São Paulo, quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

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PIB / PERSPECTIVAS

Analistas já esperam retração econômica

Crise global atinge o Brasil com mais força no último trimestre, abalando a confiança de empresários e consumidores

Economistas apontam excesso de cautela dos agentes econômicos e prevêem retração de até 1% no quarto trimestre do ano

DO ENVIADO AO RIO
DA SUCURSAL DO RIO

A fotografia do PIB no terceiro trimestre retrata uma realidade que não existe mais. Desde o estouro mais forte da crise internacional, no final de setembro, a conjuntura mudou radicalmente, com queda de produção, demissões e deterioração de expectativas de empresários e consumidores.
Diante desse novo cenário, consultorias já revisam projeções e esperam até uma retração do PIB no quarto trimestre.
A MB Associados prevê queda de até 1% ante o terceiro trimestre. A Tendências projeta retração de 1,3%. A LCA estima uma taxa estável.
O otimismo do terceiro trimestre deu lugar à descrença.
"A conjuntura mudou muito a partir de outubro. E mudou para pior", resume Bráulio Borges, economista da LCA.
Os dados já disponíveis comprovam a deterioração. A produção da indústria caiu 1,7% de setembro para outubro, segundo o IBGE. A LCA prevê queda ainda maior em novembro: 3%. Tal retração é resultado, entre outros fatores, da freada brusca da indústria automobilística, cuja produção caiu 34,4% em novembro -em outubro, já havia caído 11,6%. Já o emplacamento de veículos novos caiu 13,4% em outubro e novembro deste ano em comparação com igual período do ano passado. "Desde a crise asiática, não se via uma contração tão expressiva do setor", afirma Borges.
Leonardo Carvalho, do Ipea, diz que o setor convive com um elevado nível de estoques -superior a 300 mil veículos, mais do que o dobro do normal. Outros ramos, diz, também estão muito estocados -o que reduz a perspectiva de reação.
Outro indicador de que este trimestre será mais fraco que o anterior é o fluxo de veículos pesados nas estradas, que caiu 2% em novembro em relação a outubro e 1% sobre novembro do ano passado. Em outubro, o fluxo de veículos pesados nas estradas já havia caído 0,8% sobre setembro, segundo a ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias) e a Tendências Consultoria.
A indústria eletroeletrônica, outro exemplo, vendeu 15% menos em outubro e novembro em relação a igual período de 2007, segundo informa um empresário do setor.
"O cenário econômico brasileiro é completamente outro neste trimestre. Os setores mais dependentes de financiamento foram os mais afetados", afirma Júlio Gomes de Almeida, consultor econômico do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial).
Com tal cenário, o emprego industrial estagnou em outubro.

Expectativas
Outro dado preocupante é a piora rápida e intensa das expectativas de empresários e consumidores, que atingem os menores níveis desde 2003.
Segundo a FGV, o índice de confiança da indústria caiu 19,4% de outubro para novembro. O indicador já havia recuado 9,2% em outubro. Já o índice de confiança dos consumidores cedeu 4,2% de outubro para novembro. "Os dados mostram uma excessiva cautela, que pode resultar num recuo tanto de investimentos como de consumo, o que certamente vai afetar a economia", avalia Ronaldo Souza, do Iedi.
A Associação Comercial de São Paulo vê redução no consumo desde outubro. As vendas a prazo, medidas pelo número de consultas ao SPC, que vinham crescendo 8,3% de janeiro a setembro, subiram 2,8% em outubro, novembro e início deste mês sobre igual período de 2007. As vendas à vista caíram 1,1% a partir de outubro sobre igual período de 2007.
"Isso só muda se a oferta de crédito voltar a crescer e o consumidor voltar a ter confiança na economia", diz Emílio Alfieri, economista da ACSP.

Ação
Para o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, é hora de o governo agir. "A crise é muito séria e já atingiu o Brasil. Podemos agora reagir como um coelho, e encostar em um canto, ou com coragem. Se o governo conseguir sustentar o dólar valorizado, baixar os juros e tomar medidas para aumentar a demanda, como mais seguro-desemprego e obras de infra-estrutura, podemos retomar o crescimento em grande estilo daqui a um ou dois anos."
Para o ex-ministro Antonio Delfim Netto, "o Brasil importou a expectativa [de crise] antes da própria doença" e está pagando um "preço caro por algo que está mais para gripe do que para pneumonia". Para ele, não existe "a menor hipótese" hoje de saber precisamente como será o ano de 2009.
Ana Maria Castelo, da FGV, diz que os dados indicam o começo de um ciclo vicioso na economia. "O problema é a profecia que se auto-realiza. A indústria produz menos diante de uma expectativa de queda de demanda. Mas não podemos nos esquecer de que, antes de começarmos a falar em crise, havia necessidade de desaceleração por conta da inflação."

Colaborou FÁTIMA FERNANDES, da Reportagem Local



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