São Paulo, domingo, 10 de agosto de 2008

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Classe média cresce, mas consome menos

Quantidade de itens adquiridos diminuiu no primeiro semestre sob impacto da alta da inflação, aponta pesquisa da Nielsen

Retração é maior nas faixas de renda mais altas; famílias reduzem consumo de produtos supérfluos para compensar alta de preços

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Ao mesmo tempo em que o número de famílias tidas como de classe média cresceu nos primeiros meses deste ano, o consumo desses domicílios se retraiu sob o impacto do recrudescimento da inflação, centrada especialmente na alta dos alimentos. É o que revela pesquisa da Nielsen, obtida pela Folha.
De janeiro a junho, a quantidade de produtos alimentícios e de higiene e limpeza adquiridos caiu 3,2% para todas as classes sociais na comparação com o mesmo período de 2007. Essa queda foi acompanha de um aumento de 3,8% nos gastos, o que comprova o efeito negativo da inflação sobre o consumo, de acordo com os dados da Nielsen.
E a retração foi maior nas faixas de renda mais altas. Na A e B, juntas, o consumo, em volume, caiu 6,9%. Na C, a redução ficou em 3,5%. Somente as classes D e E registraram expansão na quantidade adquirida de produtos: 1,1%.
"O aumento dos preços teve impacto negativo sobre o consumo. As famílias gastaram mais, mas levaram menos produtos para casa devido à alta da inflação", diz Patrícia Moraes, coordenadora de marketing da Nielsen, empresa multinacional especializada em pesquisas de mercado.
Nos seis primeiros meses deste ano, o IPCA subiu 3,63%, acima dos 2,08% registrados no mesmo período de 2007. Os itens pesquisados pela Nielsen aumentaram em proporção maior do que a inflação média.
Os alimentos avançaram 8,64% -mais do que os 3,93% do primeiro semestre de 2007. Os artigos de limpeza, por sua vez, tiveram alta de 5,15%, ante 2,76% de janeiro a junho do ano passado. O mesmo ocorreu com os de higiene pessoal, cuja variação passou de 1,61% nos seis primeiros meses de 2007 para 4,56% em igual período deste ano.

Corte do consumo
Diante desses aumentos, a saída foi cortar o consumo. "Certamente a queda do consumo é efeito da inflação. Neste momento recente em que a inflação dos principais produtos alimentícios subiu, não houve muita escapatória: as pessoas tiveram de diminuir o consumo de parte de outros produtos, como bebidas", diz Sérgio Vale, economista da MB Associados.
Um dos problemas, diz Vale, é que os reajustes ficaram concentrados no "núcleo da alimentação do brasileiro" e atingiram produtos como feijão, arroz, carne e derivados de trigo.
Pelos dados da Nielsen, as famílias reduziram o consumo de produtos supérfluos. Na classe A e B, as famílias deixaram de comprar molho para salada, sabão líquido e suco pronto, entre outros. "São produtos de altíssimo valor agregado e dispensáveis", afirma Moraes.
Na classe C, foram afetados petit suisse, pós-xampu, iogurte e leite condensado -também igualmente supérfluos, de acordo com a coordenadora da Nielsen. Nas classes D e E, apesar de as quantidades adquiridas não terem caído na média, houve corte de itens como xampu, purê de tomate e leite condensado.

Salário mínimo
De acordo com a Nielsen, os gastos da classe C subiram 2,7% no primeiro semestre. Nas classes D e E, por sua vez, o reajuste real do salário mínimo permitiu aumento de 9,9% nas despesas. A faixa A e B foi a única classe que registrou queda no gasto -0,3%.
Para Vale, a retração do consumo na classe C não contradiz a expansão da classe média, demonstrada na semana passada por pesquisa da FGV -32% das famílias aumentaram sua renda e mudaram de classe social nos quatro primeiros meses deste ano.
"Não diria que é contraditório com o estudo da FGV. A classe média cresceu em renda e emprego e passou a consumir mais diversos produtos. Só que essas classes também consomem produtos caros, como automóveis e imóveis, cujo risco de perda por conta de não-pagamento é grande. Fica mais difícil deixar de pagar esses produtos", diz.

Inadimplência
Desse modo, segundo ele, a opção foi diminuir o consumo de não-duráveis para não cair na inadimplência. "Mas, de qualquer maneira, para todas as classes de renda e produto, devemos começar a ver uma desaceleração de crescimento de consumo, principalmente em 2009."
Um alternativa encontrada pelas faixas de menor poder aquisitivo para driblar a alta da inflação foi comprar mais no atacado, que tem preços mais baixos. De acordo com a Nielsen, o gasto médio das famílias de menor renda (classes D e E) no atacado subiu 41,9% no primeiro semestre, embora esse canal de vendas são seja o mais importante.


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