São Paulo, terça-feira, 11 de janeiro de 2005

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SISTEMA FINANCEIRO

Alta no preço de serviços nos últimos dois anos ultrapassa IPCA-15; analistas vêem falta de concorrência

Reajuste de tarifas bancárias supera inflação

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

O preço de algumas tarifas bancárias aumentou nos últimos dois anos numa proporção bem maior do que a inflação média acumulada no período. Existem casos de reajustes de até 100% dependendo do serviço e do banco, segundo levantamento feito pela Folha com base em dados das próprias instituições financeiras.
De janeiro de 2003 a dezembro de 2004, o IPCA-15 (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) teve alta de 18,13%. Já as tarifas, por sua vez, subiram mais. No ABN-Real, por exemplo, o cartão magnético aumentou 100% -de R$ 4,50 para R$ 9,00. Foi a maior variação apurada entre os sete maiores bancos do país.
A Folha pesquisou cinco tarifas: DOC, talão de cheque, cheque avulso, ficha cadastral e cartão magnético. Outros bancos também promoveram aumentos acima da inflação média. O segundo talão mensal no Bradesco passou de R$ 6,00 para R$ 9,70, com alta de 61,7% em dois anos. Já o DOC pela internet, cuja tarifa estava estável até o final de 2004 em R$ 5,40 por operação, saltou para R$ 8, alta de 48,2%.
No Itaú, o segundo talão do mês subiu 33,3% (de R$ 0,90 para R$ 1,20), a maior alta entre as tarifas do banco que foram pesquisadas. O cheque avulso no ABN também subiu acima da inflação: ficou 66,7% mais caro, passando de R$ 1,50 para R$ 2,50.
Os aumentos também ocorreram nos bancos públicos. Na Caixa Econômica Federal, o cartão sofreu um reajuste de 32,7% em dois anos, indo de R$ 5,20 para R$ 6,90. No Banco do Brasil, ele subiu 30% -de R$ 2,30 para R$ 3,00.
O HSBC foi o único do bancos analisados cujas tarifas subiram menos que a inflação do período -o talão, item que mais aumentou, teve alta acumulada de 10%.
Procurados, os bancos informam, de modo geral, que os custos com a confecção de talões e cartões e outros serviços se elevaram, o que os obrigou a reajustarem suas tabelas. Também informam que os pacotes de tarifas, pelos quais o cliente paga um valor mensal fixo para ter acesso a vários serviços, são uma opção mais barata para o consumidor.

Sai inflação, entra tarifa
Já o analista Luis Miguel Santacreo, da Austin Asis, afirma que, com a inflação em nível baixo, os bancos passaram a ter nos serviços uma importante fonte de receita: "Houve uma política deliberada de começar a faturar com tarifas, que passaram a ser vistas como uma alternativa de receita. O ganho com a inflação permitia ao banco não cobrar por serviços".
Segundo Santacreo, de 1994 para cá foram incorporados novos serviços, antes prestados gratuitamente, e seus preços aumentaram. Na visão dele, um dos motivos que explica os aumentos é a falta de concorrência no setor.
"A promessa de que os estrangeiros que vieram para o Brasil seriam capazes de acirrar a competição ainda não se cumpriu. Eles acabaram se acostumando a operar no cenário de "spreads" altos", afirma o analista.
Economista do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, órgão ligado ao Ministério do Planejamento), Lúcia Helena Salgado diz que falta ao BC dar mais atenção ao nível de concentração do setor e as implicações negativas que isso pode trazer ao consumidor.
Segundo a economista, ex-conselheira do Cade, o BC se preocupa principalmente com a questão de "risco sistêmico" (do banco quebrar por problemas de liqüidez) ao analisar uma fusão bancária, sem dar a mesma atenção a questões de interesse do consumidor, como tarifas, por exemplo.
Salgado afirma ainda que o Brasil é o "único país do mundo" onde não há um sistema de defesa da concorrência completo para o setor bancário. É que o ramo não está sob a responsabilidade do Cade, diferentemente de outros países nos quais o Banco Central e órgãos de defesa da concorrência atuam juntos.
Ambos os especialistas afirmam que os "spreads" bancários poderiam cair se a concorrência fosse maior. Indagada sobre o tema, Salgado afirmou: "É o que acontece em qualquer mercado. Se o cliente está desconte e tem uma opção, vai procurar uma taxa menor, uma tarifa menor".


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