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Crédito imobiliário avança e flerta com derivativo no país
Plano é transformar empréstimos a mutuários em títulos negociados no mercado para elevar os recursos disponíveis
Crédito para o setor em relação ao PIB é inferior ao de outros emergentes; modelo levado ao extremo detonou a crise de hipotecas nos EUA
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
O mercado imobiliário brasileiro, um dos mais atrasados do
mundo em termos de crédito,
se prepara para dar o seu maior
salto a partir deste ano. A aposta é repetir o sucesso das empresas brasileiras que abriram
capital e buscar recursos para o
financiamento da compra de
imóveis no mercado de capitais, incluindo o uso de derivativos, como ocorre nas principais economias do mundo.
Para atrair o dinheiro dos
fundos de pensão e de investimento, os empréstimos têm de
passar pelo processo de "empacotamento", chamado de securitização, em que são convertidos em título com liquidez no
mercado. Nele, uma dívida de
30 anos vira um papel com preço, variando de acordo com um
"rating" (nota) dado por agência de risco, oferta e demanda.
Essa "engenharia", que usa
derivativos [contratos que "derivam" de outro ativo; no caso,
de crédito] foi amadurecida nos
EUA, onde papéis de alto risco
levaram à crise das hipotecas
de segunda linha ("subprime").
Para os fundos de investimento, os papéis imobiliários
podem se tornar opções de baixo risco de crédito -a inadimplência gira em 2,5%- com ganho superior ao dos títulos do
governo. Até há pouco tempo,
não havia mercado para esses
papéis devido ao baixo retorno.
Já os fundos de pensão têm interesse em papéis com vencimento daqui 20 anos, quando
pagarão mais aposentadorias.
"Todas as condições estão
dadas para esse mercado decolar. E sem os excessos vistos
nos EUA", disse Fernando Brasileiro, presidente da Cibrasec,
maior securitizadora do país.
Flexibilizar a poupança
O caminho de acesso ao mercado de capitais passa pela flexibilização das regras da poupança, principal fonte de recursos do setor, que poderia ser
melhor aproveitada se os bancos não tivessem de esperar até
a última prestação do imóvel
para retirá-lo do balanço.
Hoje, os bancos precisam
manter em carteira empréstimos imobiliários correspondentes a 65% da captação da
poupança, sob pena de o montante não utilizado ficar retido
como compulsório sem remuneração no Banco Central.
Com um pequeno ajuste na
regra, as instituições financeiras poderiam utilizar os 65% da
poupança, e ainda ficar livres
para ""empacotar" o empréstimo e vendê-lo no mercado.
A proposta tem apoio do governo e do Banco Central. A
Folha apurou no BC que a única objeção é que os bancos "reciclem" recursos baratos da
poupança e usem o dinheiro
para empréstimos de retorno
maior, ou seja, que não destinem ao crédito imobiliário.
Entidades do setor defendem
que os bancos cumpram os 65%
de direcionamento somente
pela originação do empréstimo.
Dessa forma, o banco "recicla"
o dinheiro da poupança, embolsa o lucro total da operação
antes do vencimento, e obtém
dinheiro novamente para fazer
outro empréstimo utilizando o
mesmo volume de recursos.
"O Sistema Financeiro da
Habitação incentiva os bancos
a não fazerem novas concessões para manter o estoque de
crédito. Precisamos reoxigenar
esse processo", diz o advogado
Alexandre Assolini, presidente
da comissão criada pela BM&F
Bovespa para estudar como
destravar o crédito imobiliário.
"Estamos falando em colocar
uma rodinha no crédito imobiliário. Enxergamos 2010 como
o ano em que a gente vai ter um
novo sistema de financiamento, com a conjugação dos mercados imobiliário e financeiro",
disse Celso Petrucci, economista-chefe do Secovi-SP (sindicato do setor em São Paulo).
A flexibilização da poupança
tem potencial para alavancar o
crédito imobiliário, que não
passa de 2,7% do PIB, atrás de
México (9%), Chile (17%) e
EUA (65%), entre outros.
Segundo especialistas, o atraso do Brasil no crédito imobiliário é uma das últimas heranças do período inflacionário. Só
não aconteceu ainda porque o
país tinha juros altos, que impediam financiamentos longos
-em seis anos, uma dívida duplica com juro anual de 12%.
O Brasil é também um dos
países com menor participação
do mercado de capitais no financiamento imobiliário. Segundo a consultoria Accenture,
só 2,3% do crédito imobiliário
veio do mercado; nos EUA, chega a 63%, e, no México, a 8%.
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