São Paulo, sexta, 11 de setembro de 1998

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LUÍS NASSIF

As projeções do Orçamento

Ainda hoje Murilo Portugal, ex-secretário do Tesouro, provoca saudades em alguns setores. Nos períodos de inflação alta, quando o dinheiro faltava, Murilo simplesmente decidia, por sua conta e risco, qual ministério teria as liberações adiadas.
Dependendo do período, um mês de atraso na liberação dos recursos significava reduzir em 20% o valor liberado. Obras eram paralisadas, custos adicionais eram agregados ao projeto, apenas para que o governo pudesse demonstrar ao mercado financeiro que as contas públicas estavam em ordem.
A estabilização inflacionária trouxe racionalidade ao Orçamento. Mesmo assim, montar uma peça orçamentária não é tarefa das mais fáceis. Não há histórico de estabilidade permitindo definir tendências e projeções mais seguras.
Existe um Plano Plurianual (PPA) de investimentos definido em 1996. A cada ano, por volta de março, o Ministério do Planejamento prepara a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que define os parâmetros a ser incluídos na proposta orçamentária, tomando por base as diretrizes do PPA. A LDO é entregue até 15 de abril.
No final de abril, a Seplan define limites para algumas despesas.
Os técnicos em Orçamento costumam dividi-lo entre "abaixo" e "acima" da linha. Acima da linha estão todos os itens de despesa e receita, excluindo juros. Abaixo da linha, a conta de juros.

Receita
Em torno de maio, Fazenda e Planejamento definem parâmetros de cenário econômico e solicitam à Receita Federal as contas de estimativa de Receita. Os indicadores relevantes são projeções de PIB, inflação, câmbio e taxas de juros.
O comportamento do PIB tem impactos diferentes sobre os diversos tributos. Por exemplo, o Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, em geral, é impactado pelo comportamento do PIB no ano anterior. Imposto de Importação depende de PIB, mas também de outras variáveis. O IOF não depende do PIB, mas das estimativas de movimentação financeira.
Na média, estima-se que cada ponto de PIB acrescente um ponto percentual de Receita. Ou seja, se o crescimento esperado do PIB cair de 4% para 1%, a receita diminuirá 3%.

Pessoal
O cálculo é feito levando em conta a evolução da quantidade de funcionários mais os benefícios automáticos da folha. Em geral, toma-se uma folha limpa como base (sem férias, sem 13º) e aplica-se o crescimento vegetativo estimado. Trabalha-se com projeção de crescimento vegetativo de 2%. Há três anos, chegou a quase 10%. De lá para cá foram tomadas diversas medidas que reduziram os reajustes automáticos.

Previdência Social
Há duas datas que definem as projeções do INSS: o reajuste do salário mínimo em maio e dos benefícios em junho. As projeções são preparadas pelos próprios quadros técnicos da Previdência. É relativamente fácil estimar a evolução do quantitativo (quantos entram no sistema e quantos morrem).
Em 1995 a Previdência Social estava equilibrada. Foi para déficits sucessivos de R$ 0,4 bilhão em 96, R$ 2,7 bilhões em 97, R$ 6,9 bilhões em 98 e projeção de R$ 7,1 bilhões em 99. Nesse total estão embutidos ganhos de R$ 1,7 bilhão com reforma da Previdência e R$ 700 milhões com ganhos de melhoria de arrecadação. A esse déficit, somam-se mais cerca de R$ 20 bilhões de déficit da área pública. Para despesas de R$ 22 bilhões, o setor público mal comparece com R$ 2 bilhões.

Juros
É a última conta a ser feita. Só faz na hora que se tem segurança de quanto efetivamente vai utilizar de receita tributária e da receita de privatização para abater dívida. Depois, projeta-se o estoque da dívida e calcula-se a diferença em cima da taxa de juros projetada. Essas contas são feitas pelo Tesouro, que utilizou projeção de taxa média de juros de 20,03% para o próximo ano.
Em geral, ocorre uma confusão com analistas. Entra na conta toda a despesa de juros, no conceito de caixa, inclusive juros pagos pelo Tesouro ao Banco Central. Como sai como despesa do Tesouro e receita do BC, as contas se anulam no final. Este ano o número bruto da conta de juros é de R$ 50 bilhões. Com a conta consolidada, cai para R$ 26,8 bilhões.

Recordando
Da coluna de 29 de abril de 1995:
"Solicito que, quando começar a quebradeira das empresas e voltar o desemprego em doses violentas, os senhores Ciro Gomes, Winston Fritsch e Gustavo Franco ocupem uma rede nacional de televisão para apresentar suas explicações para as loucuras que cometeram na política cambial.
Que tentem justificar seu experimentalismo, a politização do tema cambial, o jantar de comemoração pela volta dos déficits comerciais, as razões que os levaram a privilegiar o capital externo especulativo, em detrimento da segurança dos superávits comerciais.
De preferência, que as explicações sejam apresentadas no Maracanã ou em local que consiga abrigar as centenas de milhares de desempregados e de empresas quebradas por sua irresponsabilidade".
Da coluna de 23 de novembro de 1997:
"Tem-se, no fundo, uma aposta política. Se der uma mídi agora, o governo corre o risco de pressões de custo que aumentarão a recessão, um desapontamento geral com o Real e uma fase de tensão para rechaçar os apaches. Mas esse trauma será a dez meses das eleições.
Se não fizer a mídi agora e as exportações não se recuperarem, a próxima onda de ataque apache será contra o Brasil. Provavelmente às vésperas das eleições de 98".

E-mail: lnassif@uol.com.br



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