São Paulo, sábado, 11 de outubro de 2008

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Bolsas perdem seis "Brasis" na semana

Valor de mercado de ações recua US$ 6,2 tri no período, e Berlusconi sugere suspensão de pregões para definição de novas regras

Bolsa de NY tem a pior semana de sua história, ao cair 18%; em SP, Bovespa tem pregão suspenso e fecha em queda de 3,97%

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MADRI

Após o massacre de ontem nas Bolsas de todo o mundo -que elevaram as perdas globais em ações a impressionantes US$ 6,2 trilhões ou cerca de seis "Brasis" em apenas uma semana-, o primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi, deixou vazar que uma das hipóteses em estudo entre os governantes é a suspensão mundial das operações em Bolsa até que novas regras sejam definidas para a economia global.
"A crise é global e necessita uma resposta global. Fala-se de um novo Bretton Woods para definir novas regras e de suspender os mercados pelo tempo necessário para formulá-las", afirmou o premiê italiano.
Bretton Woods é o nome da cidade de New Hampshire (EUA) em que se definiram as regras que regeriam o planeta depois da Segunda Guerra Mundial, que acabaria um ano depois dessa cúpula, realizada em julho de 1944. Criaram-se então o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial.
As duas instituições ficaram completamente à margem da crise, tanto que as suas assembléias gerais estão rolando em Washington, enquanto continua incontrolável o "banho de sangue" nos mercados, conforme expressão de uma testemunha ocular, David Buik, da BGC Partners de Londres.
Caíram as ações, de Tóquio a Londres, passando por São Paulo e Nova York, caiu o petróleo (para US$ 77,70), mas subiu o ouro, velho refúgio contra incertezas. Chegou a US$ 925,05, o pico desde 31 de julho.
Islândia, Romênia, Rússia, Ucrânia e Indonésia mantiveram suas Bolsas fechadas. São Paulo chegou também a fechar apenas para reabrir em queda livre, embora tenha recuperado algo no fim do pregão (a queda foi de 3,97%). Na semana, o tombo na Bolsa paulista chegou a 20%.
A crise passou a ser "non-stop". As Bolsas asiáticas abriram quando Nova York fechava na véspera, com fortes perdas. Imitaram-na coletivamente, a ponto de a principal, a de Tóquio, ter caído 9,62%, atingindo o ponto mais baixo em 20 anos.
Quando as Bolsas européias abriram, Tóquio já estava fechando em quase colapso, que se trasladou à Europa. Londres caiu 8,85%. Madri recuou 9,14%, a maior queda de sua história. Paris fechou em baixa de 7,73%. Na Alemanha, a queda foi de 7,01%.
Quando a Europa sangrava, Nova York abria em queda -que chegou a 8%. Houve recuperação no final, e o Dow Jones fechou em baixa de 1,49% -quase nada ante o "banho de sangue" no resto do planeta. Na semana, a queda foi de 18%, a pior da história;
Causa do "banho de sangue"? É esta, no resumo de Martin Slaney, da GT, uma das empresas que apostam em derivativos: "Estamos assistindo a uma venda maciça de ativos em escala global devido a uma combinação de puro pânico com completa incerteza sobre o futuro das grandes economias". Posto de outra forma: os investidores estão "pondo preço na possibilidade de uma depressão global".

Pânico
Concorda com ele David Buik, o que cunhou a expressão "banho de sangue": "É puro pânico cego". Mas completa: "Nós sabemos que estamos indo para uma recessão, sabemos que o sistema bancário está em crise, mas é realmente necessário mergulhar nessa profundeza?", pergunta, mas não responde.
Profundeza tamanha que John Paul Rathbone, subeditor da coluna "Lex" do jornal britânico "Financial Times", escrevia ontem que "a escala do crash nos mercados é tal que estaria melhor agora quem, 12 anos atrás, tivesse posto seu dinheiro num cofrinho embaixo da cama e fosse dormir. Ao acordar hoje, ainda teria algo para gastar".
Ninguém, nos mercados ou nos governos, arriscou-se ontem a prever quando o valor das ações começará a emergir das profundezas.
Mas George Irvin, pesquisador da Universidade de Londres, o faz: "Embora os governos possam ajudar a restaurar os balanços dos bancos e fornecer maciças injeções de crédito, pôr os mercados financeiros para funcionar ordenadamente de novo provavelmente levará anos, não meses".
A semana que termina parece dar razão a Irvin: os governos fizeram tudo o que puderam para acalmar os mercados, de corte sincronizado de juros a uma torrente de dinheiro à disposição do sistema financeiro.
Não obstante, o banho de sangue continuou. E não se restaurou a confiança dos bancos nos próprios bancos, o que seria o primeiro passo para recuperar o funcionamento ordenado dos mercados em geral.
Tanto é assim que a Libor (taxa usada para operações entre bancos) terminou a semana cotada a 4,8%, quando há apenas um mês estava em 2,8%.
A Euribor, que é a mesma taxa, mas para o euro, recuou ontem só timidamente, dos 5,51% da véspera para 5,489%. A taxa começara o ano em 4,287%.
Com esse panorama, soa exótica a pregação de Berlusconi, embora seja um homem que definitivamente sabe ganhar dinheiro: "Se você tem ações, não precisa absolutamente vendê-las. Se, ao contrário, tem dinheiro em caixa, eu te aconselho a comprar qualquer ação que valia 10 faz um ano e que, agora, vale 2, 3 ou 4. Haverá um lucro extraordinário".


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