São Paulo, domingo, 09 de novembro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para analista, regulação não seguiu ritmo de consolidação

TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

A indústria bancária mudou sua cara nos últimos sete anos, quando 20% das instituições financeiras desapareceram, mas a regulação continua a mesma. Segundo o economista Armando Castelar Pinheiro, professor da UFRJ e analista da Gávea Investimentos, está na hora de voltar a discutir o marco regulatório, que não acompanhou o ritmo da consolidação bancária, movimento que diminui a concorrência. Ex-Ipea, ele é crítico do subsídio público para os bancos estatais fazerem o mesmo que os privados, caminho que o Banco do Brasil teria tomado.

 

FOLHA - Qual o impacto da fusão Itaú-Unibanco na concorrência?
ARMANDO CASTELAR
- É pequeno. Apesar de não ter uma pulverização grande, o sistema financeiro não chega a ser concentrado. Mas, quando você tira um "player", a concorrência diminui. Não acredito que consolidação acirre a concorrência.

FOLHA - A consolidação aumenta a responsabilidade do regulador? A estrutura atual está preparada?
CASTELAR
- Sim, e essa é uma discussão que está atrasada. As agências de defesa da concorrência têm um entendimento de que [as regras] não excluem nenhum setor da economia. O entendimento do BC foi diferente, de que a legislação dá alguma exclusividade na regulação de instituições financeiras. A preocupação maior do BC foi com a velocidade de poder resolver um problema de um banco em dificuldades. É diferente de um banco saudável comprar outro saudável. Quando o sistema fica mais consolidado, esse debate fica mais importante. Não é urgente, mas merece ser debatido pelo caminho que o setor toma.

FOLHA - Como seria o foco?
CASTELAR
- Imagino que vai haver um convênio entre o BC e o Cade. Efetivamente, o ritmo dessas fusões é muito rápido para o tipo de procedimento que existe na defesa da concorrência. Então, a análise no BC é realmente adequada. Mas o BC já tem milhões de outras atribuições, e isso pode receber atenção de menos. O ideal é alterar a lei da concorrência.

FOLHA - Por que o sistema financeiro merece regulação própria?
CASTELAR
- No sistema financeiro, há uma série de problemas de confiança que não existe em uma empresa industrial. Se você anuncia uma fusão, pode gerar uma desconfiança sobre a solvência do banco que está sendo comprado e gerar problemas mais sérios do que em outros setores da economia.

FOLHA - Como fica a concorrência?
CASTELAR
- Não acho que os bancos pequenos e médios vão desaparecer. Os pequenos hoje são bancos de nicho. Eles têm um papel complementar ao dos grandes bancos. Originam crédito e passam para a frente. O fato é que eles vão encolher nos próximos dois anos. Agora, aconteceu uma coisa boa em termos de concorrência. Conforme o crédito cresceu, todos os bancos abriram mais agências e buscaram correntistas. Foi uma disputa pelo cliente.

FOLHA - Como estão os bancos públicos na disputa pelo cliente?
CASTELAR
- Existe uma questão ideológica muito forte envolvendo o banco público. A defesa do banco público tende a ocorrer em razão de um papel que ele cumpriria e que não seria de interesse das instituições privadas, como o acesso a cidades menores. Isso não se justifica mais. Outra discussão é que banco público não quebra. Não é mais uma justificativa porque os bancos são sólidos. O que a gente vê no Brasil é o banco público querendo fazer o que o privado faz. Ele recebe subsídio. O BB já quebrou quatro vezes, e a Caixa recebeu uma infusão de capital gigantesca. O saneamento dos bancos estatais foi várias vezes maior do que os dos privados. A discussão é se vale a pena subsidiar o banco público para concorrer com o privado e fazer o que ele já faz.

FOLHA - Qual o futuro do crédito?
CASTELAR
- A tendência é de desaceleração. O mercado fala em avanço de 15% em 2009, mas a sensação de desaceleração vai ser ainda mais forte. Até bem pouco tempo atrás, muitas empresas se financiavam no exterior. Parte desse crédito que vai ser direcionado aqui será para essas empresas. Para quem vinha se financiando no mercado doméstico, a sensação de redução do crédito será maior do que esses 15%. Vai ter menos dinheiro e competição maior.


Texto Anterior: Entrevista - Roberto Setubal: Internacionalização do banco será enorme desafio
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.