São Paulo, terça-feira, 13 de março de 2007

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Lula foi mais radical que equipe, diz Palocci

Ex-ministro diz que presidente buscou inflação menor que sugerida pela Fazenda, o que endureceu política monetária

Petista critica ênfase do PAC no investimento público e diz em livro que, no auge do mensalão, foi sondado pelo Planalto à Presidência

Sergio Lima/Folha Imagem
O deputado Antonio Palocci, em seu gabinete em Brasília


KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Na primeira entrevista exclusiva desde que voltou ao Congresso como deputado eleito pelo PT-SP, Antonio Palocci Filho, 46, diz que o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) deveria "buscar mais ousadia fiscal". Na sua opinião, o plano, com medidas em discussão no Congresso, seria "ainda melhor".
Ministro mais poderoso do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, Palocci tem reparos ao plano que prevê aumento do investimento público para que o PIB cresça a taxas próximas a 5% ao ano. A média do PIB sob Lula entre 2003 e 2006 foi de 2,6% ao ano. "Melhorar o investimento público sempre é bom. Mas acreditar que ele resolve a falta do investimento privado é um erro."
O PAC foi vendido pelo governo como uma inflexão na política econômica de rigor fiscal e monetário identificada com Palocci, que lança hoje um livro contando os bastidores de sua chegada à Fazenda e os 1.181 dias em que comandou o ministério mais importante.
O título, "Sobre Formigas e Cigarras", é auto-explicativo: recorre à fábula de La Fontaine para alfinetar seus muitos críticos. A polidez com que trata tais críticos no livro exige uma leitura das entrelinhas para identificá-los, sobretudo os do PT e do governo: José Dirceu, Aloizio Mercadante, Luiz Furlan e Dilma Rousseff. Seus grandes aliados foram Luiz Gushiken e o próprio Lula.
No livro, Palocci revela os bastidores da decisão econômica mais importante do primeiro mandato de Lula: uma reunião em junho de 2003 na qual o presidente se mostraria contrário à proposta da equipe econômica de fixar a meta de inflação de 2005 em 5% ao ano.
Segundo o relato do ex-ministro, Lula queria 4% e aceitou 4,5% a contragosto, depois de Palocci insistir em saber se ele estava ciente de que a decisão significaria mais juros altos e menos crescimento do PIB.
O chamado "paloccismo" (austeridade econômica) seria, na verdade "lulismo". Foi o presidente quem insistiu na meta mais rigorosa de inflação.
"Lula, sem que se notasse, havia sido mais radical do que a sua própria equipe econômica", revela Palocci. Escrito em sete meses, o livro, da editora Objetiva, custará R$ 29,90.
Palocci conta que ouviu de Delfim Netto a sugestão de ler um texto, a "Agenda Perdida", que José Alexandre Scheinkman preparava para Ciro Gomes na eleição de 2002. O documento fez a cabeça de Palocci. Scheinkman, professor de economia de Princeton, indicaria o economista Marcos Lisboa para a equipe da Fazenda.
Sobre a violação e a divulgação do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, episódio que o obrigou a sair do governo, admite: "Cometi um erro político", diz o deputado na entrevista à Folha, realizada na manhã de ontem na casa em que vive em Brasília com a mulher, a filha e um casal de enteados.
Palocci nega ter ordenado a quebra e a divulgação do sigilo bancário da conta do caseiro na Caixa Econômica Federal. Mas assume sua "responsabilidade política" porque os crimes aconteceram na área sob sua responsabilidade.
Também conta que o chefe-de-gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, o sondou em julho de 2005 sobre uma eventual candidatura caso Lula não concorresse em 2006. Era o estouro da crise do mensalão. "É melhor vocês pensarem no Ciro. O trabalho que estou fazendo na economia é totalmente incompatível com a candidatura", relata. "Diga a Lula que ele terá de ser candidato ainda que não tenha perspectiva de ganhar. Só ele poderá defender o bom governo que fez."


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