|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
BENJAMIN STEINBRUCH
Protagonistas do caos
Após dez meses de crise aérea, fica claro que ela só acabará se os protagonistas assumirem responsabilidades
|
SERGIO GUERRA , um amigo, viajou de Recife para São Paulo no
início de julho. Precavido, chegou ao bonito e reformado Aeroporto de Guararapes três horas antes do
horário do vôo. Enfrentou fila de
quase duas horas no check-in. Então, ficou sabendo que seu vôo atrasaria três horas. Às 20h, conseguiu
embarcar e desceu em Cumbica, São
Paulo, às 22h50. Pousado, o avião
esperou meia hora ao lado dos fingers para conseguir posição para desembarcar os passageiros. Na sala de
bagagem, Sergio aguardou mais
duas horas até a saída de sua mala.
Resultado: uma maratona de 12 horas desde a saída do hotel em Recife
até a chegada em casa, em São Paulo.
A história desse amigo está longe
de ser a mais dramática do denominado caos aéreo. As pessoas estão
sofrendo como nunca para viajar, o
que é lamentável. Porém, mais lamentável ainda é o empurra-empurra de culpas e a troca de acusações entre os protagonistas da crise.
O governo culpa as empresas aéreas
por desorganização e acúmulo de
vôos em horário de pico, as empresas culpam o governo pela falta de
estrutura aeroportuária, ambos
acusam controladores do tráfego aéreo e todos olham torto para são Pedro, pela neblina.
Dez meses depois do início dessa
crise, está claro que ela só será superada se cada um dos protagonistas
assumir suas responsabilidades.
O governo foi, no mínimo, inábil
para lidar com o movimento dos
controladores após o acidente da
Gol. Também falhou ao permitir
que a insuficiente infra-estrutura
aeroportuária de São Paulo se tornasse foco irradiador de problemas
para todo o país. Em artigo na Folha, o vice-governador paulista, Alberto Goldman, mostrou que os aeroportos de São Paulo receberam
34,3 milhões de passageiros no ano
passado, 9 milhões além de sua capacidade nominal. Há, portanto,
enorme excedente de passageiros,
absorvidos a trancos e barrancos
pelos terminais paulistas. O terceiro terminal de Cumbica, para mais
12 milhões de passageiros/ano, que
já deveria estar pronto, ficou para
2012.
As companhias aéreas, por sua
vez, não estavam preparadas para
herdar toda a carga suportada durante longos anos pelas tradicionais Varig, Vasp e Transbrasil. Parte do caos advém da gestão das herdeiras. O amigo Sergio Guerra, por
exemplo, observou em Recife que a
razão da confusão no check-in era o
sistema centralizado de atendimento. Ao chegar ao aeroporto, ele
viu que uma quilométrica fila única
serpenteava pelo saguão. Teve a
paciência de contar o número de
passageiros na fila. Havia cerca de
130 pessoas, que caberiam em um
só avião -não se justificava, portanto, a confusão. Quando as condições não são normais, o sistema
de fila única faz com que passageiros cujos vôos estão para decolar
tenham de esperar atrás de outros
que só embarcarão duas ou três horas mais tarde. Para encontrar esses passageiros, funcionários das
companhias andam aos berros pelo
saguão. Não seria mais prático descentralizar o check-in?
O reconhecimento de responsabilidades, pelo governo e pelas
companhias, poderá atenuar a crise. Sua solução definitiva, porém,
só virá no longo prazo, com investimentos das empresas, inclusive em
melhoria de gestão e, principalmente, com investimentos públicos e privados na infra-estrutura
aeroportuária. Nada diferente do
que se espera para os demais setores de transportes, praticamente
abandonados pela administração
pública nos últimos governos e que
hoje fazem do apagão logístico uma
séria ameaça ao país.
BENJAMIN STEINBRUCH , 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp.
bvictoria@psi.com.br
Texto Anterior: Dólar fecha abaixo de R$ 1,90 após sete anos Próximo Texto: Telefónica oferece US$ 4 bi para ter o controle da Vivo Índice
|