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Analistas questionam a gravidade da crise
DO ENVIADO ESPECIAL A MADRI
Justin Urquhart Stewart,
analista da Seven Investment
Management, de Londres, chegou ontem para trabalhar com
a sensação de que "se podia
cheirar o medo no ar". O que
aconteceu ao longo do dia materializou sua sensação e levou-o a um comentário pouco financeiro: "Os investidores deveriam olhar bem o que está
acontecendo e determinar se
realmente estamos caminhando para o Armagedon".
Armagedon, na mitologia
cristã, é o local da batalha final
entre Deus e o diabo. A frase de
Stewart mostra que pitadas de
espiritualidade flutuam nos
mercados, usualmente a quintessência do materialismo.
Stewart aposta na derrota do
diabo. "A maior probabilidade é
a de que estaremos algo melhor
dentro de uns cinco anos, e é essa visão de longo prazo de que
necessitamos", afirma, sem se
dar conta de que o mercado está olhando cinco minutos, e não
cinco anos à frente.
Também espiritualizado,
Miguel Ángel Fernández Ordóñez, o presidente do Banco de
Espanha, o BC espanhol, pede
tempo. Diz que os juros nos
empréstimos entre bancos só
vão cair quando os governos
restabelecerem a confiança,
"que é algo sutil e espiritual".
Nada como uma crise extraordinária para que alguém
considere que o custo do dinheiro envolve espiritualidade.
Espiritualidade à parte, há
um coro quase unânime pedindo uma estatização ainda mais
ampla do sistema financeiro.
Que banqueiros e financistas o
façam é parte habitual do jogo.
Mas o pedido vem também
de autoridades, caso de Gordon
Brown, primeiro-ministro britânico: ele pede que outros países façam o que ele fez, ou seja,
anunciar um pacote de 500 bilhões de libras para os bancos.
"Todo mundo depende dos
bancos. Nós estamos tentando
fazer com que os bancos voltem
ao que tradicionalmente fazem, ou seja, fazer fluir o dinheiro para os negócios, ajudar
pessoas com suas hipotecas, assegurar que a poupança das
pessoas está segura", afirmou.
Na academia, concorda Paul
De Grauwe, professor de economia da Universidade belga
de Louvain e pesquisador do
Centro de Estudos de Política
Européia, que desenvolve o seguinte teorema: "O banco A não
quer emprestar para o banco B,
não necessariamente porque
teme a insolvência do banco B,
mas porque teme que outros
bancos não emprestarão para o
banco B, levando-o à insolvência. Assim, os empréstimos se
paralisam, porque os bancos
esperam que os empréstimos
entre bancos se paralisem".
Como sair do impasse?, pergunta e responde De Grauwe:
"Só há um caminho. Os governos dos grandes países (EUA,
Reino Unido, os da eurozona,
possivelmente Japão) têm que
tomar seu sistema bancário ou,
ao menos, os bancos significativos. Os governos são a única
instituição que pode resolver
essa falha no coração da crise
de liquidez".
"Podem fazê-lo porque, uma
vez que os bancos estejam em
mãos do Estado, eles podem ordenar que cada um confie no
outro e emprestem uns aos outros. Quanto mais rápido os governos derem esse passo, tanto
melhor", fecha o teorema, em
artigo no "Financial Times".
Mas a confusão de idéias é tamanha que propicia avaliações
absolutamente opostas.
Em outro artigo, Casey Mulligan, professor de Economia
na Universidade de Chicago, famosa por ser o ninho principal
dos liberais mais puros, diz que
"salvar os bancos americanos
não vai salvar a economia" e
ainda acrescenta o que hoje parece heresia: "A economia não
precisa realmente de salvação.
É mais forte do que pensamos".
Não se trata de ser do contra.
Mulligan acrescenta uma porção de números para tentar demonstrar que "o setor não-financeiro da economia não sofrerá muito, mesmo com uma
prolongada crise bancária, porque a importância econômica
geral dos bancos tem sido muito exagerada".
Quanto à saúde da economia
não-financeira, seus números
impressionam: ele diz que, desde a Segunda Guerra (1939-1945), cada dólar de capital investido na economia gera, na
média, ganhos de 7 a 8 centavos
anualmente. Em 2007 e na primeira metade de 2008 -portanto, em plena crise-, cada
dólar estava gerando 10 centavos, "muito acima da média histórica". Completa: "Os balanços do terceiro trimestre de algumas empresas já sugerem
que as companhias não-financeiras da América estão fazendo muito dinheiro".
Pelo menos há uma pessoa
para quem o Armagedon não
está à vista.
(CLÓVIS ROSSI)
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