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Governo Lula vai adiar nova política
DO ENVIADO ESPECIAL A TÓQUIO
Perfeitamente sintonizados, os
três ministros brasileiros que participam da reunião em Tóquio
usam a mesma palavra, em conversas separadas, para definir
qual a diferença entre a posição
negociadora do governo Lula na
comparação com a do governo
Fernando Henrique Cardoso:
"Vamos ser mais agressivos", repetem Celso Amorim (Relações
Exteriores), Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento, Indústria
e Comércio Exterior) e Roberto
Rodrigues (Agricultura).
Retórica à parte, uma eventual
mudança de posição ficará para
mais adiante, como admite Celso
Amorim. "Não será ainda nesta
reunião, mas vamos tentar colocar a ênfase em outros temas,
além de agricultura. Em temas
que permitam maior avanço em
políticas de desenvolvimento",
diz o chanceler.
É uma frase coerente com as teses expostas tanto por Lula como
pelo próprio Amorim em seus
discursos de posse, no sentido de
que o Brasil do PT procuraria
criar "espaços de flexibilidade para políticas de desenvolvimento".
Fácil de falar, difícil de fazer, sobretudo se o Brasil não conseguir
alterar as regras da OMC, estabelecidas na Rodada Uruguai
(1986/1994), a mais abrangente
etapa de liberalização comercial já
adotada no planeta.
O Brasil ficou no pior do mundos, "porque tem um carro de
pouco mais de mil cilindradas,
mas não é uma BMW", como ouviu a Folha na própria OMC.
Traduzindo: países cuja renda
per capita é inferior a US$ 1.000
(as "mil cilindradas" da metáfora)
ganharam o direito de conceder
subsídios proibidos aos demais,
como os que vinculam o crédito
subsidiado à performance exportadora da empresa beneficiada ou
obrigam a empresa a utilizar certa
porcentagem de componentes locais para produção de bens.
São dois instrumentos clássicos
de "políticas de desenvolvimento", mas que o Brasil não pode
usar, embora concorrentes como
a Índia tenham esse direito pelo
critério das "cilindradas".
Outros países, como os da América Central, de menor desenvolvimento relativo, conseguiram
prazo maior (de três ou quatro
anos) para acabar com esse tipo
de subsídio. Já os países desenvolvidos, em tese, eliminaram esses
subsídios, trocando-os por sofisticados programas de crédito à
exportação.
Foi pela falta desses mecanismos que o Brasil perdeu inicialmente, na OMC, a disputa com o
Canadá em torno da exportação
de aviões. A Bombardier canadense, concorrente da brasileira
Embraer, usa créditos fornecidos
graças aos mecanismos mais sofisticados. Só numa segunda etapa do processo aberto na OMC é
que o Brasil conseguiu "empatar"
a disputa com os canadenses.
A Rodada de Doha da OMC é,
pois, em tese, a chance de o novo
governo brasileiro tentar conseguir algum tipo de concessão que
lhe permita sair da incômoda posição em que ficou após a Rodada
Uruguai.
Não será fácil. Livro recente do
economista Ha-Joon Chang, ex-consultor do Banco Mundial e do
Banco de Desenvolvimento da
Ásia, hoje diretor de Estudos de
Desenvolvimento na Universidade britânica de Cambridge, mostra que é uma secular prática dos
países desenvolvidos "tirar a escada" que usaram para chegar ao
desenvolvimento, impedindo que
os países menos ricos a utilizem
com idêntica finalidade.
Ou seja, os mecanismos que facilitaram o crescimento dos EUA,
do Japão e de outros países são
hoje proibidos para o Brasil, que
tentará buscar a "escada" nas negociações da Rodada Doha.
(CR)
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