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Área pioneira em biodiesel vai para reforma agrária
Após fracasso do projeto de produzir biocombustível a partir da mamona, fazenda no interior do Piauí deve ser repassada ao Incra
EDUARDO SCOLESE
EDUARDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Há quatro anos, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva propagandeou como modelo do futuro dos biocombustíveis um
projeto encravado no semiárido piauiense. Hoje, com o fracasso do plano de produção de
biodiesel a partir da mamona,
em parte pela produtividade
baixa, o governo vai usar as terras para a reforma agrária.
No local, no município de
Canto do Buriti (470 km de Teresina), trabalhadores estão à
míngua, sem renda e trabalho,
e agora o governo do Estado
corre para que a empresa lhe
devolva a área e essa possa ser
repassada em definitivo ao Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
A área tem 17 mil hectares, o
equivalente a 110 vezes o parque Ibirapuera, em São Paulo.
Foi visitada por Lula em agosto
de 2005. Na ocasião, o presidente discursou para agricultores familiares da Fazenda Santa Clara, da empresa Brasil
Ecodiesel, responsável pelo
projeto. Até chorou quando citou a mãe como exemplo de
persistência dos nordestinos.
Mas, apesar do sucesso da
primeira safra, comemorada
pelo presidente, a queda da
produção nos anos seguintes
praticamente paralisou a operação da usina de biodiesel da
companhia, na também
piauiense Floriano. Atolada em
dívidas, a empresa deixou de
investir na mamona e liberou
os agricultores para plantarem
somente feijão em 2009.
Para não abandonar por
completo a fábrica, a solução
foi usar a soja da região para a
fabricação do combustível, em
apenas alguns meses do ano. "A
usina foi fabricada prevendo o
uso da mamona, mas hoje é inviável porque o óleo da mamona chega a ser mais caro que o
próprio biodiesel", afirma o diretor de Relação com Investidores da Brasil Ecodiesel,
Charles Mann de Toledo.
Enquanto o faturamento da
usina em Floriano chegou a R$
13,376 milhões no terceiro trimestre de 2008, nos últimos
seis meses as vendas não passaram de R$ 605 mil. Com a reestruturação financeira da empresa, com dois aumentos de
capital neste ano e a posse de
uma nova diretoria, a fábrica
corre o risco de ser definitivamente fechada até o fim do ano.
"Estamos concluindo o planejamento estratégico e, se for
o caso, optaremos pelo fechamento", diz o diretor presidente da empresa, Mauro Cerchiari. Apesar de argumentar que o
fim da usina não necessariamente significa inviabilizar de
vez a Santa Clara, ele confirma
que os gastos com educação,
saúde e transporte dos agricultores do núcleo pesam no orçamento da empresa, que ainda
paga R$ 160 mensais a cada família mais uma cesta básica.
"Existe um problema e o governo se mostrou disposto a
ajudar. Pode ser por reforma
agrária ou podemos chegar a
um acordo para a liberação antecipada das terras, que dentro
de mais cinco anos já passariam
aos moradores", diz Cerchiari.
Mas a Folha apurou que,
diante do fracasso do projeto, a
empresa aceitou devolver a
área ao Estado. Agora o Instituto de Terra do Piauí prepara a
transferência da área em definitivo à União. O texto será encaminhado pelo governador
Wellington Dias (PT) à Assembleia Legislativa para que tramite em regime de urgência.
A Petrobras também entrou
na jogada para amenizar o estrago. Quem está à frente dessa
operação panos quentes é o ex-ministro da reforma agrária
Miguel Rossetto, hoje presidente do braço da estatal para
biocombustíveis.
A ideia é usar a mamona não
mais como fonte de energia renovável e sim para a produção
de cosméticos, por exemplo. Já
o Incra planeja a produção de
frutas na Santa Clara, como
manga, caju e melancia.
Todos têm pressa: a Brasil
Ecodiesel se livra de um problema, o governo do Piauí repassa ao Incra a responsabilidade por essas 600 famílias, a
Petrobras evita a criação de um
novo bolsão de miséria e o Incra aproveita uma área com infraestrutura básica montada
(água, luz, energia e moradia).
Assim que a Assembleia do
Piauí autorizar a entrega da
área ao governo federal, o Incra
fará a seleção das famílias e um
plano de assentamento. Uma
estimativa do órgão é que de
6% a 8% das famílias não possuem aptidão para o trabalho
rural, ou seja, podem não ser
incluídas na divisão dos lotes.
"Temos pressa porque o objetivo inicial [com o biodiesel]
era melhorar a renda dessas famílias", diz Luís Ribeiro, diretor-geral do Interpi (Instituto
de Terras do Piauí).
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