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LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
A próxima crise mundial
O ajuste externo será inevitável, passará pela depreciação do dólar e
não será um "soft landing"
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A QUEDA NO valor das ações nas
Bolsas internacionais a partir
do anúncio do governo chinês
de que pretendia baixar a taxa de
crescimento do país de 10% para 8%
do PIB é uma indicação da próxima
crise da economia mundial. Não sei
quando ela ocorrerá nem qual será
sua gravidade. Não creio, entretanto, que se resumirá em uma modesta
recessão nos Estados Unidos, como
já muitos economistas estão prevendo. A economia mundial, puxada
pela China e os Estados Unidos,
cresceu de forma extraordinária
nesta década, mas, como acontece
em todos os processos cíclicos, cresceu de forma distorcida, com desequilíbrios graves, que mais cedo ou
mais tarde terão que ser corrigidos
pelo próprio mercado onde as distorções ocorreram.
A origem da crise deverá ser a economia americana, porque só ela tem
capacidade de provocar uma crise
global e porque é nela que as distorções estão ocorrendo de forma mais
acentuada. Entretanto, quando lemos as análises sobre as possíveis
origens da crise na economia americana, os problemas internos predominam, embora realmente relevante seja o desequilíbrio externo. No final dos anos 90, houve o estouro da
bolha da informática, que, afinal,
não produziu uma crise muito grave; agora está havendo outra bolha
de ativos nos EUA -desta vez mais
de ativos imobiliários do que acionários-, o que leva os analistas a se
preocuparem com o problema. Martin Wolf, por exemplo, resumiu sua
análise das últimas turbulências
com uma frase: "Os ativos parecem
sobrevalorizados". De fato, estão, e
esse fato pode provocar uma recessão nos EUA; dificilmente, porém,
causará uma crise. Outros, ainda
mais complacentes, preocupam-se
com a inflação americana, que continua alta apesar dos aumentos da
taxa de juros decididos pelo Federal
Reserve. Conforme observou Paul
Krugman, o que hoje está tornando
o mercado vulnerável ao pânico não
é a "exuberância irracional", mas a
"complacência irracional" -o mercado não quer reconhecer a gravidade dos desequilíbrios.
O problema real está nas contas
externas dos Estados Unidos; está
no enorme aumento de liquidez,
medido pelas reservas globais, que
reduz as taxas de juros e leva o mercado financeiro a se tornar mais
competitivo e freneticamente especulativo. Esse aumento da liquidez
internacional, por sua vez, decorre
do brutal aumento da dívida externa
americana líquida, que deixa os
mercados crescentemente inseguros. Preparei um pequeno quadro
(veja à esquerda) que resume o problema. Enquanto as exportações
globais aumentaram 150% de 1998
para 2007, a liquidez internacional
aumentou 233%, principalmente
porque a dívida externa americana
aumentou 383% nesse período. Esses números mostram como a liquidez internacional cresceu muito
mais do que o aumento das exportações exigiria e mostram a origem
dessa elevação da liquidez: o aumento da dívida americana.
A complacência irracional dirá
que não há por que se preocupar. Os
Estados Unidos podem continuar a
ter déficits em conta corrente imensos e a se endividar externamente
porque seus ativos rendem mais do
que seus débitos e porque o dólar é a
moeda reserva internacional. É verdade que os ativos americanos no
exterior rendem mais, mas isso não
impede que o déficit em conta corrente seja hoje, em termos anualizados, superior a US$ 900 bilhões. O
dólar continua a ser a principal moeda reserva, mas, todos os dias, perde
espaço para o euro. A última notícia
é a de que a China está comprando
títulos em euro. O ajuste externo,
portanto, será inevitável, passará
pela depreciação do dólar e não será
um "soft landing". Isso não significa
que implique colapso global, mas os
tempos internacionais róseos estão
terminando.
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 72, professor emérito
da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda, da
Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia, é autor de
"As Revoluções Utópicas dos Anos 60".
Internet: www.bresserpereira.org.br
lcbresser@uol.com.br
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