São Paulo, domingo, 10 de novembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TRABALHO EM XEQUE

Governo petista também pretende discutir o fim do monopólio sindical e acabar com o imposto sindical

Lula quer secar verba do FAT para centrais

CLAUDIA ROLLI
FÁTIMA FERNANDES

DA REPORTAGEM LOCAL

A principal fonte das centrais sindicais para bancar cursos de qualificação profissional, as verbas do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), deve secar. Os desvios de dinheiro público que envolvem entidades sindicais -e estão sob investigação do TCU (Tribunal de Contas da União) e da CGU (Corregedoria Geral da União)- devem levar o governo petista a mudar a política de distribuição de recursos do fundo.
A mudança na distribuição da verba do FAT para a qualificação profissional é apenas um dos alvos do próximo governo, que quer colocar em prática uma espécie de operação "mãos limpas" no meio sindical.
A Folha apurou que o governo petista também quer discutir o fim do monopólio sindical -hoje só pode existir um sindicato de determinada categoria profissional por município- e do imposto sindical -criado na década de 40, ele equivale a um dia de trabalho e serve, em parte, para manter os sindicatos.
Esses temas devem ser debatidos e negociados no Fórum Nacional de Trabalho, um conselho integrado por representantes de sindicatos, empresas e governo, que está em formação.
A estratégia do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, é pegar boa parte da verba, que hoje é repassada para as centrais, e direcioná-la para políticas sociais. Esse dinheiro não é pouco. Nos últimos três anos, Força Sindical, CUT (Central Única dos Trabalhadores), CGT (Confederação Geral dos Trabalhadores) e SDS (Social Democracia Sindical) receberam cerca de R$ 238 milhões. Só que parte dessa quantia, segundo o TCU, não foi utilizada para esse fim, como mostra a documentação de prestação de contas das centrais e de sindicatos.

Combate à fome
Os programas de combate à fome devem ficar com a maior parte dessa verba. O repasse para o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) deve aumentar -o banco vai emprestar mais dinheiro aos pequenos empresários, com a intenção de criar mais empregos.
Isso não significa que os cursos de qualificação profissional vão terminar, mas, no governo Lula, devem ficar sob o controle do Ministério da Educação. Na avaliação dos petistas, esse ministério já tem estrutura montada no país, com escolas técnicas estaduais e federais e know-how pedagógico para administrar os cursos de qualificação do trabalhador.
A idéia do PT, pelo que a Folha apurou, é acabar com as irregularidades e fazer uma operação "mãos limpas" no movimento sindical. Não haverá intervenção do governo Lula nos sindicatos. Mas o recado do presidente eleito é claro: é preciso moralizar o sindicalismo no Brasil.
A interlocutores o novo presidente tem dito que a maior vergonha no meio sindical hoje já não é mais sobreviver à custa de imposto sindical, mas ser financiado por dinheiro do FAT. Também defende que o Ministério do Trabalho priorize a fiscalização, e não a gestão, de programas e recursos.
A Folha apurou com petistas que trabalham próximos a Lula que o modelo de qualificação profissional adotado nos oito anos de governo tucano deve ser modificado radicalmente. Até então, o Ministério do Trabalho fez convênios com sindicatos e institutos e repassou-lhes a verba do FAT, por meio do Planfor (Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador), para que eles montassem e administrassem os cursos. Cabe ainda ao ministério fiscalizar e punir quem descumprir as regras.
De 1996 a 2000, apesar de haver indícios de corrupção nas entidades que se beneficiaram desses recursos públicos, nada foi feito. Nesse período, a fiscalização era feita pelo Ministério do Trabalho, como foi determinado pelo Codefat (Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador). Esse conselho, formado por patrões, empregados e governo para cuidar da gestão do FAT, também delegou ao ministério a função de coordenar o Planfor.
Há cerca de dois anos, o TCU começou a abrir a caixa-preta dos cursos. Só que até agora, informa, ninguém foi obrigado a devolver o que desviou. Em setembro, decidiu fazer auditorias nas centrais. "O governo descentralizou o programa de qualificação profissional, mas não criou estrutura de prestação de contas. Foram encontradas irregularidades no país todo", diz Lucas Furtado, procurador-geral do Ministério Público no TCU. "Se o governo Lula não criar esses mecanismos de fiscalização, vai falhar também."
O tribunal iniciou, há cerca de um mês, auditorias para investigar a fundo como centrais sindicais e federações patronais usam a verba do FAT. Os técnicos já têm em seu poder relatórios que mostram falhas na contratação de empresas para fazer cursos, ausência de relatórios de acompanhamento das aulas, falta de prestação de contas, número de treinados menor do que o de inscritos, carga horária menor do que o previsto e não-fornecimento de vale-transporte, entre outros.
"Nesse processo, o grande culpado de todos esses escândalos foi o Ministério do Trabalho, que não foi rigoroso no repasse de verbas e na prestação de contas", afirma o procurador. O ministério informa, por meio de sua assessoria de imprensa, que não vai comentar o assunto.
"O FAT é um instrumento valioso. O que temos visto, entretanto, é que os recursos podem estar sendo desviados. É preciso separar o joio do trigo", diz Guilherme Mastrichi Basso, procurador-geral do Trabalho.


Texto Anterior: Painel S.A.
Próximo Texto: Trabalho: Sindicatos vão "encolher" com mudanças
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.