São Paulo, domingo, 12 de abril de 2009

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Mídia dos EUA prepara cobrança de conteúdo on-line

Em crise, grupos como Hearst Newspapers, New York Times Co. e Time Inc. estudam restringir acesso gratuito a textos


Após queda na receita de publicidade on-line, desafio será convencer leitores a ampliar participação no financiamento da mídia

RICHARD PÉREZ-PEÑA
TIM ARANGO

DO "NEW YORK TIMES" Há apenas um ano, a maioria das empresas de mídia acreditava que a fórmula do sucesso na internet era oferecer conteúdo gratuito, construir uma audiência e faturar com a publicidade. Agora, com os efeitos adversos da recessão sobre a publicidade on-line, os executivos de mídia têm um desafio bem mais complicado: convencer a audiência a pagar.
Grupos noticiosos como Hearst Newspapers, New York Times Co. e Time Inc. estão preparando planos para a possível cobrança do acesso a seu conteúdo na internet. Rupert Murdoch, que um dia prometeu que ofereceria acesso gratuito ao site do "Wall Street Journal", agora defende a cobrança pelo acesso a notícias on-line. "A ideia de que as pessoas têm direito a ler notícias de graça na web precisa mudar", disse Murdoch na semana passada em Washington.
A agência de notícias Associated Press anunciou que pretende policiar o uso de seus artigos noticiosos em sites que publicam seu material na íntegra, de maneira a garantir que esses sites estejam pagando aos criadores do material.
Mas, das redes de TV que vendem downloads de seus programas às gravadoras que tentam conter as trocas gratuitas de arquivos, passando pelos jornais e as revistas em crise, a questão decisiva é a seguinte: como convencer os usuários a pagar por algo que se acostumaram a receber de graça?
Alguns setores conseguiram realizar essa façanha. A Coca-Cola tomou água potável como a que os consumidores recebem em suas torneiras e a filtrou. Deu ao resultado a marca Dasani, e fatura milhões de dólares ao ano com isso. Pessoas que costumavam perguntar com incredulidade por que alguém pagaria por televisão hoje são assinantes de TV paga e do TiVo. As linhas aéreas hoje cobram por refeições e até travesseiros. E alguns fãs de música que baixavam canções piratas hoje são fregueses do iTunes.
Todas essas histórias se tornaram possíveis porque ofereciam algo mais ao consumidor, ainda que apenas conveniência. "Com a água em garrafa, é uma espécie de esnobismo, e a percepção de um produto saudável que eles transformaram em marketing", disse Priya Raghubir, professor de marketing na Escola Stern de Administração de Empresas, na Universidade de Nova York. "Com os downloads, o benefício é que os serviços pagos permitem acesso a amostras grátis de muitas canções; e os programas de TV não têm comerciais."
"No caso dos jornais e revistas, é preciso que haja recursos que não se possa encontrar em outros lugares, e talvez parte daquilo por que as pessoas pagariam seria o privilégio de ajudar o setor a sobreviver." Os grandes grupos noticiosos dizem que ainda não decidiram como proceder, mas que algumas mudanças surgirão, e logo.
"Estamos estudando, evidentemente, maneiras de extrair pagamento dos consumidores por nossas notícias, nem que sejam doações voluntárias", disse Bill Keller, editor-executivo do "New York Times". "Nos próximos meses, antecipo que o "New York Times" deva começar a fazer algumas apostas." Apenas algumas poucas empresas do setor tentaram essa transição, e os resultados não são claros. O "Los Angeles Times" e o "New York Times" tentaram cobrar pelo acesso a parte de seus conteúdos na internet, mas desistiram da ideia porque isso lhes custou audiência e receita publicitária.
Ao acrescentar recursos gratuitos como alertas por e-mail, blogs, fóruns de discussão e vídeos, as organizações noticiosas estão tentando persuadir os leitores de que oferecem algo de mais valioso do que os serviços de distribuição de notícias e os blogs que costumam atrair leitores on-line. Em 2006, o "Washington Post" se tornou o primeiro jornal a conquistar um Emmy por seu trabalho jornalístico em vídeo.

Pacote
Eric Johnson, professor na escola de administração de empresas da Universidade Columbia, diz que se espanta pelo fato de as empresas de mídia continuarem ampliando seus sites com mais e mais serviços gratuitos. "Antes de acrescentar alguma coisa a um site, os responsáveis deveriam considerar que esses recursos deveriam ser parte de um pacote pelo qual seja possível cobrar."
Trata-se de um conceito estranho para muitos dos veteranos da mídia, que cresceram em um mundo no qual as notícias e boa parte do restante do conteúdo da TV e rádio eram gratuitas, e os jornais faturam muito mais com os anunciantes do que com seus leitores.
Antes da recessão, os executivos de mídia apostavam que o futuro era a publicidade on-line, que crescia entre 25% e 35% ao ano. Mas, no ano passado, os gastos com publicidade na internet cresceram 10,6% e apenas 3,5% para as redes de TV, de acordo com um relatório do Interactive Advertising Bureau e PricewaterhouseCoopers. Para a Newspaper Association of America, que congrega os jornais dos EUA, a receita on-line caiu 1,8% em 2008.
O debate sobre "conteúdo gratuito" versus "conteúdo pago" é recorrente. O "Wall Street Journal" começou a cobrar pelo acesso ao seu site em 1996, pouco depois que ele entrou em operação e antes que uma audiência de massa pudesse se ter acostumado a lê-lo de graça.
Antes de assumir o controle do jornal, 16 meses atrás, Murdoch disse que pretendia oferecer acesso gratuito ao site, mas, como as assinaturas on-line estão crescendo e as vendas de publicidade não vão bem, decidiu manter o acesso pago. O site do "Financial Times", o FT.com, tinha mais de 1 milhão de usuários registrados em 2001, quando começou a cobrar por boa parte de seu conteúdo, ainda que muitos de seus artigos continuem livres.
"Um ano mais tarde, tínhamos 50 mil assinantes", diz Rob Grinshaw, o diretor-executivo do FT.com. Passados oito anos, o quadro de assinantes subiu para 109 mil, disse, uma pequena proporção do número total de visitantes do site.
"É preciso educar as pessoas para que aceitem como norma o acesso pago", disse Richard Honack, professor da Escola Kellogg de Administração de Empresas, na Universidade Northwestern.
Mark Mulligan, vice-presidente da Forrester Research em Londres, disse que até mesmo setores que já conseguiram sucesso em cobrar por acesso on-line, como o de música, descobriram que era necessário identificar os nichos corretos. Honack afirma que será necessário tratar a audiência e os produtos como uma série de nichos, e adaptar as ofertas aos consumidores. "É preciso descobrir que porção de seu produto convencerá os usuários a voltar em busca de mais."

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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