UOL


São Paulo, segunda-feira, 12 de maio de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO ECONÔMICA

Queda nos juros já

ANDRÉ FRANCO MONTORO FILHO

A queda no valor do dólar que se observa atualmente no Brasil é objeto de grande controvérsia. De um lado gera efeitos positivos sobre a inflação, mas de outro levanta temores com seus efeitos sobre nossas exportações. Muitos se preocupam que com essa redução se perca o enorme e indispensável ajuste que foi feito em nossas contas externas. Alguns chegam a sugerir intervenções diretas ou indiretas ou disfarçadas no mercado cambial para evitar a continuidade das quedas. Essas propostas têm sido rechaçadas pelo governo federal, inclusive pelo próprio presidente Lula, sob o argumento de que o câmbio é flexível.
Existe, entretanto, um caminho alternativo, que respeita o regime de flutuação cambial e não deve comprometer a meta inflacionária. Proponho uma redução expressiva nas taxas internas de juros via redução da taxa Selic.
Explico. A taxa de câmbio (preço do dólar) é formada, especialmente em um regime de flutuação cambial, por dois fluxos. O fluxo de exportações e importações de bens e serviços e o fluxo de capitais. A taxa de câmbio de "equilíbrio" é aquela que zera a soma aritmética desses dois fluxos, que correspondem, respectivamente, à balança de transações correntes de bens e serviços e à balança de capitais.
O valor do saldo (positivo ou negativo) da balança de capitais, ou seja, do saldo dos movimentos de capitais, é determinado pela taxa de juros interna (por certo relativa à taxa de juros externa, mas que vamos supor constante). Quanto mais alta a taxa de juros interna (diferencial em relação à externa), maior é o saldo (entradas) na conta de capitais. Ora, uma maior entrada de capitais (dólares) reduz a taxa de câmbio (relação real/dólar). Assim, quanto maior a taxa de juros interna, menor será a taxa de câmbio. Esse é um conhecido resultado na teoria econômica.
A taxa de juros, em uma primeira aproximação, pode ser dividida em dois componentes. A taxa de juros "segura" mais a taxa de risco. Esta última é basicamente formada pela percepção de risco dos agentes econômicos.
No Brasil, a partir de maio de 2002, a percepção de risco, por razões conhecidas -mesmo que eventualmente equivocadas-, aumentou substancialmente. Esse aumento e suas consequências levaram o Copom a, defensivamente, promover fortes aumentos nas taxas internas de juros para que se tivesse o mesmo valor ou valor similar ao da situação anterior com menor risco (ou percepção de risco).
Ora, devido ao comportamento sereno da nova equipe econômica, que gerou confiança nos mercados, a percepção de risco despencou. Alguns falam em algo em torno de mais de dez pontos percentuais. Essa nova situação, de menor percepção de risco, representa, mantidas as taxas de juros atuais, um brutal aumento na taxa de juros "segura". Esse vigoroso aumento vai desencadear -aliás já está promovendo- um enorme fluxo de entrada de capitais (voláteis, como meu pai costumava denominar), que vai jogar a taxa de câmbio lá para baixo e assim comprometer o penoso mas necessário ajuste externo que foi realizado.
Com a agravante que logo mais esses capitais (voláteis) vão embora.
Para evitar esse desastre, urge reduzir, de forma expressiva, nossas taxas de juro por meio da redução da taxa Selic.
De outra parte, essa redução não deve comprometer a meta inflacionária, pois a taxa de juros composta pela taxa "segura" mais taxa de risco continua a mesma. Foi a percepção de risco que caiu. E é essa taxa, "segura", ajustada ao risco, que comanda as decisões dos agentes econômicos.
Tendo em vista o grande impacto que essa redução de juros acarreta em termos de investimento, crescimento, geração de empregos e melhora fiscal, o governo federal não pode perder tempo.
Redução nos juros já.


André Franco Montoro Filho é professor titular da FEA/USP e Ph.D. em economia pela Universidade Yale. Foi secretário de Planejamento do Estado de São Paulo.


Texto Anterior: Comércio: Vendas do Dia das Mães empatam com 2002; só shopping comemora
Próximo Texto: Dicas/Folhainvest - Ações: Analistas trocam papéis e sugerem investimentos em exportadoras
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.