milhões e US$ 30 milhões (de R$ 45,8 milhões a R$
68,7 milhões).
Edemar já é réu num processo
na Justiça Federal no qual é acusado de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e fraude.
Com os R$ 142,7 milhões que
Edemar gastou na casa daria para
comprar nove de um dos apartamentos mais caros já vendidos
em São Paulo -a cobertura dúplex que Athina Onassis adquiriu
na Vila Nova Conceição, na zona
sul de São Paulo, com 990 m2 e 15
vagas na garagem.
Se o valor da casa de Edemar
fosse corrigido pela cotação atual
do dólar, que está em baixa, custaria US$ 62,3 milhões e figuraria
em quinto lugar na lista das propriedades mais caras do mundo
da revista "Forbes" deste ano.
Extravagância
Construída entre 2000 e 2004, a
casa da rua Gália nem parecia o
projeto de um banqueiro que estava à beira da bancarrota. O decorador da casa, o norte-americano Peter Marino, recebeu R$ 8,86
milhões, valor suficiente para
comprar um apartamento de 550
m2 no mesmo edifício Chateau
Margaux em que Athina vive.
O andar térreo tem duas galerias de arte, com pé-direito de nove metros, e uma biblioteca. Numa das galerias cabem 250 pessoas. Os banheiros são de vidro
transparente, mas, assim que uma
pessoa adentra o seu interior,
uma película impede que se veja o
que se passa lá dentro.
O centro de distribuição de
energia elétrica seria suficiente
para iluminar uma cidade de
5.000 habitantes. Os elevadores
são pneumáticos porque Edemar
não gosta do barulho dos motores. A garagem tem algo de James
Bond -é possível isolar o carro
do dono da casa, caso um veículo
invasor consiga burlar todos os
sistemas de segurança.
Perto dos honorários pagos a
Peter Marino e a Ingo Maurer, o
valor do projeto do arquiteto Ruy
Ohtake foi uma pechincha: R$
1,15 milhão, o equivalente a 0,8%
do custo total da obra.
O método de construção também teve algo de delirante. Parte
do mármore importado da França veio de avião para atender um
cronograma que não foi cumprido -a pedra ficou no depósito.
A contratação do decorador
mostra a fixação de Edemar pelas
grifes. Peter Marino é um dos
mais famosos arquitetos de interiores dos EUA. Tem em seu currículo a loja-conceito da Louis
Vuitton de Nova York e um prédio da Chanel em Tóquio.
Empresa da mulher
Edemar criou uma empresa para cuidar da construção da casa, a
Atalanta, que também é dona do
prédio -os terrenos são de outra
empresa. As sócias da Atalanta
são a mulher do banqueiro, Márcia Cid Ferreira, a irmã dele, Edna
Ferreira de Souza e Silva, e duas
empresas com sede em paraísos
fiscais, a Blueshell (Ilhas Virgens
Britânicas) e a Principle Enterprises (Panamá). O capital da Atalanta, de R$ 155,5 milhões, é controlado pelas duas "offshores".
Ninguém sabe até agora a origem do capital da Atalanta. O advogado Jairo Saddi, que defende
investidores que perderam mais
de R$ 700 milhões no Banco Santos, diz não ter "a menor dúvida"
de que a obra foi feita com dinheiro desviado.
Para Saddi, a construção da casa
na época em que o banco definhava mostra que a fiscalização do
Banco Central foi omissa: "O Banco Central sabia que essa casa era
do Edemar e nunca perguntou
como ele financiou a obra".
A omissão, na opinião do advogado, mostra que o Banco Central
tem um erro conceitual: ele teria
de vigiar os bens do banqueiro, e
não só o banco. O BC argumenta
que o controle de outras empresas
ligadas ao banqueiro, as de caráter não-financeiro, extrapola as
atribuições legais da instituição.
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