São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 2008

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"Puxadinho" realça diferença entre G8 e G5

A partir da organização de cúpula, conclusão é que emergentes ainda não emergiram completamente

DO ENVIADO ESPECIAL A HOKKAIDO

O galpão que o governo japonês armou para os jornalistas, ao lado do gigantesco Windsor Hotel Toya, na ilha de Hokkaido, a mais ao norte do país, era ontem a explicitação do diferente status de que gozam o G8, o clube dos ricos, e o G5, o grupo dos emergentes, que estavam reunidos nos 16.782 m2 do complexo.
O galpão -ou "puxadinho", como preferiu chamá-lo uma repórter do sistema oficial de informação do governo brasileiro- tinha uma área reservada para o que um cartaz em japonês e inglês avisava ser "USA protected pool", sendo "pool" o jargão para designar um grupo de jornalistas que se reúne para acompanhar determinado acontecimento.
Havia cadeiras estofadas e confortáveis, havia garrafas térmicas com café e havia, principalmente, a sacola do elegante hotel e spa com lanche, sobremesa e refrigerante -tudo organizado pela Casa Branca.
Quando os jornalistas brasileiros desembarcaram no "puxadinho", às 6h de ontem (18h de terça em Brasília), para acompanhar o encontro Lula/ Bush, mal haviam dormido (o ônibus os recolhera às 5h), não haviam comido nada nem tomado algo quente na manhã surpreendentemente gelada para o verão do hemisfério Norte.
Ainda por cima, suas cadeiras (como a de todos os demais jornalistas que não pertencessem ao "White House Press Corps", a turma que cobre a Casa Branca) eram comparativamente bem mais pobres.
Diferente status, diferente criatividade: Marcos Uchôa, enviado especial da Rede Globo, deixou de lado por instantes o livro "The Red Dust" (sobre a China, na qual Uchôa estará logo mais, cobrindo a Olimpíada) para improvisar outro cercadinho. Juntou cadeiras (as mais pobres), sobre elas pôs caixas abertas de papelão, "bem favela", e um cartaz rústico feito à mão: "Unprotected Brazilian pool".
Virou atração turística: os jornalistas norte-americanos fotografavam o cartaz com a avidez de turista japonês. E, a cada vez que o "puxadinho" recebia um novo grupo, à espera de um evento qualquer no hotel vizinho, repetia-se a sessão de fotos. O cartaz ganhou até espaço na filmagem de um cameraman sul-africano.

Diferenças de status
Diferenças de status dissolviam-se diante do formidável aparato de segurança que o governo japonês preparou para as cúpulas de Hokkaido. Os jornalistas passavam por uma checagem de segurança ao chegar ao Centro Internacional de Mídia, a 30 quilômetros, entravam nos ônibus, chegavam a um segundo "check-point" e tomavam outro ônibus para finalmente chegar ao "puxadinho".
Nem os mais próximos auxiliares do presidente Lula escaparam do rigor. Paulo de Oliveira Campos, chefe do Cerimonial, e Marco Aurélio Garcia, assessor diplomático, quiseram sair do hotel depois do almoço, para fumar um charuto, mas foram impedidos.
"Tivemos que engrossar", contaram depois, enquanto saboreavam seus puros.

Promessa italiana
É certo que, no ano que vem, na Itália, a segurança será tão rígida como no Japão. Mas o primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, anfitrião em 2009, anunciou que o G5 ganhará um "upgrade". No Japão, houve uma reunião do G8 com países africanos no primeiro dia, a cúpula do G8 propriamente dita na terça-feira, e finalmente o encontro G8/G5 ontem, no encerramento.
Em 2009, na Sardenha, a reunião com os africanos incluirá o G5.
Não chega a colocar o G5 no andar de cima, mas "é uma evolução extremamente importante", diz o presidente Lula.

Linguagem da bola
O que unifica os dois grupos é a linguagem universal do futebol. Ao chegar à suíte em que se reuniria com Lula, Berlusconi cumprimentou os jornalistas e foi logo dizendo: "Gosto muito do Kaká e do [Alexandre] Pato", jogadores do Milan, o clube do qual o primeiro-ministro italiano é dono.
Depois, comentou que não é o Milan que não quer liberar Kaká para disputar os Jogos Olímpicos, mas o próprio jogador que prefere não ir a Pequim. "Está cansado", diz Berlusconi.
O premiê cai depois na demagogia, ao dizer por que não vai contratar Ronaldinho Gaúcho: "Pediram muito por ele e eu, como presidente do Conselho de Ministros, não posso gastar dinheiro porque tenho que usá-lo com os pobres. Aliás, sou o maior doador para os pobres, porque pago US$ 1 milhão por mês de impostos".
Lula entra na sala e também fala de Kaká: "Vai para o Corinthians", seu time do coração, brinca.
Mais tarde, em entrevista aos jornalistas, Lula puxa a bola de cristal para avisar que, "até 2016, o Brasil já virou uma grande potência" e, por isso mesmo, será escolhido para sediar a Olimpíada daquele ano (o Rio é candidato).
Pelas dúvidas, Lula irá a Pequim para a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos deste ano, mas também para "cabalar votos" para o Rio. "Vou fazer boca-de-urna porque o sistema de votos favorece os europeus, que têm 50% dos delegados" que escolhem a cidade-sede.
(CLÓVIS ROSSI)



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