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Inflação já ameaça finanças estaduais
Disparada de IGP-DI, indexador dos contratos das dívidas renegociadas pelo governo FHC, eleva gasto com juros
Recordes na arrecadação de impostos reduzem impacto nas contas, mas secretário da Fazenda gaúcho prevê nova renegociação
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A disparada da inflação no
atacado e na construção civil já
provocou novo choque nas despesas financeiras dos Estados,
cujas dívidas só se mantêm sob
controle graças aos recordes na
arrecadação de impostos.
Dados do Banco Central
mostram que a conta de juros
dos governos estaduais dobrou
em relação ao patamar de dois
anos atrás, quando a inflação
em baixa aplacou a pressão dos
governadores por uma renegociação das dívidas com socorro
do Tesouro Nacional.
No período de 12 meses encerrado em maio, os encargos
financeiros dos 26 Estados e do
Distrito Federal com juros chegaram a R$ 47,8 bilhões -equivalentes a 1,78% do PIB ou, por
exemplo, todo o orçamento de
2007 do Fundeb, o fundo de financiamento do ensino básico
mantido por todos os entes da
Federação. Há dois anos, a despesa com juros ficava em 0,88%
do PIB, pouco menos da metade da atual.
O motivo é a recente escalada
da inflação e, mais particularmente, do IGP-DI (Índice Geral de Preços - Disponibilidade
Interna), indexador dos contratos das dívidas estaduais renegociadas na década passada
pelo governo FHC.
Por apurar também a variação de preços de alimentos e
matérias-primas no atacado,
além do aquecido mercado de
construção civil, o IGP tem
apresentado percentuais muito
superiores aos dos índices que
se limitam a apurar a inflação
para os consumidores. Nos últimos 12 meses, acumulou
12,14%, contra 5,58% do IPCA,
que baliza a política de juros do
Banco Central.
Com isso, o índice superou,
no período, a própria taxa básica de juros fixada pelo BC. Ou
seja, os contratos das dívidas
estaduais, assinados de início
em condições altamente vantajosas na época, passaram a ser
mais onerosos que a dívida em
títulos do governo federal, uma
das mais caras do planeta.
É a segunda vez, no governo
Lula, que o IGP chega aos dois
dígitos. A primeira, que coincidiu com a recuperação econômica de 2004, suscitou movimento de governadores e prefeitos das principais capitais
por nova rodada de renegociação das dívidas -que havia sido, aliás, promessa de campanha de Lula. Então prefeito da
capital paulista, o hoje governador José Serra (PSDB) foi o
principal defensor da troca do
IGP por outro indexador.
A mesma reivindicação é feita hoje pelo também tucano governo de Minas Gerais. "É uma
preocupação constante dos Estados. Temos feito gestões no
Tesouro Nacional para adotar o
IPCA", diz o secretário-adjunto
da Fazenda mineira, Leonardo
Colombini. "Com o IGP do jeito
que está, pode acabar valendo a
pena refinanciar a dívida diretamente no mercado."
Como acontece desde os
anos FHC, o governo federal
rechaça a possibilidade de promover mudanças amplas nos
contratos -não só pelo temor
de trazer de volta os anos de déficit crônico nos Estados mas
também porque a alta do IGP,
nesse caso, significa mais receita para os cofres do Tesouro.
No final do primeiro governo
Lula, o lobby dos governadores
acabou esvaziado pela maxivalorização do real, que derrubou
o IGP -nos 12 meses até maio
de 2006, por exemplo, o índice
tinha variação negativa (deflação) de 0,14%.
Agora, o que garante a estabilidade financeira dos Estados e
o sossego político da União são
os surpreendentes resultados
da arrecadação de impostos no
país, que batem recordes mesmo após a derrubada da CPMF
pelo Congresso. O crescimento
do consumo impulsiona a receita do ICMS, principal tributo estadual; na União, quem puxa é o Imposto de Renda, cujos
recursos são compartilhados
entre Estados e municípios.
"Nossa receita está crescendo mais que o IGP", diz o secretário da Fazenda do Rio de Janeiro, Joaquim Levy, secretário do Tesouro na equipe do ex-ministro Antonio Palocci. Segundo o boletim fiscal do Estado, o crescimento, no primeiro
quadrimestre, foi de 19,2%.
Pelos contratos de 30 anos
firmados com a União, o pagamento efetivo das dívidas consome um percentual fixo das
receitas, em geral de 13%.
Quando os encargos com juros
superam esse valor, os valores
não quitados são incorporados
à dívida e terão de ser pagos em
outros dez anos. Para Levy,
uma expansão da economia na
casa dos 4% ao ano pode tornar
as dívidas estaduais sustentáveis a longo prazo.
Pelos dados do BC, as dívidas
estaduais até caíram neste ano
como proporção do PIB, a despeito da alta dos encargos com
juros -passaram de 11,9% para
11,6% do PIB, ou R$ 331,3 bilhões. Até o Rio Grande do Sul,
que tem vivido em crise financeira nos últimos anos, aponta
melhoras. A dívida do Estado
caiu de 253,83% para 238,26%
da receita, embora ainda continue acima do limite fixado pela
legislação de 200%. "O que está
garantindo isso é um brutal
crescimento da receita", diz o
secretário da Fazenda, Aod Cunha -que, no entanto, avalia
ser inevitável nova renegociação geral das dívidas estaduais.
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