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São Paulo, quarta-feira, 12 de novembro de 2003

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LUÍS NASSIF

Quem manda é o gerente

Há setores no governo empenhados em pensar a chamada agenda positiva para o próximo ano. Mas qualquer discussão tem que partir da definição da chamada missão de governo ou da política econômica. No caso, a missão consiste em melhorar o nível de vida da população, por meio de medidas que criem um clima propício ao desenvolvimento com pleno emprego.
Para atingir esse objetivo, há que reduzir vulnerabilidades que possam colocar o crescimento em xeque. Uma delas é a vulnerabilidade externa. Outra, a dívida interna -que consome recursos públicos e privados que deveriam se destinar ao desenvolvimento. Postas essas premissas -que são pontos básicos de qualquer política econômica em qualquer tempo-, todas as ações de governo devem convergir nessa direção.
Como não existe essa definição -nem no governo FHC nem agora-, cada ministério ou secretaria define a sua prioridade, a sua tarefa, sem se preocupar com as implicações de seus atos para o conjunto total da economia.
Por exemplo, a dinâmica de crescimento da dívida interna é explosiva. Deveria ser variável fundamental de análise para cada decisão de política monetária.
No entanto a tarefa que o Banco Central se outorgou foi exclusivamente o monitoramento da inflação. Nos tempos dos Gustavos Loyola e Franco no Banco Central, quando indagados sobre as consequências da política monetária sobre o ajuste fiscal, a resposta era que dívida interna era problema do Tesouro.
De sua parte, a Receita Federal toma uma série de medidas que massacram a economia, aumentam a carga fiscal, provocam recessão. Mas sua "missão" é meramente aumentar a arrecadação.
Cria-se um círculo infernal em que o destino de cada área da economia fica sob a responsabilidade de pessoas, muitas em nível de gerência ou com cabeça de gerente, sem visão de conjunto, sem estatura para promover mudanças.
O Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) é um exemplo típico desse pensamento burocrático. São cinco pessoas incumbidas de definir um indicador que mexe com a vida de todo o país. Não apenas interfere na atividade econômica como em variáveis-chave para a estabilidade -a dívida interna e a vulnerabilidade externa. São pessoas com formação de mercado, escassa informação sobre o mundo real, nenhum senso de responsabilidade em relação a qualquer tema que não seja o controle da inflação.
No domingo, "O Globo" publicou uma obra-prima sobre o pensamento "cabeça de planilha". Segundo a reportagem, Lula e o próprio ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, perceberam o excesso de conservadorismo do Copom para reduzir os juros e indagaram do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, se não seria possível reduzir os juros para 19%. Com a segurança de um presidente do BC alemão, Meirelles teria respondido que em 19% a ata seria subscrita por todos os membros do Copom. Se fosse para 18,5%, não haveria unanimidade, o que poderia inquietar o mercado. E o argumento colou!
É como se todo o planejamento estratégico de uma empresa fosse subordinado à visão do gerente financeiro.

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