São Paulo, domingo, 13 de abril de 2008

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Consumo e estoque baixo encarecem comida

Aumento do consumo aqui e lá fora, falta de estoques e quebras de safra fazem dos alimentos o vilão da inflação no Brasil e no mundo

Desequilíbrio entre oferta e demanda deve continuar e provocar novo impacto nos preços nos próximos anos, afirmam especialistas

Bagus Indahono - 9.abr.08/Efe
Agricultores trabalham em arrozal de Kerawang (Indonésia); preço do arroz dobrou em 3 meses

MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO

Se o Brasil ficou praticamente imune à atual retração da economia mundial, não deverá se livrar dos efeitos da forte alta das commodities quando se refere à inflação. Por ser um dos principais produtores mundiais de grãos e carnes, o país terá impacto menor do que o dos importadores de alimentos. Mas a alta mundial acelerada já está presente na mesa dos consumidores brasileiros.
E essa tendência vai continuar. "Os preços das commodities se formam lá fora. À medida que há aumento por lá, imediatamente bate aqui." A avaliação é de Reinhold Stephanes, ministro da Agricultura.
Foco de atenção dos líderes mundiais, que colocaram o preço dos alimentos no centro das prioridades globais, a alta preocupa também os brasileiros.
Nos últimos 12 meses, a evolução dos principais alimentos consumidos impressiona, ainda mais na comparação com a inflação do período em São Paulo, de 4,29%: o feijão subiu 168%; o óleo de soja, 56%; o pãozinho, 17%; o filé mignon, 22%; o leite em pó, 42%.
Na média, os alimentos subiram 11,24% -mais do que o dobro da inflação no período, conforme informações da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas).
O ministro acredita que os preços das commodities vão continuar elevados, podendo, inclusive, mudar de patamar para cima em dois anos.
Luís Carlos Guedes Pinto, antecessor de Stephanes na Agricultura, também acredita na manutenção de preços elevados. "A alta ainda permanecerá por um tempo. Os estoques estão baixos, e a oferta de alimentos será maior apenas quando houver mais investimentos na produção, o que deve ocorrer com esses preços elevados."
Stephanes condiciona a manutenção dos preços lá fora ao crescimento econômico mundial e à manutenção do programa de produção de álcool, que, nos Estados Unidos, tem o milho como matéria-prima base.
Mantidas essas duas linhas -e mesmo que seja um pouco menor o ritmo de crescimento mundial-, continuará o desequilíbrio entre demanda e oferta. Esse desequilíbrio, que já ocorre há três anos, só não se fez sentir antes porque o mundo vinha "comendo estoques", que estavam elevados, afirma o ministro.
À medida que os estoques estão diminuindo e o desequilíbrio entre oferta e demanda continua, a tendência é que, mais à frente, haja um novo impacto nos preços. Possivelmente nos próximos dois anos, afirma Stephanes.
De 1980 a 2005, a agricultura segurava a taxa de inflação, enquanto o peso vinha de outros setores. "Agora, essa curva já começou a inverter e, na minha visão, vai continuar", diz ele.
Para Guedes, a forte alta dos preços externos é fruto de políticas protecionistas dos países desenvolvidos, que, com subsídios, impediram a evolução da produção nos mais pobres.
Um exemplo recente é o da produção de álcool nos EUA. Se os norte-americanos não impusessem elevadas taxas de importação ao produto brasileiro, teriam pelo menos mais 90 milhões de toneladas de milho para oferecer ao mundo, diz ele.

Pressão interna
A oferta de alimentos terá de crescer 6% ao ano, um taxa impossível para a maioria dos países, mas Stephanes e Guedes concordam que o Brasil tem grandes vantagens sobre os demais, devido a clima, oferta de terra e estrutura agrícola.
Além da pressão externa, existe a alta nos preços internos devido à demanda e, em alguns casos, à menor oferta de produtos provocada por problemas climáticos.
Paulo Picchetti, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor Semanal do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia), da FGV, também diz que os preços externos das commodities influenciam os internos. "É inevitável que exista essa correlação." Os repasses, porém, nunca são integrais e imediatos, acrescenta o economista.
Além disso, o peso dos importados, depende de políticas aduaneiras e da taxa de câmbio. A importação de trigo, por exemplo, mesmo sendo o calcanhar-de-aquiles do país, está facilitada pela queda do dólar e pela eliminação temporária da TEC (Tarifa Externa Comum).
Marcio Nakane, coordenador do IPC da Fipe, diz que "os dados indicam que há uma ligação importante" entre os preços externos e internos. Apesar dessa ligação, ele acredita que as pressões deste ano vão ser menos fortes do que as de 2007.
Ele respalda essa expectativa nos recentes números recordes de safras divulgados pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).


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