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País paga preço do sucesso, diz Mantega
Ministro afirma que real valorizado é resultado de bom momento da economia e nega defender um "tranco" na taxa Selic
Para Mantega, Brasil é "máquina de gerar dólares" e países que crescem
mais de 7% vão encontrar pontos de estrangulamento
LEANDRA PERES
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O Brasil está pagando "o preço do sucesso". Essa é a razão
que Guido Mantega (Fazenda)
aponta para a recente onda de
valorização do real ante o dólar-a moeda chegou a ser cotada a R$ 2,08 na semana passada, mas encerrou o período a
R$ 2,109.
A redução no ritmo de queda
dos juros teria sido outro fator,
embora o ministro considere
que a questão de "fundo" é que
o Brasil hoje é um "uma máquina de gerar dólares". A proposta de maior abertura da economia às importações como solução para o problema não é bem-vista pelo ministro.
Crítico dos juros altos a ponto de cobrar publicamente reduções na taxa do presidente
do Banco Central, Henrique
Meirelles, Mantega compara o
país a um viciado em drogas para dizer que não defende um
"tranco nos juros". "[O Brasil] é
como um viciado acostumado a
uma dose elevada de droga. De
repente você tira, não dá certo."
O gradualismo de Mantega
não o leva a defender a autonomia legal do BC. Para ele, o modelo atual é eficaz, já que "o ministro da Fazenda reclama, o
presidente reclama, mas o BC
não funciona ao sabor de pressões políticas". Leia trechos de
entrevista concedida à Folha
na quinta.
FOLHA - A que o sr. atribui essa valorização do real nos últimos dias?
GUIDO MANTEGA - A um conjunto de fatores. Um deles foi a definição de que não haveria aumento da taxa [de juros] do Fed
[o BC dos EUA], o que levou a
um cenário internacional mais
otimista. Ao mesmo tempo, o
Brasil tem mais segurança,
mais estabilidade, boas perspectivas para a economia com o
PAC, com taxa de rentabilidade
financeira ainda elevada. Essa
combinação atrai movimento
de aplicações. Quando o Copom reduziu a queda da taxa,
garantiu rentabilidade maior
para aplicações financeiras.
FOLHA - Então a decisão do Copom
teve impacto na valorização do real?
MANTEGA - A questão é que o
Brasil tem excelente saldo comercial, reservas crescentes
chegando a quase US$ 93 bilhões, é uma máquina de gerar
dólares. Nossa rentabilidade financeira é superior à do dólar.
FOLHA - O senhor acredita numa
reversão desse movimento que leve
à valorização do dólar?
MANTEGA - É muito cedo para
dizer que houve desvalorização
que levou o câmbio a um novo
patamar. A taxa não vai voltar
ao passado. Aquele câmbio de
R$ 3 era porque a economia estava fragilizada, havia riscos
que hoje não existem. Estamos
pagando em parte o preço do
sucesso. Até o sucesso tem um
preço! Mas prefiro pagar o preço do sucesso ao do fracasso.
FOLHA - Houve um ataque especulativo ao BC?
MANTEGA - Não acho que foi
um teste, é mais questão de
oportunidade. Você tem liquidez internacional, o pessoal está querendo ganhar dinheiro
em algum lugar.
FOLHA - Se a origem do problema
cambial é o saldo comercial, o máximo que o governo pode fazer é estimular importação...
MANTEGA - O governo não precisa estimular importação.
Tem gente que diz: "Vamos
abrir mais a economia". Como
abrir mais? Se você tem câmbio
valorizado, barateou as mercadorias estrangeiras. A abertura
já existe e isso é uma arma poderosa contra a inflação.
FOLHA - Países como Argentina e
Rússia têm crescido a taxas mais elevadas, acompanhadas por inflação
mais alta. É uma opção para o Brasil?
MANTEGA - Estamos trilhando
um caminho talvez mais moderado, mas mais seguro. É a filosofia do nosso governo. É uma
temeridade certos países crescendo a 7%, 8%, 9%, vão encontrar pontos de estrangulamento e isso pode reverter. O Brasil
está acelerando o crescimento
de maneira consistente e sólida. Essa é a nossa diferença.
