São Paulo, sexta-feira, 10 de setembro de 2004

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LUÍS NASSIF

Vinculação e responsabilidade

José roberto Afonso é um dos "pais" da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal). Dias atrás, conversando com técnicos do FMI, ouviu elogios rasgados ao pagamento das dívidas de Estados e municípios ao Tesouro Nacional, sempre em dia. Disseram que gostariam de copiar o modelo para outros países. Afonso explicou, então, que o único diferencial brasileiro, e que explicava o sucesso da operação, era a vinculação orçamentária, ou seja, um percentual da receita corrente estadual e municipal está vinculado para o pagamento de tal refinanciamento. E indagou do técnico se, quando defendia a desvinculação, estava incluída a revisão desse item. Não obteve resposta.
Está em marcha, via FMI e autoridades econômicas, um movimento duplo no Orçamento. Primeiro, desvinculá-lo de todas as despesas sociais. Depois, revincular para pagamento de dívidas.
A lógica que Afonso vê nas autoridades econômicas é que, para o país crescer, é preciso aumentar os investimentos públicos, assim como os privados. Como é impossível aumentar a carga tributária para ampliar o investimento público, a saída é atacar as receitas vinculadas do governo -preponderantemente, destinadas à Previdência (via contribuições), à educação (via impostos, em grande parte) e à saúde (por ambas as vias).
Essa política está implícita também na proposta das PPPs (Parcerias Público-Privadas). Afonso sustenta que se deve avaliar o impacto não apenas sobre a LRF mas ir além, ao analisar as implicações sobre a organização do Estado e a definição das instituições fiscais.
No caso da Parceria Público-Privada, diz ele, "trata-se de assumir uma dívida hoje, diretamente ou disfarçadamente via PPP, para financiar um investimento hoje, que vai induzir um crescimento econômico no futuro, que, por sua vez, vai gerar um aumento de receita governamental no futuro e que poderá ser usado lá na frente para pagamento da dívida hoje contraída".
O "xis" da questão é como assegurar o pagamento futuro das dívidas assumidas no presente. Ninguém confia em contratos. Faltam as seguintes garantias:
1) de que no futuro, as metas sejam mantidas no PPA e na LDO;
2) de que as dotações sejam incluídas no Orçamento;
3) de que depois não sejam contingenciadas;
4) de que também não sejam empenhadas;
5) de que sejam efetivamente pagas.
Como garantir isso tudo? Só há uma garantia -vinculação.
O mundo ideal para os credores seria desvincular (dos gastos sociais) para criar uma vinculação para o novo serviço da dívida, diz ele. "Trata-se de uma proposta inédita (e perigosa) no país: constitucionalizar que o serviço da dívida precede os gastos sociais."
Lembra Afonso que sempre foi alegado que, sem a desvinculação, seria impossível cumprir as metas fiscais. Mas todas as metas foram sucessiva e plenamente cumpridas, mesmo as mais duras firmadas com o FMI, inclusive após a elevação da meta de superávit primário para patamar nunca observado na história recente.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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