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LUÍS NASSIF
O povo brasileiro
Mais visionário dos
brasileiros do seu tempo,
estudioso que primeiro e melhor interpretou o enigma brasileiro do século 20, Manuel
Bonfim foi o primeiro a destruir as teorias raciais -segundo as quais o Brasil não se
completava porque a mistura
produzira uma raça inferior.
No clássico "América Latina,
Males de Origem", identifica
as grandes forças e processos
que marcariam a glória e a
desgraça brasileira no século
20. O maior ativo de que o país
dispunha era a qualidade do
seu povo, concluía ele. A mistura de raças gerara um povo
afável, criativo, que facilmente
assimilava os de fora, que
amalgamara um conjunto de
características que garantira a
integridade do território nacional.
Enquanto o povo fizera a
Abolição, a elite promovera a
Guerra do Paraguai. Os líricos
cantavam os valores nacionais, a elite saqueava o Tesouro. Bonfim apenas tinha dúvidas se era o momento de escancarar o país à imigração.
Queria que a idéia de povo
brasileiro estivesse mais consolidada, para o país assimilar
os imigrantes sem o risco de se
criarem guetos raciais.
O povo ainda era melhor do
que supunha Bonfim. No decorrer do século 20, levas de
imigrantes de todas as raças
aportaram ao país e se tornaram brasileiros desde o embarque. Assimilaram, enriqueceram e civilizaram a mistura
racial brasileira.
Em pleno século 21, na era
da globalização, o povo brasileiro emerge como o grande
ator internacional de que o
país dispõe. Analistas internacionais, sociólogos brasileiros
como Roberto da Matta aprofundaram estudos sobre essa
característica de mediação
que faz do povo brasileiro único no mundo, sem conflitos raciais, sem preconceitos, sem
racismo -apesar da decisão
racista de criar as cotas universitárias.
Quando completar a internacionalização das economias, o brasileiro será o povo
mediador por excelência. O
que significará isso na prática?
No campo diplomático, suas
características -de alegria,
simplicidade, espontaneidade- deverão impulsionar o
mais integrador e democrático
estilo diplomático que o mundo já presenciou. O jogo de futebol no Haiti é um marco dessa nova etapa, dando cor, vida, visibilidade ao papel de
mediação que historicamente
o Itamaraty desempenhou no
mundo.
No campo da diplomacia comercial, as grandes empresas
brasileiras deverão se valer
desses valores culturais e da
enorme variedade de comunidades de imigrantes que vivem
no país para abrir mercados e
países para seus produtos.
Na economia, a palavra de
ordem será a cooperação, o
grande movimento sinérgico
entre grandes e pequenos, Estado, universidade, entidades
empresariais, terceiro setor, às
vezes caótico, sempre estimulante, inspirado nas grandes
festas nacionais e nos grandes
espetáculos esportivos. Aí está
um dos pilares em torno do
qual se irão construir as novas
relações sociais e econômicas
no país. O povo será protagonista principal de qualquer
novo projeto nacional que se
pretenda legítimo. E não se
trata mais da velha retórica
para ganhar votos. A promoção do povo é imperativo de
ordem política e econômica.
Mas, aí, é assunto para uma
outra coluna.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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