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OPINIÃO ECONÔMICA
Câmbio, câmbio, câmbio
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Pressionado pela opinião
pública, o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), voltou atrás e resolveu encaminhar ao Conselho de Ética representação contra o ex-ministro
José Dirceu. Explicou o recuo da
seguinte forma: "Não tenho idéia
fixa. Quem tem idéia fixa é doido".
Não gostei. O que seria de um
colunista de economia sem três ou
quatro idéias fixas? Uma das minhas, já antiga, é o câmbio. Tenho
sido fiel a essa fixação ao longo
dos anos. Trato do assunto recorrentemente nesta coluna. E, no livro que acabo de publicar, "O
Brasil e a Economia Internacional", o câmbio aparece com destaque em quatro dos seis capítulos.
Dólar abaixo de R$ 2,30! Não
vamos nos iludir: a valorização
acentuada do real terá efeitos importantes sobre as contas externas
e a atividade econômica. Como o
balanço de pagamentos está bastante forte, não há emergência à
vista. Mas os problemas estão se
tornando mais visíveis a cada dia
que passa.
Alguns exemplos:
1) A taxa de crescimento das exportações, que ficou acima de
30% em 2004, caiu para 24% no
acumulado do ano até a primeira
semana de agosto. A queda só
não é maior porque o cenário comercial externo continua favorável.
2) O "quantum" exportado de
manufaturados mostra uma tendência de rápida desaceleração,
com a taxa de expansão diminuindo de quase 30% até fevereiro para cerca de 20%. No caso dos
semimanufaturados, a tendência
é a manutenção de um crescimento em torno de 8%. Nos produtos básicos, o ritmo de expansão caiu para cerca de 10% (Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior, "Boletim de Comércio Exterior", julho de 2005).
3) Outros itens do balanço de
pagamentos estão acusando os
efeitos do real forte. No primeiro
semestre, as remessas de lucros e
dividendos aumentaram 58% em
comparação com igual período de
2004. Na mesma comparação, os
gastos com viagens internacionais aumentaram 66%. O déficit
na conta de serviços (viagens,
transportes, aluguel de equipamentos, computação e outros)
praticamente dobrou, ao passar
de US$ 1,8 bilhão no primeiro semestre de 2004 para US$ 3,5 bilhões no primeiro semestre deste
ano (Banco Central do Brasil,
"Nota para a Imprensa - Setor Externo", julho de 2005).
4) Em relação a uma cesta das
principais moedas, a divisa brasileira acumulou valorização real
de 25% entre junho de 2004 e junho de 2005. O índice de rentabilidade das exportações registrou
perda de 20% no mesmo período
(Fundação Centro de Estudos do
Comércio Exterior, op. cit.). Note-se que esses cálculos foram feitos
com o dólar a R$ 2,40.
O governo fica de braços cruzados e deixa o câmbio à mercê do
"mercado". Leia-se: à mercê do
enorme diferencial de juros entre
o Brasil e o resto mundo. O ministro Palocci, num daqueles momentos de rara inspiração, declarou: "Um problema do câmbio
flutuante é que ele, às vezes, flutua".
Maravilha! Só que a flutuação
cambial pura e desimpedida é rara no mundo real, especialmente
nas economias menos desenvolvidas. Procurei explicar esse ponto
num dos capítulos do livro acima
citado. Em poucas palavras, as
conclusões são as seguintes: em
países como o Brasil, a flutuação
precisa ser acompanhada de intervenções do governo no mercado cambial e de controles seletivos
sobre os fluxos de capital. Um dos
objetivos permanentes deve ser
garantir uma taxa de câmbio
competitiva e razoavelmente estável. É o que têm feito os países
mais bem-sucedidos.
Mesmo nas economias desenvolvidas, o que predomina na
prática não é a flutuação pura de
livro-texto -essa que o ministro
Palocci aprendeu com os ortodoxos de galinheiro instalados no
comando do Ministério da Fazenda e do Banco Central. O modelo
cambial adotado pelos desenvolvidos caracteriza-se, em geral, por
intervenções seletivas e, às vezes,
coordenadas dos bancos centrais.
Essas intervenções procuram atenuar a volatilidade das taxas
cambiais e moderar "desalinhamentos" persistentes, isto é, períodos prolongados de sobrevalorização ou subvalorização cambial.
Praticar juros estratosféricos e
deixar a moeda nacional se valorizar sem limites é a receita ideal
para obstruir o desenvolvimento
e prolongar a estagnação que já
dura um quarto de século.
Paulo Nogueira Batista Jr., 50, economista e professor da FGV-EAESP, escreve
às quintas-feiras nesta coluna. É autor
do livro "O Brasil e a Economia Internacional: Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/Elsevier, 2005).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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