São Paulo, segunda-feira, 13 de setembro de 2004

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POLÍTICA ECONÔMICA

Conselho, que determina a meta de inflação, voltaria a ter representantes de empresas e sindicatos

Lula quer ampliar a composição do CMN

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer ampliar a composição do CMN (Conselho Monetário Nacional), colocando assim mais uma pedra no sapato do ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho. Sua idéia é manter a maioria de membros do governo, mas incluir, como já ocorreu no passado, representantes do empresariado e de sindicatos.
A Folha apurou que Lula tem dito em conversas reservadas que deseja ampliar o CMN, hoje composto apenas por três membros: os ministros Palocci e Guido Mantega (Planejamento), além do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.
Na prática, seria uma recriação do CMN, órgão que nasceu em 1964 para ser a instância máxima da política monetária e do sistema financeiro. Em 1994, na edição do Plano Real, o conselho se transformou num apêndice da equipe econômica.
No dia 2 passado, Lula repetiu sua intenção em conversa com Paulo Skaf, o presidente eleito da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Skaf é defensor da ampliação do CMN.
Palocci resiste por ter, na prática, o controle do CMN hoje. Meirelles, que obteve status de ministro por articulação de Palocci, é afinado com o ministro da Fazenda. Já Mantega, que chegou a ensaiar em 2003 contestações internas a Palocci, recolheu-se e faz sem hesitar o que Lula determina.
A ampliação do CMN poderia diluir o poder de Palocci no órgão que, por exemplo, fixa a meta de inflação, utilizando o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) como parâmetro. Essa meta é perseguida pelo Banco Central, mas não fixada por ele.
Outro exemplo de poder do CMN: interferir nas fórmulas de cálculo de taxas de juros especiais, como a TJLP (Taxa de Juro de Longo Prazo). Ou seja, é muito poderoso, capaz de, no mínimo, restringir a margem de manobra do ministro da Fazenda para conduzir a política econômica.
Por que Lula demonstra disposição de discutir para valer uma modificação do CMN na hora em que a política de Palocci apresenta uma série de sinais positivos?
Primeiro porque é um compromisso de campanha que ele adiou enquanto avaliou que precisava atravessar um período duro de ajuste fiscal e monetário. Agora, que julga ter entrado numa espécie de fase dois da economia, acha que pode oxigenar algumas discussões e atender a uma reivindicação de empresários e sindicalistas simpáticos ao governo.
"Nós queremos envolver mais gente da sociedade, inclusive gente da produção, para a gente discutir melhor os destinos da política econômica brasileira", disse o então candidato do PT a presidente, em sabatina feita pela Folha em agosto de 2002. O temor atual de Palocci é que aconteça exatamente o que preconizou o candidato Lula.
A discussão sobre o CMN ocorre num contexto no qual membros do governo e aliados de Lula desejam interferir na política econômica. Vide a última proposta do presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores), Luiz Marinho: pacto social. Palocci bombardeou a idéia.
Criado com o BC em 1964, o CMN obteve o atual formato a partir de 1º de julho de 1994, na medida provisória de implantação do real, editada pelo ex-presidente Itamar Franco. Antes, era composto por 20 membros.
Desses 20, 13 eram ministros, presidentes de bancos oficiais e o presidente da Comissão de Valores Mobiliários. Seis representantes eram escolhidos pelo presidente entre "brasileiros de ilibada reputação e notória capacidade em assuntos econômicos financeiros". Geralmente, eram oriundos de entidades empresariais. Um representante dos trabalhadores era indicado pelo presidente "ouvidas as centrais sindicais".
A intenção de Lula é manter uma composição algo parecida. Por exemplo, o ministro Roberto Rodrigues, da Agricultura, teria assento. Rodrigues, aliás, foi membro do CMN como representante de entidades da agricultura. Carlos Lessa, presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e que tem divergências com Palocci, teria assento também.
Na época em que foi membro da equipe econômica do governo Fernando Henrique Cardoso, o economista Gustavo Franco, que chegou a presidir o BC, disse que a mudança an composição se justificava porque havia entre os membros do CMN pessoas diretamente interessadas nas decisões dos órgãos. Para Franco, havia conflito de interesses.
Tal argumento sensibiliza a equipe econômica de Palocci, segundo a Folha apurou. Se for inevitável a alteração, o ministro da Fazenda procurará manter uma formato que não seja tão amplo como no passado, tentando atender ao desejo de Lula e fazendo alguma concessão a empresários e sindicalistas aliados ao governo.

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