FOLHA - Tem algum jeito de o governo suavizar o preço do sucesso?
MANTEGA - Os juros vão continuar caindo, a importação vai
continuar aumentando e o governo vai continuar fazendo reservas. Esses três fatores, impulsionados pelo crescimento,
deverão caminhar para o equilíbrio cambial mais favorável à
produção doméstica.
FOLHA - O senhor discorda da redução de 0,25 ponto na taxa de juros?
MANTEGA - Fico satisfeito
quando ela cai, e está caindo.
FOLHA - Em que período pode se
esperar câmbio mais favorável?
MANTEGA - Com o PAC, vamos
mudar de patamar de crescimento. O ano de 2007 é um
ponto de inflexão, em que você
vai dar o salto em direção ao
crescimento maior. Nos últimos 20 anos, o Brasil teve planos de estabilização. Mesmo o
Real, se você olhar, não é plano
de crescimento. Dos últimos
planos, o Real é um dos melhores, mas é de estabilização.
FOLHA - Mas bem-sucedido no
combate à inflação.
MANTEGA - Relativamente
bem-sucedido porque tivemos
que depois emendar, deixou
uma série de problemas, mas
não vou entrar nessa discussão.
O que quero salientar é que, finalmente, depois de 20 anos, a
agenda de desenvolvimento foi
colocada no país pelo PAC. É
consistente, não vi nenhuma
crítica substantiva. À medida
que vamos mostrando resultados, essas críticas caem por terra. Por exemplo, fiquei 2006 inteiro ouvindo que o governo
não iria atingir a meta de superávit primário. Fizemos resultado acima dos 4,25%. E aí? Cadê os críticos? Estão caladinhos
lá. O pior é que ganhamos pouco e eles ganham muito dinheiro dando consultoria.
FOLHA - Para economistas como
Persio Arida, André Lara Resende e
Edmar Bacha, a explicação para a taxa de juros no país são incertezas jurídicas. Qual é a explicação do sr.?
MANTEGA - A taxa está caindo.
No governo passado, você usava taxa de juro para atrair capital estrangeiro porque tinha
desequilíbrio das contas externas. Se isso foi eliminado, não
há razão para termos juros diferentes de outros países e estamos caminhando para isso.
FOLHA - Não existe um patamar-limite para o juro real no país?
MANTEGA - Não, não tem nenhuma restrição. Tudo isso era
bobagem. Já ouvi dizer que a
restrição era o juro real de 10%.
É coisa de especulador, de rentista, quem quer ganhar bastante e, então, cria-se esse mito.
Não sou favorável a que você dê
um tranco nos juros, tem de ir
gradualmente. É como o viciado, estava acostumado a uma
dose elevada de droga, de repente você tira, não dá certo.
Tem de tirar gradualmente.
FOLHA - Luiz Marinho (Trabalho) e
Ricardo Berzoini (presidente do PT)
defendem que se tire a droga de
uma vez. Atribuíram a situação do
mercado de câmbio à redução do ritmo da queda dos juros. Atrapalha o
processo esse tipo de declaração?
MANTEGA - As pessoas podem
externar suas opiniões, mesmo
não sendo especialistas no assunto. País democrático é isso.
FOLHA - Mas isso não atrapalha,
quando as críticas são muito ácidas,
a condução da política econômica?
MANTEGA - Não acredito, dada a
solidez da nossa economia. Se
fosse em outro momento e alguém dissesse "vai cair o presidente do BC", provavelmente
quem lançou o boato estava
operando no mercado futuro.
Solta o boato, mexe um pouquinho com as cotações e o sujeito
ganha dinheiro. O Brasil hoje
está sólido o suficiente para
permitir qualquer discussão.
FOLHA - Em momentos de boataria, menos gente ganharia dinheiro
se tivéssemos um BC independente
legalmente?
MANTEGA - Não vejo vantagem.
O arranjo atual é eficaz, já tem
autonomia, às vezes o ministro
da Fazenda reclama, o presidente reclama, mas o BC não
funciona ao sabor de pressões
políticas.
FOLHA - Com o PAC, quanto vamos
crescer neste ano?
MANTEGA - Com certeza acima
de 4%.
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