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Margem para exportar álcool é pequena
Apesar de Brasil ter alta produtividade, fatores como demanda interna forte e ausência de regulação atrapalham planos de exportação
Falta de políticas públicas para o desenvolvimento do setor e concorrência de
outros países também são apontados como empecilhos
CLÁUDIA DIANNI
HUMBERTO MEDINA
IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo proclama a liderança do Brasil na área de etanol, mas o país ainda não está
totalmente preparado para
aproveitar as oportunidades.
Apesar da alta produtividade,
o país é limitado pela forte demanda interna e pela falta de
políticas públicas para orientar
o desenvolvimento do setor.
As preocupações mundiais
com o aquecimento global levam a uma corrida para assegurar fontes de energia que não
emitam monóxido de carbono.
Isso aumenta a demanda, mas o
Brasil ainda não tem um marco
regulatório que garanta o abastecimento doméstico e regule
os estoques de etanol, por
exemplo.
O país também não criou políticas públicas para incentivar
exportações, não só de etanol
mas de equipamentos para
montagem de usinas, motores
"flex" ou modelos de gestão.
Segundo o BNDES (Banco
Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social), não falta
crédito para financiar o setor.
Os gastos do banco com projetos relacionados ao etanol aumentaram de R$ 730 milhões
em 2002 para R$ 2,1 bilhões no
ano passado e já há projetos para a construção de 100 novas
usinas até 2012, além das 23
que estão em construção hoje.
O problema é de velocidade
no desenvolvimento de políticas públicas para o setor. Com
mais de 30 anos de experiência
no uso do etanol como combustível e a produção mais competitiva do mundo, o Brasil foi ultrapassado em 2006 pelos
EUA, que, mesmo com custo de
produção 30% maior, produziram quase 20 bilhões de litros
de etanol, enquanto o Brasil
produziu 14,3 bilhões de litros.
Limitações
Na avaliação do governo, três
fatores limitam a ampliação da
participação do Brasil no mercado mundial de etanol: a demanda do mercado interno, a
concorrência com a produção
de outros mercados, como África e América Central, e a questão da dependência.
"A folga para exportar é pequena", avalia Roberto Ardenghy, superintendente de
Abastecimento da ANP (Agência Nacional do Petróleo). "Os
outros países não vão querer ficar dependentes do álcool brasileiro. A exportação vai ocupar
um nicho de mercado", avalia.
Ele afirmou que, além da
procura por veículos "flex", há
uma "demanda cativa", de
aproximadamente 6 bilhões de
litros por ano, para o álcool que
é misturado à gasolina.
De acordo com o monitoramento feito pela ANP, 89 novas
usinas devem entrar no mercado nos próximos cinco anos,
com capacidade para produzir
6 bilhões de litros. Cerca de
40% do aumento da oferta deve
ir para o mercado externo.
Para Ardenghy, o mercado
europeu tende a ser suprido
por países africanos. "Nossa
opção é vender a tecnologia
brasileira", disse.
Ricardo Dornelles, diretor do
Ministério de Minas e Energia,
afirma que a liderança do Brasil
não tem que ser necessariamente na produção, e sim na
tecnologia. "Temos que manter
a capacidade de produzir grandes volumes com preços competitivos."
A ANP e o Ministério de Minas e Energia defendem que o
álcool seja uma "commodity
energética" e tenha tratamento
semelhante ao dado à gasolina
para exportação.
Hoje, um decreto estabelece
que, para haver exportação de
gasolina, o mercado interno
precisa estar atendido. Não há
essa restrição para o álcool.
Acompanhando os contratos
de exportação, a ANP tem como ver, com antecedência de
seis meses, se haverá problema
de abastecimento do mercado
interno e informar o governo.
Estratégia
A Petrobras tem analisado
oportunidades para aproveitar
a crescente demanda por etanol. Ela se associou à trading japonesa Mitsui e pretende construir entre 30 e 40 usinas no
país, com produção voltada só
para exportação. A expectativa
da estatal é que o mercado japonês demande 3,5 bilhões de
litros por ano em 2011.
"A posição do Brasil é muito
confortável, a nossa produtividade é muito boa. A tendência é
o Brasil ser um grande supridor
de etanol", avalia Paulo Roberto Costa, diretor de Abastecimento da Petrobras.
Outra iniciativa da estatal vai
começar nos próximos meses
em Pernambuco. O projeto
prevê o financiamento do Banco do Nordeste para a construção de destilarias gerenciadas
por cooperativas de produtores
de cana. A estatal assumiria em
contrato a exclusividade na
compra do etanol produzido.
O ritmo de implementação
do projeto demonstra a velocidade com que o governo lida
com a questão. "Talvez consigamos montar uma destilaria-piloto em 2007, mas isso é coisa
para começar no ano que vem
ou no outro", disse Geraldo
Carneiro Leão, presidente do
sindicato dos produtores de cana-de-açúcar de Pernambuco.
Público e privado
Para o professor Weber
Amaral, da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de
Queiroz), da Universidade de
São Paulo, ainda há tempo de
alcançar a dianteira no desenvolvimento de tecnologias para
produção de etanol, como a hidrólise da cana-de-açúcar.
Mas seria necessário maior
empenho do governo ou da iniciativa privada em aglutinar esforços e planos hoje dispersos
em uma única rede em um projeto nacional. E isso a Alemanha, os Estados Unidos e a
França já vêm fazendo com
mais eficiência do que o Brasil.
Segundo Amaral, se não houver uma liderança nacional capaz de "olhar para a tecnologia
do futuro" e investir pesadamente nisso, o Brasil corre o
risco de continuar sendo um
grande exportador de produtos
agrícolas, e não de tecnologia.
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