São Paulo, Sexta-feira, 10 de Dezembro de 1999


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RECUO
Após interferência de Malan, banco eleva previsão de crescimento do país e diz que público apóia ajuste fiscal
Pressionado, Bird abranda relatório

Alan Marques - 27.out.99/Folha Imagem
Gobind Nankani, diretor do Bird para o Brasil


MARCIO AITH
de Washington

Pressionado pelo governo brasileiro, o Bird (Banco Mundial) voltou atrás ontem em sua previsão de crescimento da economia brasileira para o próximo ano, dois dias depois de tê-la divulgado e um dia após ter sido criticado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso.
Na última terça-feira, em Washington, após divulgar um relatório com perspectivas econômicas de países em desenvolvimento, Mick Riordan, economista do banco, questionado sobre as previsões para o Brasil, disse que o banco prevê uma leve recessão (queda de 0,4% no PIB) para o país em 1999 e um crescimento de 2,5% da economia no próximo ano, um ritmo bem menor que os 4% previstos pelo governo brasileiro e pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) em setembro.
O Banco, por meio de Riordan e de outros dois representantes da instituição que participaram da entrevista coletiva, apontou ainda a existência de uma "fadiga de reformas" no Brasil e em outros países da América Latina que estaria limitando o crescimento da região e foram específicos com relação à necessidade de o Brasil reduzir seu déficit orçamentário.
Ontem, dois dias após a entrevista e de uma reação irada do presidente FHC num fórum internacional, o diretor do Bird para o Brasil, Gobind Nankani, soltou uma nota em Brasília voltando atrás na estimativa para 2000 e tentando transformar em elogios a análise sombria que havia sido divulgada em Washington.
Diz a nota oficial: "A previsão operacional oficial do Banco Mundial para o crescimento do PIB do Brasil no ano 2000 é de 3,5% a 4%, faixa usada em todas as estimativas dos projetos do Banco do Brasil. A taxa de 2,5%, divulgada pela imprensa, não consta do recém-lançado relatório "Perspectivas Econômicas Globais e os Países em Desenvolvimento - 2000", conforme admitido nas matérias".
A nova previsão é praticamente a mesma da usada oficialmente pelo governo brasileiro.
Depois da pressão política, o Bird tentou, por intermédio de um porta-voz, desautorizar o trabalho técnico. "Esse é o número (2,5%) de um economista de um departamento de pesquisa do banco. A equipe que acompanha o país de maneira mais detalhada não confirma esse número".
A nota diz ainda que o Bird "aplaude a atuação do governo brasileiro na área fiscal em 1999" e que "essa atuação previdente e responsável, que conta com o apoio da sociedade, possibilitou resultados fiscais históricos".
No relatório divulgado na terça-feira, o banco diz que o grande aumento da dívida interna entre 1997 e 1999 e um baixo nível de poupança exigem um ajuste fiscal forte e contínuo. Esse ajuste tem encontrado resistência pública. Segundo o relatório, "resistências às reformas estão crescendo em alguns países, colocando desafios políticos aos governos num momento em que enfrentam eleições, poderes legislativos divididos e decisões políticas difíceis".
Uri Dadush, diretor do Bird, classificou as resistências em reduzir o déficit orçamentário no país como um quadro pior do que a simples fatiga de reformas. "Tomem cuidado para não classificarem como fatiga de reformas casos onde simplesmente não há reforma. É o caso do déficit orçamentário brasileiro, que já está assim por um bom tempo."

Pressão do Brasil
A Folha apurou que tal reviravolta do Bird resultou de duas fortes fontes de pressão feitas pelo governo brasileiro. O ministro da Fazenda, Pedro Malan, mandou que relatassem a Nankani a reação do presidente FHC e que a divulgação desses dados servem de combustível para que a imprensa ("em especial a Folha de S. Paulo") critique o governo. Nankani, que não sabia que as declarações haviam sido dadas por Riordan, mandou um relatório interno para o Bird em Washington, descrevendo o estrago que as matérias haviam causado.
Outro foco de pressão veio do diretor brasileiro no Bird, Murilo Portugal, que agiu de duas formas. Internamente, tentou descobrir quem havia passado à imprensa a previsão de 2,5%. Ao descobrir a origem, criticou Riordan por ter divulgado uma previsão de um país quando o relatório deveria ser apenas regional.
Procurado pela Folha, Portugal não havia ligado de volta até as 4h de Washington (7h de Brasília).


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