São Paulo, quinta-feira, 10 de abril de 2008

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ALAN GREENSPAN

Fed não tem culpa pela bolha imobiliária


Não é crível que as autoridades regulatórias conseguissem deter o colapso do mercado "subprime"

ESTOU INTRIGADO com o fato de que as bolhas no mercado da habitação que emergiram simultaneamente em mais de duas dúzias de países entre 2001 e 2006 não tenham sido vistas como resultantes de uma causa comum. A queda dramática nos juros de longo prazo explica estatisticamente -e é a mais provável causa importante- das taxas de capitalização imobiliárias (o aluguel como porcentagem do valor do imóvel), que caíram em todo o mundo. Em 2006, os juros de longo prazo em todas as economias desenvolvidas e nas principais economias em desenvolvimento caíram para a casa do um dígito.
Sem dúvida, cada uma das bolhas da habitação tem suas características idiossincráticas e alguns apontam para cumplicidade da política monetária do Federal Reserve (Fed, o BC dos EUA) na bolha norte-americana. Mas a bolha ficou bem perto da experiência mundial média, e as provas de que a política monetária tenha contribuído para ela são muito frágeis em termos estatísticos.
Paul De Grauwe, escrevendo no fórum de economistas do "Financial Times", conclui que a baixa taxa de fundos federais foi a fonte da bolha da habitação nos EUA. De Grauwe assevera que "sinais de recuperação" eram evidentes antes de 2004 e que por isso o Fed deveria ter começado mais cedo a apertar a política monetária. Com a inflação caindo a patamares bastante baixos, não era assim que vivíamos o período anterior a 2004. Ainda em junho de 2003, o Fed reportou que "as condições continuam morosas na maioria dos distritos". Além disso, os juros baixos não deflagraram uma "imensa expansão de crédito".
Os executivos que decidem sobre empréstimos nos bancos conhecem mais sobre os riscos e o funcionamento das instituições com quem negociam do que as autoridades regulatórias do setor bancário. As autoridades regulatórias, para que sejam efetivas, precisam se preocupar com o porvir, a fim de antecipar onde pode surgir o próximo defeito. Isso não se provou viável. Ante incertezas reais, as autoridades raramente foram capazes de desenvolver o nível de clareza quanto ao futuro que permitiria ações preventivas. A maior parte das atividades regulatórias se concentra nas atividades que precipitaram crises passadas. O problema não é a falta de regulamentação, mas expectativas pouco realistas sobre o que as autoridades regulatórias são capazes de prevenir. O cerne do problema do crédito imobiliário de risco ("subprime") está nos erros de julgamento da comunidade de investimento. A securitização de títulos "subprime" explodiu porque os papéis lastreados por hipotecas "subprime" estavam aparentemente subvalorizados (ou seja, ofereciam alto rendimento) quando lançados. As inadimplências e o número de hipotecas executadas por falta de pagamento eram modestos, na época, o que gerou a ilusão de grandes oportunidades de lucro. Investidores de todos os matizes pressionavam as instituições emissoras por mais papéis como esses. As instituições emissoras, por sua vez, pressionavam as empresas de crédito imobiliário por ainda mais papéis hipotecários, sem se importar com a qualidade. Mesmo que tivessem plena autoridade para intervir, não é crível que as autoridades regulatórias conseguissem deter o colapso do mercado "subprime".
A ferocidade com que os investidores recuaram de qualquer risco, desde agosto, surpreendeu-me. Minha opinião sobre a amplitude da dispersão de desfechos foi abalada, mas não a de que os mercados livres e competitivos são a melhor maneira de organizar uma economia. Tentamos formas de regulamentação pesadas, e até planejamento central. Nada disso funcionou de maneira significativa. Será que desejamos testar de novo as provas?


ALAN GREENSPAN foi presidente do Federal Reserve. Este artigo foi publicado originalmente no "Financial Times"

Tradução de PAULO MIGLIACCI

Hoje, excepcionalmente, a coluna de PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. não é publicada.



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