São Paulo, domingo, 13 de abril de 2008

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Cadeia do plástico prevê falta de insumo

Relatório da associação do setor químico mostra que indústria brasileira enfrentará falta de matérias-primas a partir do final da década

Crise é provocada pela escassez de recursos como gás natural e nafta; situação pode expor o setor aos concorrentes mundiais


AGNALDO BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL

Parte da indústria de base, a petroquímica nacional -setor que fatura US$ 55 bilhões por ano- prevê uma crise de abastecimento de matérias-primas e insumos nos próximos anos. Relatório com balanço de oferta e demanda dos principais insumos da cadeia do plástico mostra que o déficit começa em 2010 e deve se agravar nos anos subseqüentes. Em dois anos, revela o relatório, a produção de eteno (principal insumo do setor, obtido do gás natural ou da nafta, um derivado do petróleo) já será menor do que a demanda para mercado interno e exportação.
Pelo relatório elaborado pela Comissão de Economia da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química), a produção de eteno nas quatro centrais petroquímicas do país já será 200 mil toneladas menor do que a demanda, estimada em 3,91 milhões de toneladas. Até 2020, prazo considerado no estudo da Abiquim, a demanda já terá superado em 1,9 milhão de toneladas a produção.
Do eteno, indústrias como Braskem, Dow e Triunfo produzem o polietileno, resina que é transformada em embalagens e utensílios domésticos, entre outros produtos.
A situação é idêntica para o propeno, outro importante insumo da cadeia dos polímeros. O polipropileno obtido com essa molécula é uma das principais matérias-primas para produção de embalagens e peças para automóveis ou eletrodomésticos. Segundo estudo da Abiquim, a partir de 2011 a produção de propeno também começa a ser inferior à demanda. Em 2020, horizonte do estudo, o Brasil importará 1,5 milhão de toneladas de propeno.
As importações, que no setor não são fenômeno cambial, começam a tomar parte do mercado. Com US$ 3,04 bilhões, as compras externas de resinas e elastômeros (plástico e borracha sintética, produtos da cadeia do petróleo e do gás natural) em 2007 passaram em US$ 745 milhões as exportações.
A situação do conjunto da indústria química, que, além desse setor, inclui produtos farmacêuticos, fertilizantes, defensivos e cosméticos, evidencia a dependência brasileira.
Em 2007, segundo a Abiquim, a importação do conjunto da indústria química cresceu 37,8% e atingiu US$ 23,9 bilhões. O déficit da balança do setor químico brasileiro foi de US$ 13,2 bilhões, evolução de 57% de 2006 para 2007. "À medida que a demanda cresce e não há resposta da produção, a situação de déficit vai ficando mais grave. Uma parte da solução disso está na mudança do modelo aplicado hoje ao setor", diz José de Freitas Mascarenhas, vice-presidente do conselho diretor da Abiquim.
Para José Ricardo Roriz, presidente da Vitopel, empresa de transformação de plásticos, a indústria do setor tem graves vulnerabilidades. "O modelo brasileiro aponta para uma baixa competitividade. Temos empresas grandes, mas extremamente frágeis na segunda geração [de resinas]. As de terceira geração [de transformação] provavelmente deixarão de ser indústrias e devem se tornar importadoras", diz.
A demanda interna expandiu nos últimos anos, mas a capacidade do setor petroquímico segue num ritmo lento de crescimento, não por desinteresse ante o aumento da demanda interna. Falta a matéria-prima básica, a nafta (um derivado do petróleo) e o gás natural. Hoje, um terço da nafta é importado. A solução passa pelo aumento do refino pela Petrobras.
A segunda opção, o gás natural, tem ainda menos disponibilidade. "O Brasil decidiu usar gás para gerar energia, e não para a indústria petroquímica", diz Mascarenhas. A indústria consome 25,4 milhões de metros cúbicos de gás por dia. Apenas 4,5 milhões são usados como matéria-prima. Além de servir para a produção de eteno e propeno, o gás natural também é insumo para a indústria de fertilizantes. E apesar de o Brasil ter uma das maiores agriculturas do planeta, a dependência da importação é elevadíssima, 70% da demanda.
Pelos cálculos da Abiquim, nem o gigantesco Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro), empreendimento que custará US$ 8,3 bilhões, deverá aliviar a escassez.

Pré-sal
Uma parte da indústria petroquímica acha que o balanço da Abiquim será superado quando a Petrobras anunciar oficialmente os potenciais de produção dos campos de Tupi e Júpiter, encontrados no pré-sal, na bacia de Santos. As reservas de Tupi podem chegar a 8 bilhões de barris de petróleo. Não há estimativas para Júpiter. A esperança do setor é a de que o gás e o petróleo leve descobertos a 6.000 metros de profundidade possam transformar escassez em abundância a partir da próxima década.
"A descoberta de Tupi e Júpiter representará uma etapa nova que permitirá à petroquímica ser competitiva no plano global. É disso que se trata. O Brasil pode passar de uma situação de restrição de matéria-prima, como é o caso hoje, para uma situação que vai colocar o país como um produtor importante não só no mercado interno, mas transformará o Brasil numa plataforma para investimentos globais", diz José Carlos Grubisich, presidente da Braskem, a maior produtora de resinas da América Latina.
Até o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) espera que os campos do pré-sal alcancem o setor. "É possível que, durante algum tempo, a indústria petroquímica sofra por falta de matéria-prima, mas os novos campos deverão resolver o problema", diz Cintia Moreira, chefe do Departamento de Indústria Química do banco.


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