São Paulo, quarta, 13 de janeiro de 1999

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OPINIÃO ECONÔMICA

O suplício de trocar o CGC pelo CNPJ

ABRAM SZAJMAN

As 547 empresas filiadas ao Centro do Comércio do Estado de São Paulo conseguiram em dezembro uma liminar na Justiça que é, também, uma importante vitória sobre a insensibilidade: elas podem obter sua inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) independentemente de eventuais pendências junto ao fisco, bem como seus titulares, enquanto pessoas físicas.
Embora dependa ainda do julgamento do mérito, é inegável que a decisão do Tribunal Regional Federal poderá se estender às cerca de 8.000 empresas do comércio ainda sem filiação sindical específica.
Essa sentença judicial é reveladora de como aos contribuintes brasileiros, aqueles que a nomenclatura chama de pessoas jurídicas, não cabe apenas pagar o que devem de impostos, taxas, contribuições, emolumentos, obrigações previdenciárias, trabalhistas etc. Eles também precisam ficar atentos às mudanças, alterações, acréscimos, subtrações, novas redações em textos já existentes, além de medidas provisórias, portarias, instruções normativas e mais todo o arsenal que arma a legislação ordinária a respeito...
A tudo isso se juntou a recente preocupação de que os burocratas do governo deixaram de ler duas coisas fundamentais. Uma, de autoria deles: o Código Tributário Nacional, cujo artigo 142 estabelece que "compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento". A outra, de Adam Smith, "A Riqueza das Nações", escrita em 1776, é obra obrigatória em todas as boas escolas de economia e administração, onde se lê que a "comodidade" é um dos quatro princípios da arrecadação dos tributos. Isto é: todo tributo e as relações entre fisco e contribuintes devem ser presumidos e declarados os mais cômodos para os contribuintes.
Quando criou o Cadin -Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados-, em 1993, o governo bem seguiu esse princípio. E ficou claro que o registro nesse cadastro seria feito somente 60 dias após notificar os contribuintes de seus débitos e seu valor correspondente.
Pois não foi o que pensaram os legisladores ao redigir a Instrução Normativa (IN) do Ministério da Fazenda que instituiu o Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) para substituir o CGC, e agora agem os seus burocratas. Assim, o que deveria ser uma simples troca de sigla virou um inferno, em cuja fogueira ardem a paciência dos contribuintes, o tempo que ninguém repõe e os princípios de Adam Smith.
De acordo com a IN, essa nova sigla do Ministério da Fazenda, devem inscrever-se no CNPJ todas as empresas, menos aquelas cujas pessoas jurídicas, ou seus responsáveis pessoas físicas, tiverem alguma pendência jurídica. Ao tentar fazer a inscrição, o contribuinte recebe um extrato indicando possível pendência jurídica da própria empresa (CGC) ou de seu responsável, pessoa física, por meio do CPF. Cabe ao contribuinte descobrir qual pendência é, que imposto deixou de pagar, qual a obrigação que não cumpriu etc. Não informar o contribuinte contradiz o Código Tributário Nacional, cujo artigo 142 afirma: "compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento".
Além disso, a Receita Federal em São Paulo, por exemplo, apesar de todos os esforços que tem feito para se modernizar e assim agilizar o atendimento, ainda não consegue dar vazão à enxurrada de pedidos dos contribuintes de São Paulo. Dessa forma, fixou o limite de substituições de CGCs por CNPJs em 200 pedidos diários. Mas, para que isso aconteça, os contribuintes -ou seus representantes- madrugam na porta da repartição fazendária para conseguir lugar na fila. Quem não consegue volta no dia seguinte. Até virou história: jovens desempregados "vendem" a senha e garantem, ao menos, a refeição do dia.
Para atenuar o drama, a Receita Federal prorrogou o prazo para 30 de junho. Mas isso pouco ou nada vai adiantar porque as repartições competentes ainda estão se equipando e se estruturando para o serviço e devem adotar em relação ao CNPJ as mesmas normas do Cadin, informando o contribuinte sobre os débitos fiscais e indicando qual tributo ou obrigação não cumprida.
Há uma realidade inescapável segundo a qual a grande maioria dos contribuintes tem alguma espécie de débito, seja com o INSS ou com a Receita Federal, a Fazenda estadual ou a municipal. Fruto de uma soma perversa: o grande número de tributos; as frequentes mudanças da legislação ordinária; e os problemas provocados pela retração econômica afetando as micro e pequenas empresas, que representam pelo menos 90% das empresas, justamente as que precisam substituir o CGC pelo CNPJ.


Abram Szajman, 59, empresário, é presidente da Federação e do Centro do Comércio do Estado de São Paulo e dos conselhos regionais do Sesc (Serviço Social do Comércio) e do Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial).



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