São Paulo, domingo, 12 de agosto de 2007

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Meirelles afirma que havia "exuberância excessiva" no mercado

Presidente do BC diz que preços de ativos estavam elevados e não eram sustentáveis e que correção "era uma coisa desejável'

Para Meirelles, ainda não é possível avaliar se as perdas no mercado de crédito imobiliário norte-americano vão afetar a economia global

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles diz que a correção nos preços do mercado "era uma coisa desejável", já que havia uma "exuberância excessiva". Ele alerta, porém, que ainda não é possível avaliar as implicações da atual onda de turbulência, que afetou os mercados internacionais, nem quanto tempo ela vai durar.
Responsável pela política monetária do governo Lula, criticado pelo excesso de conservadorismo do BC, Meirelles afirma acreditar que o país está mais preparado para enfrentar a atual crise internacional, apontando como motivos dados como reservas internacionais acima de US$ 150 bilhões e inflação na meta. Admite, porém, que "ninguém é imune a uma crise de grandes proporções". Leia continuação de entrevista à Folha. (VALDO CRUZ)  

FOLHA - O sr. disse que via aspectos positivos numa correção do mercado, que estava com liquidez excessiva. O sr. mantém a avaliação hoje?
HENRIQUE MEIRELLES
- Em relação aos mercados internacionais, é importante dizer que as correções eram de certa forma inevitáveis, pois uma precificação mais realista e, portanto, mais sustentável dos ativos de risco nos principais centros financeiros era uma coisa desejável.

FOLHA - Como assim desejável?
MEIRELLES
- Porque, na medida em que exista exuberância excessiva e os preços estejam mais altos do que os fundamentos de alguns desses mercados, é natural que em algum momento isso não seja sustentável e haja uma correção de preço. Idealmente esse processo deve ser gradual e ordenado. Porque, se for desordenado, haverá um risco de aumentar de uma forma indiscriminada.

FOLHA - Estamos em que direção?
MEIRELLES
- Hoje é um pouco prematuro para avaliar as implicações dessa turbulência sobre a economia americana e a do resto do mundo e o ordenamento desse ajuste. Os BCs dos países mais afetados estão tomando todas as medidas visando evitar que esse ajuste seja desordenado. Como a exposição total das instituições financeiras norte-americanas ao mercado imobiliário ainda é objeto de certa incerteza, as oscilações podem continuar por algumas semanas. Por quanto tempo? Vai depender do surgimento de novas ocorrências de algumas entidades que estejam com dificuldades. Há um fator nessa turbulência que é positivo: o fato de o risco ter sido absorvido por agentes do mundo inteiro. De outro lado, é negativo, porque a turbulência se espalha muito.

FOLHA - Quais as repercussões dessa crise para o cenário econômico global e para o Brasil, em particular?
MEIRELLES
- Esta é a grande questão do momento: avaliar até que ponto as perdas do mercado de crédito americano poderão gerar um determinado nível de aperto de crédito que poderia prejudicar a economia americana em primeiro lugar e, em segundo, as demais. Não é algo muito claro hoje. Em relação ao Brasil, ele está muito mais bem preparado. Ninguém é imune a uma crise de grandes proporções. Mas não há dúvida de que o Brasil está hoje numa posição muito mais confortável para enfrentar os problemas causados pelos ajustes nos mercados.

FOLHA - Em que o sr. baseia essa confiança?
MEIRELLES
- O Brasil tem hoje uma economia muito mais balanceada do que tivemos por muito tempo. Uma das fontes de vulnerabilidade foi o setor externo, que hoje é um ponto forte. Reservas internacionais superiores a US$ 150 bilhões mostram a sua importância. Sempre dissemos que havia um custo [das reservas], mas que os benefícios o superavam, e muito. Agora, num período como esse, os ganhos propiciados pela acumulação das reservas ficam mais evidentes. Outro ponto importante é que o câmbio flutuante funciona como uma primeira linha de defesa de choques externos. Além disso, é preciso notar que o BC já estava preocupado com uma certa exuberância nos preços dos ativos de risco.

FOLHA - Preocupado como?
MEIRELLES
- No sentido de que o mercado brasileiro pudesse assumir riscos que, em momentos como este, poderiam trazer problemas para as instituições e para a economia. Foi exatamente visando se prevenir contra isso que o BC introduziu medidas prudenciais na área de risco cambial. Fez passar a ser exigida a alocação de capital para determinados tipos de risco, o que fez as instituições diminuírem suas exposições nesse mercado, o que se prova agora uma medida prudente.
Temos ainda o saldo positivo na balança, uma política monetária que conseguiu ancorar as expectativas de inflação. Com isso, os mercados brasileiros continuam funcionando em absoluta normalidade, sem necessidade de injeções extraordinárias de liquidez.


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