São Paulo, domingo, 10 de janeiro de 2010

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Conta de luz pode vir errada novamente

Três meses após a Folha revelar falha em cálculo que pune consumidor com tarifas mais altas, nenhuma medida foi tomada

Novo período de reajustes tarifários das distribuidoras de energia começa no mês que vem sem que erro na conta tenha sido corrigido

AGNALDO BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL

Três meses depois de revelado o erro no modelo de cálculo da conta de luz do brasileiro, nenhuma providência efetiva até agora foi tomada para evitar que os consumidores voltem a ser penalizados pelo modelo distorcido de reajuste que beneficia as distribuidoras. E o tempo está se esgotando.
No dia 3 de fevereiro começa a "safra" 2010 de reajustes tarifários sem que qualquer iniciativa -seja dos órgãos de defesa do consumidor, seja da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), seja do Ministério de Minas e Energia- indique, pelo menos, a correção da falha a partir de agora. No mês que vem, sete distribuidoras terão, conforme determina os contratos, a homologação pela Aneel dos novos IRTs (índices de reajuste tarifário).
O período se estende até 14 de dezembro, quando a 63ª distribuidora receberá o reajuste. As novas tarifas para grandes concessionárias que abastecem São Paulo, Minas e Rio de Janeiro ocorrem em sequência. A Ampla, que atende parte do Rio de Janeiro, saberá o reajuste em março. Cemig e CPFL (que abastecem Minas Gerais e o interior de São Paulo, respectivamente) recebem os índices em abril. Já a AES Eletropaulo, responsável pelo abastecimento da Grande São Paulo, terá o reajuste em 4 de julho.
Reportagem da Folha publicada em outubro passado revelou que uma falha na metodologia de cálculo do IRT transfere, de forma indevida, bilhões de reais dos consumidores para as distribuidoras. A falha decorre da impossibilidade no modelo de devolver aos consumidores ganhos de escala obtidos com a expansão do mercado brasileiro, conforme reza a lei do setor elétrico.
Segundo cálculos do TCU (Tribunal de Contas da União), a falha -classificada como "grave"- transfere todos os anos pelo menos R$ 1 bilhão dos consumidores de energia elétrica para as distribuidoras. O cálculo considera a expansão média de 5% do mercado nacional, como em regra tem acontecido, inclusive em avaliações do governo.
Essa conta pode já ter superado os R$ 7 bilhões, valor ainda não conhecido devido à posição da Aneel de considerar inviável o levantamento da cifra. A informação foi pedida pela CPI das Tarifas de Energia Elétrica, mas foi negada pela Aneel. A negativa foi entendida como ato de obstrução à CPI, o que ensejou um pedido ao Ministério Público Federal para que investigue por prevaricação o atual diretor-geral da agência, Nelson Hubner.
A única resposta efetiva da Aneel foi a convocação de uma consulta pública a fim de coletar contribuições para a elaboração de um termo aditivo ao contrato de concessão, iniciativa inédita no país. A agência recolheu as contribuições, mas até agora não publicou resolução informando sobre quando e como será feita a correção dos contratos para evitar a repetição do erro nas contas.
O prazo para isso está se esgotando. Sem o aditivo aos 63 contratos de concessão, a direção da Aneel voltará a homologar os novos índices de reajuste baseando-se no modelo errado. No ano passado, antes da revelação da falha, a Aneel chegou a encaminhar um ofício ao Ministério de Minas e Energia no qual listava o prejuízo imposto aos consumidores brasileiros só no primeiro semestre.

Silêncio
Procurado, o diretor-geral da Aneel informou que não se pronunciará sobre o assunto. A agência diz, contudo, que a compilação das contribuições da consulta pública avança e que o aditivo ao contrato poderá ser avaliado pela direção da Aneel até o fim deste mês.
O colegiado da agência de regulação pode aprovar o texto ou recusá-lo. Mas, se aceitá-lo, nada garante que resolverá o problema. A Aneel afirma que não pode impor às concessionárias a assinatura de um aditivo ao contrato, posição refutada pelo próprio governo. A agência conta com uma atitude voluntária das distribuidoras.
A Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica), também procurada, mantém o silêncio sobre o caso. Beneficiada pelo erro, aguarda o novo ciclo de reajustes que se avizinha.


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