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LUÍS NASSIF
Entre o céu e o inferno
A globalização dos mercados de consumo, assim
como a dos de investimentos,
criou um fenômeno econômico
curioso. As chamadas "expectativas racionais" de quem acreditava cegamente no mercado cederam lugar a estudos sofisticadíssimos sobre comportamento
humano, tentando entender
muito mais as razões da irracionalidade do que da própria razão.
Nas últimas semanas, muitos
economistas internacionais de
renome traçavam cenários para
2003 que iam do céu ao inferno,
simplesmente porque o resultado
final dependia de um agente que
não consegue se comportar de
forma racional: o tal do mercado.
No caso do governo Lula, as
apostas variam na mesma proporção. Interna e externamente
há um jogo de forças e contraforças que podem permitir ao país
equilibrar suas contas ou cair no
precipício. E não há modelito
matemático capaz de responder
qual será o desenlace.
No plano externo, há dois fatores relevantes no jogo. O ruim, a
possibilidade de guerra dos EUA
contra o Iraque, trazendo novos
impactos sobre o fluxo internacional de recursos. O bom, a redução da taxa de juros, associada à recessão norte-americana,
inviabilizando o equilíbrio atuarial dos fundos norte-americanos. Mais cedo ou mais tarde,
parte desses recursos terá de retornar aos mercados de risco. No
momento, o Brasil está baratíssimo, pela queda dos preços dos
ativos, com a recessão e com a
desvalorização cambial.
No plano interno, os fatores relevantes são a reversão dos níveis
de vulnerabilidade externa, com
a desvalorização cambial e a melhoria do saldo comercial, e as
novas expectativas em relação
ao governo Lula -o otimismo
moderado substituindo o pesado
pessimismo do primeiro turno
das eleições.
Na hipótese de o governo Lula
continuar exibindo o profissionalismo demonstrado nestes primeiros dias pós-eleição e conseguir consolidar os indicadores
econômicos, e na hipótese de a
guerra contra o Iraque ser rápida e sem maiores desdobramentos, criam-se as condições para o
chamado círculo virtuoso da economia. Nesse círculo, a roda começa a girar em algum momento em que o mercado julga que a
economia brasileira bateu no
fundo do poço. Aí começa um
movimento inicial dos primeiros
fluxos de capital entrando, experimentando, lucrando, para, depois, abrir espaço para movimentos mais consistentes.
O círculo vicioso é deflagrado
basicamente se o governo Lula
demonstrar incapacidade operacional ou de administrar conflitos. Aí o capital se retira mais
ainda, esperando o próximo
tempo do jogo.
Vulnerabilidade externa
A pesquisa Focus, do Banco
Central, com a média das opiniões de analistas de mercado,
permite algumas conclusões relevantes sobre a questão externa.
De 2002 a 2006, a pesquisa projeta um crescimento das exportações da ordem de 7,35% ao ano, e
de 6,7% ao ano no caso das importações. Disso resulta um crescimento do saldo comercial de
10,2% ao ano, passando de
US$ 10,3 bilhões em 2002 para
US$ 13,5 bilhões em 2003 e
US$ 15,3 bilhões em 2006.
O déficit em conta corrente cairia dos US$ 23,2 bilhões de 2001
para US$ 13 bilhões em 2002, depois se estabilizaria em algo entre US$ 11 bilhões e US$ 12 bilhões, que seria coberto pelo Investimento Direto Estrangeiro
(IDE) -que, depois dos US$ 22,6
bilhões em 2001, cairia para
US$ 13,59 em 2003, chegando aos
US$ 18 bilhões em 2006.
Mantendo inalteradas as projeções de investimento direto e
supondo taxas diversas de crescimento das exportações e das importações, as contas ficariam desequilibradas a partir de um cenário bastante conservador, de
crescimento das importações da
ordem de 6% ao ano, mesmo que
as exportações cresçam apenas
3% ao ano a partir de 2003. Um
crescimento médio anual de 7%
das exportações suportaria um
crescimento de importações da
ordem de até 10% ao ano.
Portanto, em condições normais de temperatura, as condições para obter as necessidades
de financiamento externo são
razoáveis.
E-mail - lnassif@uol.com.br
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