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Brasil é campeão de inflação em 45 anos
Percentual chega à casa dos 14 quatrilhões de 1961 a 2006; dos seis primeiros países da lista, cinco são sul-americanos
Argentina é a 2ª colocada, com taxa de 256 trilhões, e a Noruega, com 916%, tem a
menor inflação; atualmente, Brasil ocupa a 24ª posição
JANAÍNA LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
Nos últimos 45 anos, o Brasil
conquistou um título nada lisonjeiro: o de campeão mundial de inflação. A taxa acumulada no período chegou a
14.210.480.006.034.800% de
1961 a 2006. O percentual, na
casa dos quatrilhões, consta em
estudo do Bradesco obtido com
exclusividade pela Folha.
"Esses números, com outras
coisas, como a negligência na
área de educação, ajudam a
contar como se construíram as
mazelas sociais existentes no
Brasil", afirmou o diretor de
Pesquisa Macroeconômica do
Bradesco, Octávio de Barros.
"É um resultado cósmico. Para
medi-lo, é preciso lançar mão
de unidades usadas por astrônomos", resumiu o diretor do
Departamento de Economia
do Ciesp, Boris Tabacof.
Para fazer o cálculo, os economistas do Bradesco levaram
em conta o IPC (Índice de Preços ao Consumidor) entre os
anos de 1961 e 1980. A partir
daí, o indicador escolhido foi o
IPCA (Índice de Preços ao
Consumidor Amplo), considerado melhor para espelhar a
realidade brasileira. Antes de
1980, o IPCA não existia.
A vice-liderança do ranking
inflacionário coube à Argentina. No período da pesquisa, o
país vizinho acumulou uma taxa de 256.376.764.519.163%.
Foi seguida do Peru
(216.144.603.134%), do Uruguai (2.001.304.983%), da Turquia (98.325.454%) e do Chile
(81.234.245%).
Ou seja, dos seis primeiros
colocados na lista dos países
que mais sofreram com a inflação, cinco são sul-americanos.
"Tenho a impressão de que
isso está relacionado ao populismo, que marcou a história da
América do Sul", afirmou o
economista Caio Megale, sócio
da Mauá Investimentos. "A inflação é um resquício de tentar
crescer a qualquer custo, de
criar essa panela de pressão
que estoura lá na frente."
Recentemente, a Folha realizou enquete com 200 personalidades para saber quem era
o brasileiro mais importante de
todos os tempos. O nome apontado foi o do presidente Getúlio
Vargas, tido pelos historiadores como o expoente do populismo no Brasil.
Menores índices
Do outro lado do ranking, os
países que conseguiram melhor controle sobre a inflação
entre 1961 e 2006 foram Noruega (acumulado de 916%);
Suécia (922%), Austrália e Dinamarca (ambas com 1.018%,
respectivamente).
O Brasil viveu uma escalada
descontrolada da taxa inflacionária até 1994, quando o governo Itamar Franco lançou o Plano Real. O cerne do plano
-idealizado por uma equipe de
economistas que, em boa parte,
participou da gestão FHC-
consistia em quebrar o ciclo vicioso da remarcação de preços.
Para tanto, foi preciso acabar
com a indexação, que permitia
altas contínuas no valor das
mercadorias.
No intervalo compreendido
entre 2001 e 2006, o Brasil caiu
do primeiro para o décimo lugar no ranking inflacionário,
com uma taxa acumulada de
55,3%. No início do rol, aparecem Turquia (261,6%), Venezuela (197,9%) e Rússia (118%).
Atualmente, o Brasil vai ainda melhor: tem 23 países à sua
frente -entre os emergentes,
ficou atrás de 14.
Metas
"Ficar na 24ª posição é uma
mudança de paradigma. Isso foi
possível, em primeiríssimo lugar, graças ao papel do regime
de metas de inflação; à autonomia de fato exercida pelo Banco
Central de 1999 para cá; às políticas macroeconômicas não-heterodoxas em matéria fiscal;
à abertura da economia, ainda
que incipiente; aos ganhos de
eficiência e produtividade das
empresas nesses últimos anos;
à globalização e, finalmente, ao
fenômeno da China, que joga
preços e salários de todo o
mundo para baixo", ponderou
Octávio de Barros, que defende
uma independência ainda
maior para o BC.
Megale concorda. "Antes,
qualquer surtozinho era difícil
e havia desconfiança sobre a
ação do BC. Isso hoje é totalmente diferente."
Tabacof, do Ciesp, também
considerou que a indexação,
em parceria com a correção
monetária, resultava na disparada dos preços. Na avaliação
dele, entretanto, não é o arrocho da política monetária que
segura a inflação atualmente.
"Com a economia fechada, os
preços eram trabalhados internamente. Hoje, bens, produtos
e serviços circulam relativamente livres pelo planeta. A
verdadeira âncora da inflação
do Brasil é o câmbio", explicou.
"Não é porque o BC pratica um
juro catastrófico que a inflação
está sob rédeas. É preciso enfrentar isso ou viveremos outra
distorção, a dos juros, a título
de manter o que o BC chama de
expectativas do mercado."
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