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análise
Pressão de ruralistas libera transgênicos
CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA
Entre 2003 e 2004, o Brasil se viu numa posição curiosa. Suas lavouras de soja
transgênica se expandiram
de 3 milhões para 5 milhões
de hectares, segundo o Serviço Internacional de Aquisição de Aplicações de Biotecnologia Agrícola. Tornou-se
o quarto maior produtor de
transgênicos do mundo.
Até então, plantar transgênicos era ilegal no país. Cedendo à pressão ruralista, o
governo decidiu por MP que
a soja Roundup Ready da
Monsanto era segura para a
saúde e para o ambiente.
Seis anos depois, não há
evidência de colapso sanitário ou ambiental. Só moral,
pela maneira como a soja foi
liberada e pela forma como o
governo manobrou para alterar o quórum da CTNBio.
Devagar, o país começa finalmente a rotular seus derivados de soja. Até mesmo o
óleo, que em tese nem DNA
contém. Os temores, afinal,
eram fantasias ecoxiitas.
Com base em raciocínio
análogo, libera-se o milho
transgênico. Se a soja é segura, o milho há de ser também.
É aqui que os defensores
da biotecnologia cometem o
mesmo erro que seus detratores: botar todos os transgênicos no mesmo balaio. A
biologia não permite esse tipo de simplificação.
Em 2001, por exemplo, os
pesquisadores californianos
David Quist e Ignacio Chapela mostraram, em estudo na
revista "Nature", que pólen
de milho transgênico contaminara variedades de milho
"criollo", produzidas tradicionalmente por lavradores
mexicanos há milênios.
O estudo foi criticado por
cientistas que recebiam financiamento de uma multinacional biotecnológica e retratado (anulado) pela revista. Em 2009, porém, uma
pesquisa da Universidade
Nacional Autônoma do México chegou à mesma conclusão que Quist e Chapela.
O milho é uma plantinha
promíscua, em que uma
mesma espiga pode conter
grãos vindos de pólen de vários "pais" diferentes.
Estudos de impacto seriam necessários para avaliar
as consequências disso, mas
eles não foram feitos no Brasil. No extremo oposto, a
França cria um rótulo especial para produtos animais
alimentados sem transgênicos. Devem estar achando
que o DNA da comida, como
um vírus, infectará a carne.
Mendel gargalharia.
Não há tecnologia nova livre de risco. A biotecnologia
agrícola tem mostrado até
agora que seus benefícios superam seus riscos. O diabo é
que, como cada transgênico é
diferente do outro, o passado
não garante o futuro.
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