São Paulo, quarta-feira, 10 de junho de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANÁLISE

Urnas não refletem desempenho econômico

OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

País em recessão e presidente com popularidade elevada é uma combinação incomum. Afinal, não é a economia, estúpido?
A máxima de James Carville, marqueteiro de Bill Clinton em 1992, vem sendo repetida desde então, quando uma recessão explicou a derrota de George Bush pai para o democrata.
O estado da economia e a avaliação do governo são indissociáveis. George Bush filho, por exemplo, tinha muitos outros problemas além da crise econômica, mas esta jogou a favor da eleição de Obama.
Nem sempre, no entanto, há uma correlação direta e imediata entre as duas esferas. O resultado da eleição do Parlamento Europeu mostra que o desempenho da economia não se reflete automaticamente nas urnas.
Na Alemanha, o PIB caiu 3,8% no primeiro trimestre em relação ao período anterior; na Itália, a queda foi de 2,4%. Foram duas das maiores recessões na Europa. E, no entanto, os governos dos dois países se saíram bem nas eleições. Quanto ao Reino Unido, que teve recessão menos intensa (queda de 1,9%), amargou fragorosa derrota.
Embora os governos alemão e italiano sejam conservadores e o britânico, trabalhista, a explicação ideológica não parece consistente. O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, enfrenta problemas em seu próprio partido, que podem vir a derrubá-lo e que nada têm a ver com o fato de ele estar à esquerda dos colegas europeus.
Mas o melhor exemplo de que as urnas não refletem necessariamente a economia pode ser tirado da história recente do Brasil. Em 1998, Fernando Henrique foi reeleito em plena turbulência econômica.
Na época, como agora, a crise veio de fora, dos países asiáticos. Mas há uma diferença: o Brasil de 1998, com o câmbio artificialmente valorizado, estava vulnerável. O país ainda não fizera o ajuste fiscal e a âncora do real era a política cambial, cuja insustentabilidade tornou o Brasil vítima dos ataques especulativos.
Quando a crise asiática teve origem, no ano anterior, e se dizia que o Brasil logo seria a "bola da vez", a equipe econômica minimizava a ameaça -algo equivalente à "marolinha" de Lula.
Mais tarde, a crise seria admitida em toda a sua extensão pelo presidente FHC. A poucas semanas da eleição, o governo dobrou os juros para tentar proteger a moeda. Foi uma medida impopular, mas talvez seus efeitos perversos não tenham ficado claros antes da eleição de outubro.
O governo acabou cedendo e deixou o câmbio flutuar, mas só dias depois da posse do segundo mandato. Em 1998, o eleitorado não associou FHC à crise, apesar do discurso da oposição. Em 2009, o eleitorado não associa Lula à crise, apesar do discurso da oposição. Ao contrário, acha, provavelmente, que os programas sociais amenizam seu impacto. Nem sempre é a economia, estúpido.


OSCAR PILAGALLO é jornalista e autor de "A Aventura do Dinheiro" e "A História do Brasil no Século XX".


Texto Anterior: Critério para definir recessão é questionado
Próximo Texto: Vinicius Torres Freire
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.