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COMÉRCIO MUNDIAL
Empresários americanos criticam posição brasileira em Cancún e dizem que país pode não obter avanço agrícola
Setor privado dos EUA vê Brasil nos anos 70
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A CANCÚN
Os empresários norte-americanos aderiram ontem aos ataques
ao Brasil, disparando pesada carga contra o país, durante reunião
entre os líderes empresariais que
estão em Cancún e representantes
do USTr, uma espécie de Ministério de Comércio Exterior dos Estados Unidos.
O ataque combina à perfeição
com a avaliação de Allan Johnson,
o negociador agrícola do USTr, de
que o Brasil não está desempenhando "papel construtivo" na 5ª
Conferência Ministerial da OMC
(Organização Mundial do Comércio), que termina amanhã.
A crítica principal dos empresários é a de que o Brasil está voltando à política dos anos 70, em alusão ao suposto conflito Norte-Sul
surgido da criação do G21, o grupo de países em desenvolvimento
idealizado por Brasil e Índia para
se contrapor à proposta conjunta,
em agricultura, dos Estados Unidos e da União Européia.
Os empresários dos Estados
Unidos disseram também que o
Brasil corre o risco de sair de Cancún sem nada em matéria de
abertura do setor agrícola, justamente a principal reivindicação
brasileira na conferência da OMC.
O coro contra o Brasil estendeu-se também aos efeitos que a insistência brasileira com o G21 poderia ter sobre as negociações para a
Alca (Área de Livre Comércio das
Américas), cuja própria reunião
ministerial está marcada para novembro, em território dos Estados Unidos (Miami exatamente).
A Folha ouviu de Lori Wallach,
diretora da influente ONG "Global Trade Watch", também dos
EUA, que, na reunião entre o
USTr e os empresários, foram dadas instruções para que eles telefonassem para os diretores de
suas subsidiárias no Brasil para
que estes se juntassem à pressão
sobre o governo brasileiro.
A Folha confirmou a primeira
parte da reunião (as críticas) com
um representante da portentosa
Associação Nacional de Manufatureiras, que pediu, no entanto,
reserva de seu nome. Mas ele não
estava presente em uma segunda
reunião, na qual supostamente teria sido dada a orientação para os
telefonemas.
As críticas do empresariado
apenas acompanharam um dia
em que a posição do G21 e do Brasil foi alvo de um violento tiroteio
verbal de parte não apenas de autoridades norte-americanas, mas
também européias.
Começou com Franz Fischler, o
comissário (espécie de ministro)
europeu para Agricultura. Ao relatar o encontro da véspera entre
representantes europeus e do
G21, o austríaco Fischler lamentou que o grupo liderado pelo
Brasil "não tenha revelado ambição alguma" em relação a um entendimento para fechar a negociação em Cancún. "Sem isso, as
negociações serão muito, muito,
difíceis."
Assim que Fischler e seu colega
Pascal Lamy, comissário de Comércio, deixaram o auditório do
Centro de Convenções em que se
realizam as entrevistas coletivas,
entrou Peter Allgeier, o segundo
homem do USTr, depois de Robert Zoellick.
O G21 também foi seu alvo, assim como o Brasil, ainda que este
não tivesse sido mencionado diretamente. "O G21 mostrou que
pode se unir para fazer demandas. A questão é se esses países são
capazes de se mover para um espírito negociador, junto com os
outros 120 países desta organização [a OMC]", disparou.
Depois, questionou a representatividade do G21 como porta-voz
dos países em desenvolvimento.
"O porta-voz do G21 não é o porta-voz de todos os países em desenvolvimento", afirmou, para
acrescentar que "um certo número deles [países em desenvolvimento]" dissera, na noite anterior, não se sentir representado
pelo porta-voz do G21.
O porta-voz do G21 atende pelo
nome de Celso Amorim, chanceler do Brasil, país escolhido para
coordenador do grupo recém-formado.
Não parou aí. Allan Johnson, o
negociador agrícola dos Estados
Unidos, observou a certa altura
que "alguns países do G21 revelam disposição construtiva". Terminada a entrevista, a Folha perguntou a Johnson se o Brasil estava ou não entre os "construtivos".
Johnson disse que não. "Mas
deveria estar, porque é um país de
alto nível ["world class"] em comércio agrícola e, portanto, deveria ter interesse em abrir mercados também nos países em desenvolvimento".
É uma alusão ao fato de que a
proposta agrícola do G21 protege
o mercado dos países em desenvolvimento, para atender a Índia,
que não quer abrir seu mercado
de bens agrícolas.
A disparada de críticas foi tamanha que a delegação brasileira
viu-se forçada a distribuir um comunicado para dizer que "é importante, neste estágio [das negociações] que nos concentremos
em tentar negociar e não em dirigir nossas energias para atacar
países ou grupos de países".
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