São Paulo, quarta-feira, 13 de julho de 2005

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LIGAÇÕES PERIGOSAS

Para presidente da empresa, "governo não pode mudar as regras do jogo" e vê risco de violação da lei

Telecom Italia aponta "ações orquestradas"

DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente da Telecom Italia no Brasil, Paolo Dal Pino, defende que uma possível compra da Brasil Telecom pela Telemar seria um golpe para a imagem do país ante os investidores.
"Sem dúvida, se isso vier a ocorrer, afastará os demais investidores não só do setor de telecom mas de outros setores também", disse à Folha, da Itália. "O governo não pode mudar as regras do jogo após a partida ter iniciado."
A seguir, os principais trechos da entrevista. (JANAÍNA LEITE)

 

Paolo Dal Pino - Sim, fomos procurados pela Telemar e ficamos muito surpresos, pois essa empresa não poderia nem cogitar comprar uma participação em outra operadora de telefonia fixa. É uma evidente violação da lei e de todos os mais básicos princípios que inspiraram a privatização do sistema de telecomunicações brasileiro, no qual os investidores internacionais depositaram sua confiança. Ou a Telemar está afrontando a legislação ou a proposta que recebemos já faz parte de um plano da empresa, com os fundos de pensão e o Citigroup, para modificar a Lei Geral das Telecomunicações. Essa última hipótese é a mais provável, sendo que Citi e fundos nos comunicaram o interesse da Telemar já no mês de abril. Eles já indicaram ter recebido uma oferta- que caso!- superior ao preço do [acordo de] "put" entre Citi e os fundos.

Folha - Por que fariam isso?
Dal Pino -
Fica evidente que as ações orquestradas pelo Citibank e pelos fundos de pensão, com o intuito de retirar a Telecom Italia do controle da Brasil Telecom e do mercado brasileiro das telecomunicações, têm por finalidade abrir caminho para a entrada da sua controlada indireta, a Telemar, no controle da Brasil Telecom. É um esquema. Pelas informações que nós temos, parece que isso será feito com o suporte da própria Telemar, via lobby no Congresso para alterar drasticamente a lei aplicável e permitir, com a ajuda do governo, a reestatização da Brasil Telecom. Isso com o prejuízo não somente da Telecom Italia e de todos os investidores estrangeiros que acreditam no Brasil mas sobretudo dos consumidores brasileiros e da credibilidade do país.

Folha - O senhor falou em reestatização. Por quê?
Dal Pino -
É simples. No momento da privatização, o modelo foi formado por três sócios: o sócio banqueiro (o Citi), o sócio industrial (Telecom Italia) e o sócio do governo, que seria para apoiar e acompanhar o processo (no caso, os fundos de pensão).
O que houve é que, com o acordo "put" firmado entre os fundos e o Citi, os fundos serão obrigados a comprar a parte do banco, o que lhes dará 90% do controle do Zain, holding que está no início da cadeia societária de controle da empresa. Portanto uma volta da empresa ao Estado. Reestatizar a Brasil Telecom e depois integrá-la à Telemar levará o país à condição em que estava dez anos atrás, desincentivando os operadores estrangeiros a investir e criar valor para o país. Esse projeto deve ser concretizado por meio da expulsão da Telecom Italia do controle da Brasil Telecom a qualquer custo.

Folha - A Telecom Italia vende a parte dela na Brasil Telecom para a Telemar? Por quanto?
Dal Pino -
Isso não poderia acontecer pelas atuais regras da LGT. Porém, conforme fomos informados por fundos e Citi, eles indicaram ter recebido uma oferta que, como já falei, é superior ao preço do "put".

Folha - A entrada do Citigroup no FIA, o fundo de investimentos que agrupa as entidades de previdência, muda em algo a relação da Telecom Italia com os demais sócios da Brasil Telecom? Dal Pino - Essa compra que o Citi acaba de realizar demonstra claramente a intenção do Citi de também ampliar sua presença no capital da empresa e também nos leva a perguntar a verdadeira intenção por trás disso, uma vez que o banco já assinou um "put" de venda de suas ações também com os fundos. Ou seja, vende por um lado e compra pelo outro. Mas, para nós, somente demonstra que mais e mais os sócios fazem movimentos contrários a seus discursos de venda.

Folha - Por que a Telecom Italia não fez nenhuma oferta firme pela Brasil Telecom?
Dal Pino -
Não há como fazer oferta firme no patamar mínimo de preço estabelecido por eles, que é totalmente fora de mercado. Com isso, como já disse, nossa posição é de vendedores ou então de continuarmos como operadores industriais da firma com a participação atual.

Folha - Alguma vez a Telecom Italia recorreu a representantes do Poder Executivo no governo Lula para discutir o caso Brasil Telecom?
Dal Pino -
A Telecom Italia procurou sempre os interlocutores oficias do governo: o ministro da Comunicações, o presidente da Anatel... Enfim, as autoridades que poderiam nos ouvir e se sensibilizar com nossa posição de acionistas investidores no modelo de privatização brasileiro. E eles sempre nos receberam, sem problemas.

Folha - O senhor discutiu a venda da Brasil Telecom com o ministro Luiz Gushiken?
Dal Pino -
Nossa única relação com ele dizia respeito ao projeto de auto-estima do brasileiro.

Folha - Quando o senhor disse que a Telecom Italia era vendedora, os fundos de pensão se disseram surpresos. Os sócios foram informados da decisão pela mídia?
Dal Pino -
Claro que não. Eu havia falado com Sérgio Rosa [presidente da Previ] pelo telefone antes de dar a entrevista na qual revelei que a Telecom Italia estava cansada e queria vender sua parte. Os órgãos também foram previamente avisados da nossa posição.

Folha - Diante de todo esse imbróglio, como fica a Telecom Italia?
Dal Pino -
Não temos outras alternativas senão reagir à estratégia dos fundos de pensão e do Citigroup, fazendo valer os direitos e saindo definitivamente da joint venture e de uma parceria pouco transparente. Portanto confirmo: que fundos e Citi comprem! Temos o dever de proteger investimento e defender os direitos da Telecom Italia em mercados mais oportunos.


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