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GLOBALIZAÇÃO
Com mão-de-obra barata, cidades na periferia de Fortaleza produzem para Diesel, Donna Karan e outras
Ceará vira pólo exportador de grifes de luxo
ISABELLE MOREIRA LIMA
ENVIADA ESPECIAL A HORIZONTE (CE)
Cerca de 450 operários trabalham sob o forte calor cearense
produzindo calças nas quais costuram etiquetas originais da marca de jeans italiana Diesel, vendidas à luxuosa grife por US$ 12 e
revendidas em lojas espalhadas
pelo mundo por até US$ 600.
O Nordeste globalizou-se graças
à sua mão-de-obra barata e à proximidade do hemisfério Norte. De
fábricas instaladas na periferia de
Fortaleza, partem roupas e calçados de grifes de luxo como Diesel,
Donna Karan e Chloé para abastecer o mercado mundial.
A 40 km de Fortaleza, a cidade
de Horizonte (42 mil habitantes e
PIB de R$ 518 milhões em 2004,
segundo o IBGE) recebeu neste
mês uma encomenda de pouco
mais de 10 mil peças da marca italiana conhecida pela boa modelagem e pelos preços altíssimos. A
empresa local SN Confecções, encarregada da fabricação, receberá
como pagamento um total de
US$ 200.690,91.
As peças -quatro modelos diferentes de calças em sarja-
saem por um valor unitário entre
US$ 12,37 (R$ 26,80) e US$ 22,57
(R$ 48,85). Nas lojas paulistanas
da rua Oscar Freire, nos Jardins,
ou do Shopping Iguatemi, um
modelo similar, tipo "cargo"
(com muitos bolsos e outros detalhes como bordados e aplicações
de silk-screen), não sai por menos
do que R$ 620.
Com 19 anos, a Diesel é famosa
especialmente por seus jeans "five
pockets" (cinco bolsos). Em São
Paulo, os modelos custam entre
R$ 700 e R$ 1.200. Nas lojas brasileiras, ocupam lugar de destaque
em relação ao restante das mercadorias. Os jeans são exclusivamente italianos, mas as peças
confeccionadas em outros tecidos, a chamada "linha fashion",
geralmente trazem a informação
de procedência de algum país de
mão-de-obra barata da Ásia e do
Leste Europeu, como China ou
Romênia.
Agora, etiquetas "made in Brazil" também serão costuradas às
roupas. A encomenda de Horizonte é a primeira leva brasileira
da Diesel. E, de acordo com o resultado dos produtos, pode não
ser a única.
Negócio
As negociações foram relativamente rápidas. Intermediadas pela empresa de "trading" portuguesa Globaltex, o contato foi feito no começo de outubro e, já em
novembro, havia provas feitas no
Ceará a caminho da Itália.
Hoje, a SN se encarrega da produção do primeiro pedido. A entrega, de acordo com a confecção,
deve ser feita no final de janeiro
do ano que vem, em três destinos:
Itália, Estados Unidos e Canadá.
Segundo a Diesel, as peças vão direto para Oriente Médio e Ásia.
Nada fica no Brasil.
A produção também é dinâmica. Com 450 funcionários (sendo
250 costureiros), a SN tem capacidade de produzir 4.000 peças por
dia, mais de 450 por hora. As calças da Diesel, no entanto, são
mais "trabalhosas" e levam mais
tempo. Uma calça básica tem cerca de 42 operações. A da marca
italiana, 150.
Preço
Segundo o diretor-presidente
da SN Confecções, André Nunes,
design e material determinam o
valor de um produto. No caso das
Diesel cearenses, o tecido é a sarja
do tipo "strand", que vem de Santa Catarina. O custo do tecido saiu
por R$ 6,44, o que não é exatamente caro.
Mas são a mão-de-obra e a localização que barateiam o custo e fazem do Ceará um lugar muito
atraente para confecções norte-americanas e européias de luxo.
Na SN, por exemplo, um costureiro ganha no mínimo R$ 320 e
no máximo R$ 500, de acordo
com sua produção.
A logística é perfeita: o Ceará
tem dois portos grandes (o do
Mucuripe, em Fortaleza, e o do
Pecém, a 60 km da capital) e teve
seu aeroporto reformado e adaptado para receber vôos internacionais ainda na década de 90.
"Há navios com saída duas vezes por semana e a viagem só demora seis dias", diz André Nunes.
É justamente por causa do "pacote perfeito" oferecido pelo Ceará, de mão-de-obra e logística,
que marcas de luxo escolhem o
Estado para produzir, diz o agente
comercial da Globaltex Edson Palhares. Marcas, no plural.
DK e Chloé
É a primeira vez que a Diesel
produz no Ceará, mas não é a primeira vez que uma grife de grande porte e imagem fabrica no Estado. Nomes como a Chloé, da estilista inglesa Stella McCartney, a
norte-americana DKNY, de Donna Karan, e a italiana Moschino
são clientes das confecções do Estado há alguns anos. Segundo Palhares, que fecha 90% dos negócios do escritório com confecções
cearenses, Giorgio Armani e Calvin Klein já têm modelos em desenvolvimento no Nordeste.
A SN é antiga no negócio de grifes-grandes-para-exportação.
Nunes fabrica peças para marcas
estrangeiras desde 1998. Já produziu jeans para a norte-americana
Abercrombie & Fitch e é homologado pela Levi's. Ao mesmo tempo, a confecção produz peças para
o magazine nordestino Esplanada, voltado para classes baixas.
O município de Horizonte é outro veterano no assunto. Ocupa o
sétimo lugar em arrecadação de
ICMS no Estado e tem pólo industrial com 35 empresas, que produzem de granito a calçados.
"Desde a década de 90, com o
governo Tasso [Jereissati] e a política da interiorização da industrialização, Horizonte mudou de
perfil. Hoje é 90% industrial. O
motivos é a localização privilegiada, a 40 km de Fortaleza, um
grande mercado consumidor. Fica também às margens da BR-116,
que liga a capital ao Sul e Sudeste.
Além disso, temos serviços, infra-estrutura completa e mão-de-obra relativamente barata", diz o
prefeito da cidade, Chico Cesar.
Entre as indústrias que migraram para o município na década
passada, está a Vulcabras, que
tem 8.000 funcionários trabalhando em três diferentes turnos e
produzindo uma média de 500
mil pares de tênis das marcas Reebok e Keds, voltados para os mercados nacional e internacional.
"A indústria de calçados sempre
encontrará melhor situação de
competitividade em regiões onde
o custo da mão-de-obra seja menor", diz o diretor da Vulcabras
Milton Cardoso.
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